Capítulo 1: O casamento

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                                                   Eliza Taylor narrando

                                                                                                 1848, Porto Alegre, Brasil.

O vestido era lindo e em meu corpo se moldava tão graciosamente que meus olhos brilhavam. O tecido macio escorregava em meus dedos e parecia se desmanchar aos meu toques. A costura fina, a riqueza de detalhes, a delicadeza do corte, tudo era de uma fineza gritante, um luxo excessivo e um dinheiro desnecessário. O espartilho era elegante, porém apertado demais. O sapato era, definitivamente, desconfortável, mas eu já começara a me acostumar com eles. Apesar do pó de arroz me fazer espirrar -não seria eu se não fizesse-, tinha a finalidade de me pintar como porcelana, bonita aos olhos de quem vê. A única coisa que me orgulhava era a cor neutra que pintava meus lábios. Cada acessório, cada detalhe esbanjava a minha classe social privilegiada. E essa era a questão, era meu dever estar sempre assim, como um produto com a etiqueta que dizia em letras grandes: "Uma dama de classe perante a sociedade".

- Menina! Por que levantaste tão tarde se sabias de seus deveres? O sol já está quase em seu ponto máximo.

- Mil perdões, mamãe. - Segurei o vestido longo e inclinei-me em reverência à mulher mais velha. - O período da manhã nunca foi... - Parei de falar em consequência ao seu olhar reprovador.

- Com tudo, vim até seu aposento para dar-lhe um abraço. Em nosso tempo, ter uma filha ainda solteira aos dezoito anos de idade é quase vergonhoso e, principalmente, não faz jus a sua beleza. Por te amarmos demais, consentimos às suas solicitações. Seu pai e eu fizemos o máximo para te arranjar um ótimo casamento com uma família que poderia esperar até seus vinte anos. Sorte ou graça divina que encontramos um ótimo negócio! Um excelente partido que se encantara por ti desde que te viu quando ainda era uma menina.

- Negócio... - Resmunguei em total indignação para aquele monólogo dito com uma frequência exagerada.

- Perdão?

- Nada, mamãe. A senhora tem razão.

- Então, venha aqui e me abrace, querida. - Abracei-a fortemente. Eu a amava de verdade e eu era sortuda por possuir os pais que tenho. Sempre acreditei em amor desde muito pequena. Meus pais eram completamente apaixonados um pelo outro e isso era e ainda é muito raro. O amor deles encheu-me de tal maneira que quando eu era pequena, gostávamos de dizer que eu era a personificação do amor. Como poderia eu, no auge de minha meninice, casar-me com um homem que poderia ter o dobro de minha idade? Como poderia eu, tão frágil e coitada (como ouvi muitas vezes), casar-me com um navio de cargas opostas à mim? Jamais aceitarei tal coisa em minha própria vida. Vida essa que eu tinha pouca voz sobre as decisões mais importantes. A vida em que eu deveria tomar as decisões do que diz respeito a mim.

A família de meus pais se conheciam a gerações, eles cresceram juntos, se amavam desde sempre e se casaram carregando a felicidade, bem como deveria ser. Eu não me casarei de forma alguma com esse Dr. Morley o qual eu nunca nem troquei mais de meia dúzia de palavra. Não importa o quanto seu nome significa, quanto dinheiro ele tenha, quão bonito ele seja, eu não o amo e esse é ponto. Casamento nunca será um negócio para mim. Dinheiro nunca será prioridade em minha vida, há tantas outras questões mais importantes para serem debatidas em nossa sociedade atual e eu não consigo entender como tanta futilidade ainda é tão importante em nosso tempo. Olhei meu caderno de desenho na penteadeira, suspirei ao fato de ter sido praticamente proibida de voltar a desenhar.

Olhei no relógio. 11:17. Então eu tinha até às 18:30 para encontrar o Velho e fazer, o que quer que seja, funcionar.

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