(Parte 2) Capítulo 20 - O Amor no Século XXI

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n/a: a música tema desse capítulo é Little Do You Know - Alex & Sierra

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Era como se eu estivesse andando no deserto há dias sem nenhum resquício de água ao meu redor e sem a esperança de encontrar uma gota em algum momento. Minha garganta ficou seca como talvez nunca tenha ficado na minha vida; minhas pernas tremeram e meu coração gelou de tal forma em meu peito que eu pensei até na possibilidade de ele ter parado de bombear o sangue. As palavras de Henry ecoavam em meu cérebro assim como a sua voz num tom baixo e levemente apressado. Tive a ligeira impressão de meu ouvido ter ficado entupido no momento em que não ouvia mais nada ao meu redor além da voz de Henry ecoando em meu interior.

Um sentimento de desespero me apossou e eu fiquei trêmula sem saber o que fazer ou dizer. Ergui-me abruptamente, cambaleando um pouco por conta da tontura que repentinamente eu sentira. Henry falou algo, mas eu não consegui entender. Sua voz parecia distante. Tudo ao meu redor ainda girava e um turbilhão de sentimentos me fazia estremecer. Era confusão, surpresa, medo, receio e inquietude. Minha respiração estava mais acelerada e em questão de segundos, eu me sentia ofegante como se tivesse corrida uma maratona sem ao menos sair do lugar. Minhas mãos estavam geladas e minhas pernas pareciam não suportar o meu peso. Meus ombros pareciam estar mais sobrecarregados do que o normal e foi como se algo extremamente pesado tivesse sido lançado contra mim sem que eu ao menos pudesse lidar com isso.

E eu realmente não podia. Não podia lidar com algo como a confissão que acabara de ser feita para mim.

Senti mãos me segurando, evitando com que eu caísse por conta da tontura, porém, eu me apressei e as empurrei ao mesmo tempo em que gritava:

- TIRE AS MÃOS DE MIM! NÃO TOQUE EM MIM!

Minha respiração ficava ainda mais acelerada e eu sentia meus pulmões queimarem na tentativa de regresso à respiração regulada.

- Lizzie, eu estava só te segurando para que não caísse... Você não me parece estar reagindo muito bem ao que eu falei... Eu... – o interrompi.

- Não me chame de Lizzie e nem chegue mais perto de mim! Eu preciso de espaço... Eu preciso... respirar. – falei ao começar a andar ao redor da árvore numa tentativa falha de me acalmar e controlar minhas reações.

Henry faz toda aquela merda comigo e depois tem a coragem de dizer que está apaixonado por mim? O quê?

- Como... – o olhei pela primeira vez depois de sua confissão – Como você tem coragem de me falar isso depois de tudo que aconteceu? Depois de ter me humilhado de todas as formas possíveis? – respirei fundo – Como você consegue deitar a cabeça no travesseiro e dormir sabendo que quase acabou com a vida de uma pessoa?

Henry me encarou e o que eu vi nos seus olhos azuis era arrependimento. Era um implícito pedido de desculpas.

- Quantas vezes mais eu vou ter de te dizer que sinto muito por tudo? Que eu sinto muito por ter sido um completo babaca com você? Que eu realmente me arrependo e te peço desculpas? – ele perguntou tentando se aproximar, mas dei um passo para trás me afastando.

- Acha que é simples assim, não é? – balancei a cabeça – Acha que é só vir até mim e dizer que sente muito e mais um monte de bobagem? Acha que vou te perdoar assim? Não foi uma coisa pequena, não foi algo que poderia ser deixado de lado e esquecido como se nunca tivesse acontecido. Você tentou me estuprar, Henry! Você tentou fazer isso! Você me segurou à força, você me prendeu a você e estava prestes a tirar a minha virgindade através de um estupro! Acha que isso é algo fácil de perdoar? Se você estivesse em meu lugar, perdoaria tão facilmente? Abraçaria o cara e sairia com ele de mãos dadas como se fosse a coisa mais normal do mundo?! Porque não é, Henry. Não é normal uma mulher sofrer abuso sexual, não é normal uma mulher ser violentada física ou moralmente, não é normal uma mulher escutar algumas palavras dos homens por conta das roupas que ela usa, porque foi isso que você considerou quando começou a conversar comigo depois de quatro anos! Você só veio até mim por conta das minhas novas roupas, do meu novo jeito, da minha nova maneira de andar. Você não veio até mim porque gostava de mim ou porque me achava uma pessoa bacana. Você veio até mim buscando mais um prêmio para colocar na sua prateleira. Você veio à procura de algo para inflar o seu ego machista. Veio atrás de mais uma mulher para satisfazer as suas vontades e depois ser descartada como um objeto sem valor, sem utilidade. – eu respirava ofegante enquanto falava ainda tentando me recompor da surpresa. – Pois eu tenho uma má notícia para te dar: eu não mudei a minha aparência para te agradar. No início, eu até pensava que você fosse o real motivo para a minha mudança e acabei confundindo as coisas. Mas, agora, parando para analisar tudo o que aconteceu, eu não mudei por sua causa como você mesmo insinuou naquela noite e até jogou na minha cara. Eu mudei por mim. Mudei porque estava cansada de me sentir inferior, cansada de me sentir sem valor algum e cansada de me sentir... sozinha. Então, nunca mais pense que você foi o motivo da minha evolução porque nunca foi.

O Hóspede (Reescrevendo)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora