Capítulo 10

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"I think I've seen this film before
And I didn't like the ending"
— Exile, Taylor Swift.

Rafaela podia sentir o suor escorrer pelo canto do rosto e a culpa não era do calor. A adolescente mordia o interior da bochecha e questionava ao universo o que de tão ruim havia feito para a sua vida se tornar uma sucessão de eventos catastróficos. Mas cedo naquele dia, chegou a acreditar que tudo voltava aos eixos: o número desconhecido havia voltado a mandar mensagens, ela iniciou as aulas de reforço em física —  com um garoto muito gato — e iria jantar com seus melhores amigos. Tudo parecia perfeitamente encaixado e ocorria como o planejado.

Até aquele momento.

A verdade é que a adolescente costumava acreditar que falhas faziam parte do ser humano desde o início dos tempos. Se toda aquela história de Adão e Eva era verdade, eles eram suscetíveis ao erro em qualquer circunstância. Então, errar é normal e perfeitamente plausível, se feito uma única vez. Duas vezes, na mesma situação, é muito mais do que burrice.

Por isso, seus olhos nem sequer piscavam enquanto a garrafa de refrigerante girava sobre a mesa. Não fazia ideia do porquê aceitou participar da palhaçada inventada pela prima de Vinicius, mas ali estavam eles: imóveis, segurando o ar enquanto o objeto se movimentava, ameaçando parar a qualquer momento.

"Deixa de ser chata!", Jaqueline disse, quando Rafaela foi a única a sugerir que aquela não era uma boa ideia "Será divertido!".

Mas a loira estava enganada. Uma rodada depois, todos eles já haviam escolhido "verdade", o que significava que não restava outra opção, a não ser "consequência". Quando o barulho da garrafa girando parou, todo o ar da sala ficou pesado. Nicolas apertou os olhos e murmurou algo inaudível. Então, encarou Larissa, que exibia um sorriso de orelha a orelha.

— Droga! — Ele fez uma careta. — Fala logo, o que eu tenho que fazer?

Larissa torceu a boca e passou os olhos atentos por todos eles. Não era difícil notar que mal respiravam, tamanho o nervosismo. Já estiveram ali antes, na mesma situação, e sabiam o  rumo a brincadeira nada inocente poderia tomar.

— Hum... —  Ela sorriu e os dentes brancos fizeram a barriga de Rafaela revirar. —  Eu te desafio a beijar... —  Larissa esticou o dedo e mordeu a boca. — A loirinha ali. 

— De jeito nenhum! — Jaque balançou a cabeça negativamente várias vezes seguidas, encarando a unha cor de rosa apontada para si. —  Não pode ser outra coisa?

—  É assim que verdade ou consequências funciona, docinho. —  Larissa deu de ombros e foi fuzilada por Vinicius. Nicolas, por sua vez, continuava a encarando sem expressão.

Ele piscou algumas vezes, antes de juntar as mãos e fechar os olhos:

— Não dá pra ser outra coisa, priminha? — Sua voz era arrastada. — Por favor.

— Gente, vocês são jovens! —  Ela riu, depois olhou para Jaqueline. A mais velha abaixou o tom de voz antes de dizer: —  Beijar o melhor amigo é um evento canônico.

A loira bufou e rolou os olhos. Sem paciência, espalmou as mãos sobre a mesa e levantou-se da cadeira. Claramente incomodada, mas não disposta a ceder, deu a volta na mesa e parou ao lado de Nicolas.

— Vamos logo com isso, surfista — Jaqueline passou a mão pelo cabelo loiro, jogando a franja comprida para trás e soltou o ar.

Nicolas empurrou a cadeira, antes de levantar e pigarrear. Rafaela e Vinicius observaram o garoto parar em frente a melhor amiga e colocar as mãos no bolso. A tensão era tanta que a cacheada podia jurar ouvir as batidas descompassadas dos dois corações. Ele, sem mexer um músculo do corpo, apenas aproximou um pouco a cabeça, diminuindo a distância entre eles em câmera lenta.

Número Desconhecido | Livro 1Onde as histórias ganham vida. Descobre agora