Capítulo 02.

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Sim, eu dei de cara com Tácia, a senhorita Maddson.
-Só vim te avisar que hoje é quinta-feira, esteja na sua aula de História Avançada em exatos trinta minutos. -ela disse com aquela voz desusada e feia.
-É sério isso? -enfatizei muito tédio.
-E eu por acaso tenho cara de estar brincando? -a mulher levantou uma sobrancelha.
Bufei e empurrei a porta, porém ela segurou estendendo-me a mão como se esperasse que eu lhe desse algo.
-O que foi? -falei olhando-a.
-Seus eletrônicos. -disse.
É o cúmulo!
-Não tenho. -menti.
-Bom, se não tem nada a esconder, provavelmente não irá se importar de eu dar uma olhadinha em suas coisas, não é mesmo?
Com toda a minha má vontade eu lhe entreguei meu celular.
-Só isso? -ela ergueu uma sobrancelha mal feita.
-Ah não, só falta pedir para que lhe dê meus jeans! -debochei sem me preocupar em esconder minha aversão por aquela criatura.
-Poupe-me de seus sarcasmos mimados, Gabi. -ela reclamou.
-Desculpe, mas não lhe dei intimidade para chamar de "Gabi". Para você é Gabriela Arenas.
-Que seja. -ela começou a se afastar.
-Bruxa velha! -sussurrei.
-Disse algo? -olhou por cima dos ombros.
Tamanha hipocrisia me dava nos nervos. Fechei a porta sem responde-la. Eu mal cheguei na escola e consegui arranjar uma velha com o prazo de validade vencido para pegar no meu pé, e se isso não bastasse, ainda tinha que ficar evitando o Diego. Ótimo!
Desde o primeiro sorriso já soube que aquele playboy era encrenca. Eu não acredito naqueles laces de amorzinho e paixãozinha, creio que isso que sinto por Diego será o máximo que poderei chegar. Prefiro não arriscar voos mais altos.
Espalhei minhas coisas até encontrar um caderno e uma caneta. Definitivamente, eu precisava da localização do meu armário!
Chaveei o quarto, guardei a chave no bolso da frente de meu jeans e saí perambulando pelos corredores, porém não encontrei nada no térreo e resolvi buscar no segundo andar. Quando cheguei ao topo da escada observei as várias salas, cada uma com sua plaquinha indicativa.
Passei por Biologia, Química, Física, Matemática, Inglês, Português, virando o corredor à direita Filosofia e a tão procurada História Avançada, sala1.
Dei uma batida na porta e aguardei um momento até que ela foi aberta e um homem de uns 22 ou 23 anos saiu. Nossa, esse deve ter reprovado uns bons anos para estar ainda no ensino médio.
-Olá! -ele me olhou e percebi que gostou do que viu, patético!
-Oi. -falei seca. -Posso saber do professor disso daí?
-Para quê a mocinha quer saber? -ele botou as mãos no jeans de marca que usava, ótimo um mauricinho!
-Não te interessa. Meu assunto é com o professor e não com você. -falei.
-Gabriela, a aluna nova. Devo dizer que você é realmente muito bonita.
-Da pra parar de me cantar e chamar logo o professor? -eu estava me irritando com aquele cara, todos os alunos da sala me olhavam curiosos e alguns riam.
-Está olhando pra ele. -falou o cara. -Professor Rian Marques.
Engasguei. Aquele maníaco descarado era o professor?
-Pode entrar, no fundo da sala tem um lugar pra você. -falou. -Pessoal, deem as boas vindas a Gabriela.
Exatamente como eu pensava, todos ficaram quietos e sérios, menos Diego que sorria e acenava exageradamente para mim.
Baixei meus olhos e caminhei em direção ao meu lugar, mas no meio do caminho um caderno com capa do Reino Unido caiu em frente aos meus pés. Devo admitir, sempre quis um desses, sou fanática por essa bandeira.
Eu queria muito ser ignorada, se não tivesse amigos seria mais fácil explicar a razão de meus pais jamais virem me visitar e o fato de que eu ficaria sozinha na escola durante os feriados enquanto todos passam comemorando em família. Mas isso porém não significava que quisesse ser odiada, por alguma razão eu resolvi ser gentil. Agachei-me para apanhar o caderno e devolve-lo ao dono, ou dona. Nossos dedos se tocaram.
O contato me causou um choque que percorreu todo meu corpo, como se finalmente acordasse de um longo sono. Senti o peso dos olhos dele em mim.
Sim, não me pergunte como. Mas eu sabia que se tratava de um garoto. Acho que por instinto recuamos ambas as mãos. Levantei meus olhos para seu rosto, ele tinha longos cílios escuros, boca rosada, um magnífico cabelo perfeitamente preto o que lhe moldava o rosto, seus olhos eram castanhos como o mais fino chocolate da serra, era lindo. Eu já tinha visto aqueles olhos antes, sabia que essa familiaridade era mais que um simples flashback idiota do meu cérebro defeituoso. Tenho absoluta certeza de que já o vi. Sei disso. Uma simples falha cerebral não causa o que sinto quando o olho.
Vi o reconhecimento, a surpresa e o choque passando por aqueles olhos maravilhosos, e então desfocarem, eu soube que ele sentiu o mesmo que eu, outra prova que isso não era uma alucinação.
O garoto sentou-se bruscamente na cadeira. Pisquei algumas vezes para me tocar que deveria fingir que nada havia acontecido e continuar andando.
Bom, devo dizer que depois daquilo, eu até tentei prestar atenção à aula, porém, isso não era possível já que aquele garoto cujo nome não sabia, sondava-me pela sombra do olhar.
Forcei-me a parar de encará-lo. Não demorou muito para uma bolinha de papel pousar na minha mesa. Curiosa, desamassei rapidamente.
"O que aconteceu ali??"
Olhei ao redor para identificar de onde veio o bilhete, e lógico que Diego olhava-me significativamente.
"O que?" -escrevi e mandei a bolinha de volta para ele.
Em menos de meio minuto o papel voltou, mas dessa vez caiu no meu colo.
"Quero saber o que tá rolando entre você e aquele cara."
Estava pronta para escrever-lhe que nem conhecia o garoto, mas mesmo que houvesse algo, não seria da conta dele quando alguém estendeu a mão a minha frente.
-Senhorita Gabriela, eu ficaria feliz se prestasse a devida atenção na aula e não me interrompesse. -o professor tarado pegou o papel da minha mão e jogou na lixeira.
A turma toda me olhava, uns riam, outros debochavam, porém apenas um aluno nem ligou para mim. Justo aquele que eu tanto queria conhecer o sorriso.
Qual seria seu nome? Henrique? Emanuel? Mariano? Miguel? Thiago? Ou quem sabe Gabriel! Tantas possibilidades...
Por que ele reagiu daquela maneira brusca? Qual o verdadeiro motivo de ele estar oculto em um lugar e em um tempo remoto em minha memória do qual por mais que tente eu não consigo recordar? Por que eu lembro dele, mas não lembro se tivemos uma história? Por que ele lembra de mim? Sei que lembra, vi isso em seus olhos.
Fui interrompida de meus pensamentos pelo sinal que soou quase me assustando. Engraçado como o tempo voa quando se está fechado em seu próprio universo particular criado por seus pensamentos, não é mesmo?
Peguei meu caderno e saí da sala, meus olhos involuntariamente buscavam ele por entre o tumulto de alunos, mas a única coisa que encontrei foi Diego que vinha até mim. Peguei a direção contrária à dele.
Não estava afim do seu papinho. Afinal, é impressão minha ou Diego estava com ciúmes do garoto de olhos castanhos? Se fosse, eu não queria ouvir o seu blábláblá.
-Gabriela! -ouvi ele chamar atrás de mim.
Ai droga!
Senti alguém agarrar meu braço.
-Desculpa, mas vai ter que entrar na fila, gatinho. -falou uma ruiva baixinha que segurava meu braço e me puxava com ela.
-Affe! Você de novo, Chuck! -praguejou Diego.
A ruiva mostrou o dedo do meio e a língua para ele que só revirou os olhos.
A garota tinha cabelos vermelhos cor de sangue, olhos castanhos escuros, pele de um bronzeado invejável, ela era bonita. Pelo comportamento dos dois eu pude perceber que provavelmente era uma das pouquíssimas garotas que Diego não conseguiu levar para cama.
Ela me levou por entre as pessoas até descermos as escadas, acabamos saindo em um pátio ou algo do tipo.
Tinham banquinhos coloridos por toda parte, me senti de novo no jardim de infância. Sim, esse pensamento foi meio débil, mas é a verdade. Ela se sentou em um banquinho vermelho desbotado e eu sentei em um amarelo à sua frente. Seja lá o que essa criatura queira, com certeza será melhor que o discurso/interrogatório de Diego. Levantei as sobrancelhas esperando que me explicasse o motivo pelo qual me arrastou.
-Foi mal pelo mau jeito, sou Daianna! -ela estendeu a mão.
Sempre achei que essas coisas eram muito sociais. E se teu algo que eu sou, é antissocial.
-Hum. -falei -Gabriela.
-Eu sei. Aliás todo mundo sabe! -ela sorriu.
Eu não estava entendendo nada do que Daianna dizia.
-Você é tipo celebridade agora. Não é só a garota nova, você é "a garota nova gata". -ela riu.
-Não me chama de "gata" porque, primeiro, você é garota. E segundo, eu odeio animais que não são feitos de pelúcia, me dão alergia. -falei azeda.
-Calma! -ela riu -Eu gosto de meninos, e não sou eu quem está dizendo, essa é a opinião geral dos garotos.
-Ok. Você não me trouxe para cá para apresentar suas preferências sexuais, trouxe? Porque se for, não me interessam. -disse sem paciência para papos atoas.
-Relaxa garota, já você volta lá para o seu lindo boy-magia.
-Boy-magia?
-O Diego. -falou.
-Ele não é nada meu. E outra, essa coisa de "boy-magia" é muito gay para o meu gosto. -protestei.
-Seu boyfriend, pode ser? -ela tentou novamente.
-Não, não pode. Já disse que aquele trouxa não é nada meu. Que saco garota! -falei com toda a minha paciência esvaída.
-Não é o que estão comentando. -ela insinuou.
- Pouco me importa o que estão falando! -confesso que me alterei um pouco, mas que se dane.
-Nossa! Já deu para notar que você é bem do tipo não sociável. -ela falou.
-Se sou tão absurdamente nada sociável, o que você ainda está fazendo aqui? -falei. -Sei lá, acho que simpatizei contigo. -ela deu de ombros. -O que é isso saindo de seu bolso?
Olhei e vi a corrente que Diego me deu quando cheguei na escola escorregando pelo jeans.
Puxei-a pelo pingente e botei na mão de Daianna.
-Que lindo! -falou. -Onde você comprou?
-Não, eu ganhei. -falei.
-De quem? -perguntou.
-Diego.
-Eu sabia! Eu sabia! -ela deu pulinhos. -Ele gosta de você!
-Quê?
-Já ouviu falar em "amor-à-primeira vista"?
-Já, mas não acredito.
-Pois deveria acreditar. -ela estendeu a corrente. -Posso pôr em você?
-Não sei se é uma boa ideia eu usar esse treco. -falei inserta.
-Que nada. Deixa vai!
-Tá bom, mas não vai tirar conclusões...
-Já sei, já sei. -ela me interrompeu. -Você e Diego não tem nada, sei.
-É. -falei levantando o cabelo para ela botar a corrente.
-Ficou lindo, Gabi! -falou
-Ok. Sem muita empolgação. -avisei e ela revirou os olhos.
-Vamos lá!
-Para onde? -perguntei.
-Almoçar, é claro! -ela falou como se fosse a coisa mais lógica do mundo.



Cadê Suas Asas, Anjo?Where stories live. Discover now