Mudanças

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  Selena olhou em volta assustada. Estava rodeada por branco. Chão. Paredes. Teto. Tudo branco. Procurou alguma saída. Mas nada. Estava no meio de um nada preenchido de branco. Atrapalhada e desesperada, Selena começou a correr ainda na esperança de encontrar algo que a tirasse daquele lugar. Mas nada. Tudo o que via era uma fila de branco, mais nada. Foi então que uma luz apareceu. Como se uma porta se tivesse abrindo. E dessa porta saiu Josh. Selena sorriu aliviada e foi a correr na sua direção. Abraçou-o com todas as forças. Como se ele tivesse desaparecido por seculos. Como se ele tivesse salvado o mundo.

- Graças a Deus Josh! Pensei que estava aqui sozinha. Na verdade nem sei onde estou nem como vim aqui parar mas agora ja me sinto mais segura. - Desabafou Selena sorrindo.

Mas o cenário mudou quando Selena se desfez do abraço. Ja não era Josh que estava a sua frente. Mas sim o homem da foto. Era igual. A cicatriz continuava a destacar-se. Num impulso, Selena afastou-se. E o seu alivio transformou-se em medo. Medo por não saber como ele tinha aparecido ali. Medo por não saber quem aquele homem era. Medo por ele poder fazer-lhe alguma coisa. Foi então que acordou. Acordou sobressaltada. A sua respiração estava descontrolada e suava por todos os cantos. Selena ouviu o som de um apito irritante e olhou confusa para o lado. Depois, olhou a sua volta. Não estava no seu quarto. Selena sabia bem onde estava. Reconhecia o estilo e cheiro daquele quarto. Estava no hospital. Suspirou frustrada e deitou-se novamente. Afogou a sua cabeça na almofada e começou a pensar na noite passada. Do pouco que se lembrava, sabia que ela e Conan tinham se enfrentado e que lutaram. Mas depois disso não havia mais nada na memória de Selena para alem do sonho. Mais um sonho bizarro para a sua coleção.

*****

Despertou com a voz grossa de alguém, pensou tratar-se de um médico mas um uniforme azul escuro fez-se notar e Selena temeu o pior. Tentou compreender o que aquele sujeito estava a tentar dizer-lhe, fixou algumas palavras-chave que saíram da boca do homem, como "agressão", "queixa-crime" e "cadeia". Na sua cabeça, formaram-se várias frases com aquelas simples palavras e digamos que nenhuma delas era convidativa.
Quando Selena voltou a sua lucidez, a paciente da cama o lado ofereceu-se para lhe narrar tudo o que o estranho lhe tinha dito há pouco.

- Eu não quero que a menina pense que estive a ouvir a sua conversa, mas a verdade, é que eu apanhei, por acaso, o senhor guarda a informar-lhe de que foi feita uma queixa-crime contra si por agressão e que se fosse dada como verídica, iria apodrecer na cadeia.- revelou Miss Watson

- Agressão? Ele é que me agrediu, eu apenas me defendi- barafustou Selena, entre lágrimas e suspiros.

- Não chores querida- disse Miss Watson, assumindo um tom maternalista.

Miss Watson não tivera sorte na família que construirá, o marido tratou-a mal toda a vida e os filhos desprezam-na. É por isso que aos 60 anos esta senhora energética foi internada num hospital e desde aí os filhos nunca mais apareceram para a ir buscar. Era amargurada e perdera lentamente as suas forças de viver. Durante os dias em que Selena estivera no hospital, ambas travaram amizade e Selena viu-a como uma avô. Nutriu um carinho especial com ela e na hora de dizer adeus, convidou a senhora a ir viver consigo. Não com Conan, Selena decidira que iria expulsar Conan da sua vida.
Porém Conan não queria sair da vida de Selena, de modo nenhum, e continuou com a história da queixa por agressão, o que levou o agente Douglas a interrogar Selena e Conan várias vezes durante a semana em que ambos abandonaram a ala hospitalar. Miss Watson continuou sempre do lado de Selena, como nunca ninguém tinha estado.
Desde que conheceu Selena, a idosa estava a voltar a ganhar a vontade de viver. Voltava a sentir-se útil para alguém, sentir que os seus sábios conselhos serviam para alguma coisa, para orientar alguém.
Foi quando Selena regressara a casa, com um sorriso estampado no rosto, que Miss Watson encarou a realidade.

- Vou voltar para o Conan- afirmou sorridente.

- Não o podias fazer- censurou a idosa, pensando no abrigo que iria perder.

- Eu sei que tu o achas que não mas esta não é a primeira vez que eu e ele nos chateamos mas ele não merece isto, tenho que voltar para ele.

- E eu?- questionou Miss Watson, desapontada e sentindo-se posta de parte.

- Tu ficas connosco, não te quero abandonar.- retorquiu Selena bastante animada.

- Não te posso deixar voltar para as garras daquele monstro.

- Sabes Julie- disse Selena, procurando compaixão no rosto envelhecido de Miss Watson.- Há coisas em que nem eu, nem tu, nem ninguém pode mandar. Há coisas que pertencem somente a nossa identidade. Que transcendem tudo o que nos diz respeito. E esta é uma delas.

Miss Watson não estava convencida, estava desapontada com Selena, estava a descarta-la como os seus filhos fizeram há um mês. A idosa sentia-se na obrigação de proteger Selena do pesadelo que ela mesma vivera durante anos e anos.  

Guardiões do SubsoloWhere stories live. Discover now