OS VULTOS

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OS VULTOS

Depois de muito esperar por essa oportunidade, consegui finalmente tirar umas férias e partir para Presidente Epitácio e o rio Paraná, onde pretendia passar muitos dias descansando, pescando e escrevendo.

Aluguei um pequeno chalé parcamente mobiliado, não muito longe do rio, mas relativamente isolado, como desejava. Cercado por belas árvores e palmeiras, era acessado por uma bucólica estradinha de terra que saía da via asfaltada. Após me instalar, desci até a margem, uns duzentos metros à frente por uma trilha em leve declive, a fim de ver os lugares onde poderia estabelecer meu posto de pesca. Naquele ponto havia uma orla tranquila, curva, quase uma prainha, ideal para pesca com vara e molinete.

Adoro pescar mas infelizmente não sou nada traquejado e sim um amador pouco hábil com a parafernália dessa prática, por isso me contento com um cantinho na margem.

Já era de tardezinha, tomei o lanche que trouxera, preparei um uísque e relaxei na cadeira de preguiça da varanda para curtir o ar fresco e perfumado do entardecer.

Acabei dormindo e fui acordado por algo que não identifiquei. Talvez tenha sido um som, mas ele não se repetiu na minha vigília. Já era noite fechada, a lua clareava pouco e levantando-me para entrar e acender a luz olhei em volta e percebi três vultos caminhando silenciosamente no declive em direção ao rio.

Não estranhei, pois imagino que muitos pescadores prefiram pescar à noite e aqueles devem ter deixado o carro na estrada pouco acima, dado que não havia nenhum alojamento próximo ao chalé.

Seria uma boa oportunidade para conversar com eles e talvez pegar algumas dicas sobre pescaria no local. Apanhei uma lanterna e desci até a margem. Surpreendentemente não vi ninguém. Mesmo que tivessem se distanciado pela orla não havia muito para onde ir naquele trecho e com a lanterna eu poderia visualizá-los até mais longe. Com certeza deviam ter um barco guardado por perto, que eu não percebera antes, e o usaram para deixar o local. Provavelmente a remo, pois não ouvi nenhum som de motor. Voltei para a cabana e esqueci o assunto.

No dia seguinte levantei cedo, engoli um frugal café da manhã e preparei a tralha de pesca. Se conseguisse fisgar o almoço nem precisaria ir para a cidade.

Uns poucos peixinhos foram suficientes para me garantir o almoço e o jantar.

Passei a tarde escrevendo e à noitinha, após rápida refeição, fui para a cadeira de preguiça com o uísque. Não dormi dessa vez e quase uma hora depois, já de noite, decidi ler um pouco. Entrei para pegar um livro e voltei para a varanda, onde me concentrei tanto na leitura que, quando comecei a ter sono, vi que passavam das dez horas. Ao me levantar da cadeira, percebi, sob a parca claridade lunar, três vultos descendo para o rio, provavelmente os mesmos da noite anterior. Cismei em conversar com eles e gritei um "Oi, tudo bem?". Fui completamente ignorado. Decidido a entender para onde iam, corri para dentro, peguei a lanterna e os segui. Caso houvesse um barco por ali não teriam tempo de se distanciar antes que os visse.

Mas novamente cheguei na margem e não vi nada. Desta vez o barco não seria explicação e isso me perturbou. Aborrecem-me situações que não posso explicar e sabia que esse caso iria me incomodar por um bom tempo caso permanecesse obscuro.

No dia seguinte resolvi ir até a cidade para um café da manhã mais reforçado e comprar almoço e jantar. No caminho, pouco antes do asfalto, havia uma barraca de frutas e verduras e notei que também vendiam iscas. Pensei em parar na volta, ver se tinham alguma coisa para melhorar meu desempenho na pescaria.

O dono foi muito simpático, deu várias informações sobre o local de pesca e sugeriu algumas iscas. Disse que sua banca é muito frequentada por pescadores iniciantes em busca de dicas.

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