Seis

2.2K 166 19
                                    

Finalmente sábado. Eu não estava mais aguentando ir para o colégio ficar escutando baboseiras de professores mau humorados. A semana se passou bem rápido, mas tive a alegria de conversar com Gustavo todos os dias. Ele faltou a semana inteira, mas sempre que eu saía do colégio no final da aula, ele estava encostado no seu carro, estacionado na frente do portão principal, me esperando. E os dias foram assim. Eu ficava com ele a tarde inteira e voltava pra casa no horário que a minha mãe também chegava.

Gustavo é uma pessoa extraordinária, mas ainda me esconde coisas que eu pretendo descobrir logo. Algo está machucando ele. Uma coisa bem estranha que eu percebi, foram os machucados. Eu lembro de ter visto um arranhão no braço dele, mas uns três minutos depois, não estava lá. Sim, eu não estou louca, eu vi o arranhão. Ele tentou explicar que foi reflexo do sol, mas ele esqueceu de um pequeno detalhe, não tinha sol naquele dia. Eu fingi que acreditei, mas eu não passei nem perto de acreditar nele.

- bom dia, querida.- minha mãe diz assim que eu me sento na mesa, ainda de pijama.

- bom dia.- digo e começo a tomar meu café. Termino e subo para o quarto, tomo um banho e coloco roupas quentes e meu tênis. Combinei com o Gabriel de ir dar uma olhadinha na floresta, atrás do lobo branco, e ele aceitou.

Arrumo meu cabelo e fico me olhando no espelho. Meus fios de cabelo loiro, estavam brilhando, talvez o motivo seja o cabelo estar sujo e oleoso, mas eu achei lindo.

- KATRYNA.- escuto Gabriel gritar do lado de fora, desço correndo e vejo minha mãe com uma cara de quem ia explodir a qualquer momento.

- eu volto logo - digo e deixo um beijo sobre a bochecha dela.

- vamos lá mesmo?- Gabriel pergunta estacionando a moto, descendo e ficando do meu lado.

- vou provar que vi o lobo branco.- digo começando entrar no meio das árvores.

- certo, vou contigo.- Gabriel diz me seguindo.

Andamos por alguns minutos, eu diria que talvez até horas, e meu corpo estava cansado já, mas nada do tal lobo. Vi bichos de todas as espécies, mas nenhum se parecia com um cachorro da neve. Barulhos por todos os lugares e eu não sabia ao certo por onde andar.

- Katryna, tem alguma coisa ali.- Gabriel diz e olha na direção, apontando. Se passa alguns segundos ele sai correndo e eu fico parada no mesmo lugar.

- GABRIEL, NÃO TEM GRAÇA TÁ.- grito vendo que realmente ele me deixou sozinha.- GABRIEL.- grito novamente na esperança de vê-lo sair do meio das árvores rindo e me dizendo "opa, te peguei". Mas nada aconteceu. Ouvi um rosnado, seguido por um uivo que me fez começar andar pra trás. Encarei o local, e no meio das árvores, quase que camuflado com a cor das árvores, estava um lobo marrom. Ele mostrava os dentes como se estivesse com raiva, e eu tentava fazer minhas pernas correrem, mas num momento de pânico, nada fiz. Ele não se parecia com o lobo branco, ele não parecia ser tranquilo, ele não parecia gostar de mim. Ele deu passos bem devagar, e eu sabia que aquilo era pra me atacar e quando finalmente consegui descongelar, eu me virei pronta para correr mas lá estava ele, eu vi o pelo branquinho. Ele passou a pata pela a minha barriga e me puxou para si.

- VOCÊ SABE QUE NÃO PODE FICAR COM ELA.- o lobo marrom gritou ferozmente. Sim gritou, e eu que já estava morrendo de medo, senti minhas pernas bambearem.

- isso é problema meu, e da minha alcatéia.- a voz grossa e grave do lobo branco me assustou mais ainda e por um momento eu pensei em sair correndo dali, mas algo me dizia que eu ia morrer se fizesse. Minhas pernas não suportaram o peso do meu corpo e eu caí com tudo no chão. Minha respiração ofegante e eu não sabia ao certo o que fazer.

- uma humana no mundo sobrenatural? Você está de sacanagem?- o lobo rosna e começa caminhar em nossa direção.- nossas alcatéias são inimigas, e mesmo que fossem aliadas, eu ainda cortaria o pescoço dela com a minha garra, meu querido Gustavo, já não basta os...- e eu não consegui prestar atenção em nada depois do nome Gustavo. Era como se uma bomba tivesse explodido no meu peito, meus batimentos cardíacos estavam tão acelerados que eu não conseguia encontrar o ar.

- Katryna...- olhei para cima vendo Gustavo completamente nu, com uma expressão de raiva.- tente controlar sua ansiedade.- ele diz calmo e se agacha perto de mim. Sua mão quentinha toca a minha e ele me encara e sorri.- inspira...- ele puxa o ar comigo.- expira...- ele solta o ar e eu faço o mesmo.

- eu não acredito que você se preocupa tanto com essa humana. Eles são criaturas desprezíveis.- um cara nu, que eu nunca havia visto antes, encosta no meu ombro e eu vejo os olhos de Gustavo brilharem. Ele segura no pulso do cara, e se levanta torcendo o braço dele.

- não...- Gustavo tenta respirar fundo, tentando se recompor assim como eu.- NÃO TOQUE NELA.- um rosnado muito alto sai da boca de Gustavo e os dois começam a brigar, literalmente uma briga muito feia.- KATRYNA, CORRE.- Gustavo diz e eu só precisei ouvir aquilo. Minhas pernas mesmo bambas se levantaram o mais rápido que eu pude, e eu corri na mesma direção que Gabriel correu. Corri como se fosse a última coisa que eu ia fazer na minha vida. Corri por que vi dois lobos conversarem e se transformarem em pessoas, e uma delas eu conhecia. Meu coração disparado e minha respiração ofegante. Quando eu vi uma fresta de luz, eu agradeci a Deus, o carinha lá de cima gosta bastante de mim. Continuo correndo e saio de dentro da floresta.

- achei que não voltaria.- Gabriel diz rindo e tentando olhar nos meus olhos, mas eu não conseguia respirar.- o que houve?- ele encosta nas minhas costas preocupado e eu me afasto e começo chorar. As lágrimas desciam devagar, eram lágrimas de medo, de ansiedade, de decepção.

- você me deixou lá, Gabriel.- eu disse baixinho, quase que em um sussurro, mas ele ouviu.- VOCÊ ME DEIXOU LÁ SOZINHA CARA.- e eu chorei mais, eu me senti uma inútil por ter deixado Gustavo para trás, me senti uma inútil por não poder fazer nada. Sinto os braços magros de Gabriel me puxarem para si, me abraçando.

- me desculpe.- ele sussurrou no meu ouvido enquanto eu soluçava.- eu não sabia que ia ficar tão mal.- ele disse me apertando e ficamos assim, abraçados por um bom tempo, até eu voltar a chorar com mais força e ele me arrastar para dentro de casa.

(...)

Gabriel foi embora depois de tanto pedir desculpa e eu me manter em silêncio. A cena se repetia várias vezes em minha cabeça, em câmera lenta, cada detalhe, cada barulho, tudo se passava pela minha cabeça. Apertei o cobertor contra meu peito e ouvi duas batidas na janela. Meu coração disparou tão rápido e eu instantaneamente olhei, dando de cara com seus lindos olhos azuis. Neguei com a cabeça e fingi não ter visto nada, me virei para o lado e ouvi a janela abrir. Novamente travei, mas quando recobrei a consciência do que estava acontecendo, eu corri até a porta, quase abrindo, mas as mãos firmes de Gustavo me prenderam contra a porta de madeira.

- não torne as coisas mais difíceis do que são, Katryna.- ele diz encostando a testa na minha. Uma das mãos dele foi até a tranca da porta, e girou a chave para o lado, trancando o quarto.- eu sinto muito por fazê-la passar por isso.- ele suspira e por impulso eu o abraço. Agradeço a Deus novamente, por não ter deixado ele morrer lá. Sinto os braços quentinhos dele me apertando e eu só conseguia pensar no quanto ele está se tornando importante para mim.- eu sinto muito mesmo.- ele repete.

- não sinta.- digo sentindo ele me apertar mais.- está tudo bem.

- não Katryna, não está.- ele diz quebrando o abraço e segurando minhas mãos.- eu sou um monstro, Katryna. E nem para arrumar uma companheira que fosse um monstro que nem eu, eu prestei.- ele diz e um sorriso nasce em seus lábios e logo se desfaz.

- companheira?- eu pergunto baixinho e ele me encara nos olhos.

- sim...- ele diz e desvia o olhar, logo voltando a me encarar.- você é minha companheira, Katryna Thompson.

E novamente, meu coração disparou, mesmo eu não sabendo o significado de "companheira".

Meu namorado é um Lobo [EM REVISÃO]Where stories live. Discover now