Capítulo 4

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"I don't know what I want,
so don't ask me.
— A place in this  world, Taylor Swift"

— Eu odeio como o sistema nos obriga a estudar coisas que nunca vamos usar na nossa vida — Vinicius comentou, enquanto grifava uma página inteira do livro de geografia. Eram pouco mais de três da tarde e ele e Rafaela ainda não haviam começado a de fato fazer o trabalho.

— Eu sinceramente não me importo com as fossas oceânicas — Rafaela o encarou — Todo mundo já sabe que o fundo do mar é menos conhecido que a Lua. Isso não deveria ser um problema de, sei lá, cientistas?

— Eu acho que se nem os especialistas se aprofundam muito no assunto, eu também não deveria perder meu tempo com isso — Ele torceu o lábio — Não aguento mais esse trabalho.

Rafaela concordou.

— Mas não importa o que a gente acha — disse, dando de ombros — Precisamos nos encaixar no sistema para finalmente estudar apenas o que a gente quer.

— Eu nem sei o que eu quero — Vinicius largou a caneta sobre a mesa cheia de materiais escolares e olhou para a melhor amiga — Quer dizer, eu até sei. Mas vou ser pobre pra sempre — Ele deu uma olhada em todo o apertamento — Queria ser como seu pai, estudar direito e ficar rico.

— Ele só é rico porque herdou o escritório já milionário do meu avô, Vini.

— É, mas eu quero viver de música, Rafa — ele deu uma risada fraca — Estou fadado ao fracasso.

— Ou talvez você seja mais feliz que o meu pai — Rafaela disse — Você vai fazer o que ama, mesmo que não tenha um apartamento de frente para a praia e uma namorada com idade para ser sua filha — ela suspirou — Dinheiro não é tudo.

Ou pelo menos, não deveria ser. Rafaela repetiu a frase mentalmente, enquanto continuava anotando em seu caderno o que colocaria no slide de apresentação.

Estavam na casa do seu pai naquele fim de semana, pois era lá que ela ficava a cada quinze dias. Não que a divisão de guarda fizesse alguma diferença, já que ele nunca estava de fato com ela naqueles momentos, o que tornava tudo um pouco mais fácil.

— Vamos fazer uma pausa? — ela sugeriu depois de algum tempo — a gente merece.

Aquilo era uma mentira. Faltava, pelo menos, 90% do trabalho ficar pronto, mas Vinícius não se importava. Na mesma hora, ele se levantou da cadeira e caminhou em direção a sacada, se jogando em uma das espreguiçadeiras que tinham ali. O céu azul, somado ao mar também azul, parecia drenar toda a irritação de minutos antes. Mesmo que os outros milhares de prédios daquela área quase os impedissem de vê-los com clareza.

— Finalmente um dia bonito — comentou Vinicius, soltando o ar lentamente dos seus pulmões.

A resposta de Rafaela veio no formato de um sorriso. Ela se ajeitou na cadeira e olhou para o amigo, que não tirava os olhos da paisagem à sua frente. Mordeu o interior da bochecha, percebendo que ele usava uma camisa surrada, a mesma que repetia pelo menos uma vez por semana desde que tinha 12 anos. Apesar de ter crescido alguns bons centímetros desde aquela época, ele não se importava.

— Você pensa em algum dia aposentar essa camiseta velha? — Rafaela ergueu as sobrancelhas, um tom de deboche na voz.

Vinicius riu.

— Nunca — informou — ela viveu grandes histórias comigo.

A garota apertou os lábios, concordando com a cabeça. Ajeitou a coluna nas costas da espreguiçadeira e cruzou as pernas, agora também encarando o céu azul.

Número Desconhecido | Livro 1Onde as histórias ganham vida. Descobre agora