O PARQUE DE DIVERSÕES
Nossa família não é grande e moramos quase todos próximos, na capital. Um dia perguntei ao meu pai sobre o irmão dele, do qual pouco falávamos. Eu só sabia que ele morava sozinho numa cidade do interior, bem longe da nossa, e nada além disso.
Meu pai disse que meu tio Vicente sempre foi meio arredio, pouco dado a reuniões de família, tudo agravado pelo fato de ter perdido a esposa cedo e não ter filhos. Nunca nos visitou e, nas raras vezes em que falaram por telefone, foi apenas aquela conversa protocolar. Meu pai mesmo só esteve uma vez na casa do irmão, desde que este se mudara para Guanandi, quase na divisa do estado. Não era rico, nas vivia muito bem numa pequena chácara encravada na cidade. Ele fora sócio de empresa de implementos agrícolas e ao vender sua participação conseguira o suficiente para se manter sem maiores preocupações.
Por uma dessas coincidências não tão incomuns, alguns dias depois meu tio ligou para meu pai e - isso sim nos surpreendeu - convidou-nos para passar o final de ano em sua casa. Sugeriu que chegássemos por volta do dia 20 de dezembro e ficássemos pelo menos uns 15 dias.
A despeito do inusitado do convite, ainda mais vindo de uma pessoa um tanto reservada, meus pais ficaram muito felizes com a perspectiva dessa viagem. Estávamos no final de novembro, portanto havia tempo para nos programarmos, embora a distância de pouco mais de 500 quilômetros até Guanandi não fosse nada demais para quem gosta de estradas, como eu.
Meu pai disse a mim e a minha irmã: "vocês verão que o Vicente, apesar de meio retraído, é uma pessoa extremamente gentil".
Partimos no dia 20 por volta das sete da manhã, estimando chegar depois do almoço. Talvez até parássemos no caminho para almoçar, que foi o que acabamos fazendo.
Já eram quase três da tarde quando chegamos a Guanandi. Chamou nossa atenção, ao lado direito da entrada da cidade, um grande parque de diversões, aparentemente deserto naquela hora.
Não foi difícil encontrar a casa, localizada num grande terreno, quase uma chácara, em bairro bem arborizado a meio caminho do centro. O terreno é todo cercado por muros, com grande portão automático duplo na entrada, que foi aberto tão logo meu tio nos viu chegando.
Após os abraços e cumprimentos de praxe, ele mostrou nossos quartos para nos refrescarmos e ajeitarmos a bagagem. Meus pais ocuparam uma suíte, enquanto eu e minha irmã ganhamos uma suíte cada um. Há cinco delas naquele casarão.
Já era noitinha quando fomos para a sala e sentamos para conversar. Enquanto tomávamos um aperitivo antes do jantar, meu tio deu algumas informações sobre o local e como se virava para mantê-lo. Na verdade ele tinha quatro funcionários, dona Meire, governanta e cozinheira, Isabel e Lúcia, que cuidavam da arrumação e limpeza, e seu Francisco, jardineiro. Seu Francisco e dona Meire eram casados e moravam numa casa situada no mesmo terreno. Este ocupava quase um quarteirão, coberto por jardins e um pequeno pomar.
Após o jantar sentamos na varanda e durante a conversa lembrei de perguntar ao meu tio sobre o parque de diversões que tínhamos visto próximo à entrada da cidade. Ele balançou a cabeça, pensou um pouco e disse:
-Aí tem uma história e tanto. Hoje está tarde, mas na primeira oportunidade eu conto para vocês. Na verdade estou escrevendo uma crônica sobre os acontecimentos naquele local, mas nada impede que lhes antecipe a narrativa.
Essa informação me deixou ainda mais curioso e não via a hora de pegar meu tio de jeito para contar a história.
Nos dias que se seguiram passeamos pelo jardim, realmente espetacular, muito bem cuidado pelo Francisco, e conhecemos a cidade, uma bela urbe de tamanho médio, com centro movimentado, alguns prédios altos, dois shoppings e tudo o necessário para um polo regional tão afastado da capital.
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OS VULTOS (contos)
Mystery / ThrillerContos que abordam o inesperado, o exótico, o sobrenatural, o bizarro, o transcendente.