Capítulo XXV

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Londres era uma explosão social, era isso o que julgava a baronesa de Graham. Não havia dia ou noite sem que alguém se lançasse a algum evento no qual um mundo de boas famílias se reunisse, apertando-se em salões pouco ventilados. Não a toa passavam o resto do dia em suas propriedades, afinal uma vida tão intensa causava uma estafa muito profunda. Lady Graham, sendo mãe e viúva, se beneficiou destas duas qualidades para ser seletiva em suas aparições. Não apenas para evitar o cansaço e o enfado, mas não cruzar com o duque de Milford.

O último encontro a deixara brava com ele, obviamente. Ele não podia agir como se fosse um dono despótico com ela. Nem mesmo James a dirigia com mão de ferro. Apesar desse ressentimento, todo o nervoso passara. Não conseguia se indispor por muito tempo com ele mesmo que George realmente merecesse. O que a fazia fugir de lord Milford era que estavam numa situação desconfortável. Ele buscava uma noiva que fosse mãe para os pequenos e ela não podia ficar no caminho sendo vista com ele para cima e para baixo. Ela, por sua vez, queria acreditar e concordar com lady Dungavan que estava ali para ter um novo marido de sua escolha, alguém bom para si e para os meninos. Não era bom, no entanto, que sua imagem sempre fosse associada ao duque. Afastava os pretendentes, dizia a tia. Portanto, deveria evitá-lo indo a eventos que ele não fosse, mantendo distância, olhando pouco e sorrindo menos ainda, mesmo que custasse uma força hercúlea para não desabrochar para ele.

Os dias foram passando e toda notícia que o duque de Milford recebera dela eram cartas triviais sobre negócios em comum, sem nenhuma pessoalidade ou emoção. Ela mantinha um muro de distância e, depois do último encontro, não ousaria transpor aquela barreira. Mas uma circunstância peculiar, os colocou em rota de colisão novamente.

Fora impossível a George manter os filhos em casa quando estes tomaram ciência de que os Graham estavam em Londres, portanto, os pequenos se deslocavam alegremente entre Graham Park e Stanfield Manor. Por uma semana assim o foi, até que, certo dia, uma chuva forte surpreendeu os pequenos durante a brincadeira nos jardins da residência dos escoceses. A tempestade deixou aquela dezena de crianças molhada até a alma, mas estas sob o firme comando de Patrick e William, o par mais velho, não deixaram o ar livre, mesmo com os protestos dos criados. Foi necessário uma firme intervenção materna para que todos entrassem. Preocupada para que os pequenos, os seus e os Stanfield, não pegassem um resfriado, lady Graham ordenou que todos dormissem em Graham Park para que fosse vigiados com atenção. Amanheceram bem e assim foi por três dias até que todos caíram de cama com uma gripe muito forte.

"Acabo de receber o informe de lord Milford que os filhos também estão doentes", disse lady Graham ao mordomo e a governanta que a seguiam enquanto ela caminhava com vigor pelo corredor do andar superior da residência. "Iremos receber os pequenos para que eu possa cuidar de todos. Preciso de mais camas na ala infantil, lençóis limpos, toalhas e toda sorte de ferramentas que podemos dispor para cuidar e mimar as crianças", ordenava com agilidade de pensamento.

"Um quarto para o duque, ma'am?", inquiriu a governanta a sua patroa.

"Sim...", a pergunta a pegara de surpresa, mas a resposta era apenas uma. Iria ela separar um pai dos filhos doentes? Não, não se prestaria a esse papel. Certamente ainda não queria cruzar com George, mas as circunstâncias os impeliam um para perto do outro. "Prepare a suite Caledonia. Ele a de gostar da vista e não fica longe da ala infantil", disse Elizabeth aos dois criados mais graduados de sua casa.

Tudo foi feito conforte suas ordens e, quando os pequenos Stanfield chegaram, naquela mesma tarde, haviam camas para todos em dois quartos, um para meninos e outro para as meninas. Cinco criadas foram destacadas para auxiliar lady Graham na batalha contra a febre e a cozinha trabalhava a todo vapor para providenciar refeições apetitosas e reforçadas para as crianças. Com mais ou menos intensidade, os dez sentiam dores pelo corpo que os faziam gemer e a febre causavam-lhe calafrios. Resmungos, tosses, espirros e narizes fungando formavam uma sinfonia nos dois quartos e ocuparam tanto o tempo da baronesa que ela despachou a governanta para receber lord Milford quando este chegou no início da noite.

Ser homem dava algumas vantagens, mas estas eram poucas diante de uma doença de outro ser, afinal, exceto os médicos, homens jamais estão aptos para lidar com os cuidados com doentes, sendo relegados a solidão das horas quando há um caso de várias pessoas debilitadas. Este era o caso de George. Mesmo com toda solicitude em desejar ajudar, ele fora lembrado pela governanta que a baronesa e as criadas tinham tudo sob controle e que ele poderia ficar a vontade em Graham Park. Lá estava ele, há horas sentado na biblioteca da residência com um livro qualquer nas mãos que mal havia lido três páginas. Sentia-se um total inútil, um verdadeiro zero a esquerda enquanto Elizabeth comandava uma operação de guerra.

Eram quase dez horas quando a baronesa foi convencida a ir ter com o convidado. A mulher que surgiu na biblioteca não era a imagem que se tinha de uma elegante baronesa. Parecia uma criada com vestes cinzas e um avental branco, tinha os cabelos presos numa trança e olhos demonstravam cansaço, daqueles que mesmo próximos da estafa ainda possuem reservas consideráveis de energia.

"Me perdoe, milord, por deixá-lo aqui sem notícias", Elizabeth disse enquanto dominava certas emoções que lhe agitavam todas as vezes que punha os olhos em George.

"Imagino que as coisas estejam dificeis lá em cima", comentou com um ar constrangido. Afinal, era a primeira conversa real e a sós que tinham em semanas.

"Não como imagina. Todos estão alimentados, aquecidos e banhados", informou com um pequeno sorriso enquanto se deixava sentar em uma poltrona. "A febre ainda os assola, mas vamos trabalhar nisto pela noite. Você já comeu?", inquiriu mudando de assunto conforme sua mente ia lembrando de seus deveres de anfitriã.

"Fique descansada. O jovem Burns cuidou de me servir o jantar e logo servirá um chá antes que se retire", o duque informou com a voz calma e pausada. "Elizabeth, você não ficará acordada toda a noite, não é?", ele inquiriu e logo emendou. "Pergunto isto sem temer que você atire qualquer coisa em mim". Ela riu com aquele comentário dito de forma impertinente e séria como apenas George e George apenas faria sem perder o ar grave.

"Fique descansado, não vou lhe atirar nada pela pergunta. Não sou despótica, George", informou a baronesa com um sorriso nos lábios. "E sim, eu sou a mãe por aqui logo é meu dever materno permanecer em vigília enquanto houver febre", disse com tranquilidade e certa altivez.

"Não irei ditar como conduz essas coisas", e ele ergueu a mão quando ela ousou interrompê-lo. "Mas você deve me prometer que quando quiser descansar vai me chamar para assumir as coisas. Me sinto um inútil sem fazer nada".

"Homens são inúteis nestes casos", retrucou automaticamente e logo com sorriso pediu desculpas pelo comentário. "Mas prometo pedir seu auxílio se necessário", ergueu a mão direita como se jurasse diante de um tribunal. "Agora, o senhor deve ir descansar para o caso de precisarmos...", sim, aquilo era uma ordem disfarçada de sugestão como apenas lady Graham fazia.

O duque de Milford resignado com aquela rotina, se pôs de pé e assim o fez a baronesa viúva de Graham. Naquele dia, ele não se despediu com um inclinar de cabeça, mas se permitiu a achegar-se dela e beijar-lhe a testa com todo respeito que o ato podia ter. Aquele sinal era um agradecimento por acolher os filhos, uma despedida de boa noite e, por fim, um pedido de desculpas velado e silencioso. 



O azul dos olhos teusWhere stories live. Discover now