Capítulo 20

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Não foi surpresa ao sair encontrar ela na cozinha já com uma xícara quente nas mãos e outra me esperando na bancada.

- Seu par de botas está atrás da geladeira. - ela disse como algo corriqueiro, apenas me avisando onde poderia achá-las depois. - Posso saber o que te deu pra vir aqui no meio dessa chuva?

Era isso. Só de vê-la meu humor já tinha melhorado e a olhando assim, tão a vontade na minha frente, como se fosse um domingo comum para ela, me dava a sensação de pertencimento que estava precisando.

Como dizer que passou a semana com saudade da pessoa sem assustar? Estava claro que ela não se incomodava comigo ali ou teria dito, mas eu sabia que ela queria manter com os dois pés atrás por enquanto. Sim ela tinha dito que queria testar o que era essa coisa nova que estava sentindo, mas tudo era novo.

- Faz tempo que não nos vemos, quis passar pra te dar um oi.

Seu sorriso se alargou como se soubesse que eu estava mentindo e que nem me dei o trabalho de camuflar melhor, minha desculpa era esfarrapada demais e eu sabia disso.

- Domingo de tarde... - Maria fez uma pausa pensando enquanto levava a caneca fumegante a boca. Me encorajei e peguei a minha sentindo o aroma de chá de camomila invadir meu nariz. - Domingo é dia de almoço em família. - disse de repente como se tivesse se lembrado.

Encarei ao redor procurando pela família dela, não tinha ninguém ali, nem um mínimo sinal de que a família tivesse passado ali. Pelo menos não a minha ou o rastro estaria visível.

- Atrapalhei alguma coisa?

- Domingo é dia de almoço com sua família, Will me contou no outro dia. E sim, atrapalhou a minha sessão de terapia. - ela disse com a expressão séria, mas antes que eu pudesse me desculpar sua mão segurou a minha e me puxou para a sala. Assim que sentamos no sofá ela deu play na tv e o som explodiu pelas caixas envolvendo-nos. - Essa é minha terapia.

- Sentar no sofá com um chá e o que quer que seja que está tocando? - questionei e vi seus olhos quase saltarem das órbitas.

- Você não sabe quem é Alceu Valença? - eu neguei e por algum motivo consegui fazer com que ela se sentisse mais chocada. - De que planeta você veio? - Maria disse inconformada com a mão no peito mostrando indignação.

- Do mundo do rock bebê. Nascido e criado, duvido muito que até minha mãe conheça ele.

- Ele é da sua época velhote. - sua cara de inocente era negada pelo sorriso travesso nos lábios. - E sua mãe é uma boa pessoa, impossível ela não conhecer!

Maria cantarolou baixinho enquanto voltava a bebericar seu chá e seus pés foram atirados na minha direção descansando no meu colo enquanto ela reclinava no braço do sofá.

Eu segurei os pés pequenos já começando a massageá-los enquanto ela tamborilava as pontas dos dedos na xícara, Maria era a imagem da tranquilidade murmurando a letra da música que até parecia falar dela.

"Um girassol nos teus cabelos

Batom vermelho, girassol

Morena, flor do desejo

Há teu cheiro em meu lençol"

Até o final da música foi assim que ela ficou, os olhos fechados cantando baixinho, até que no último toque ela abriu os olhos me encarando com um misto de incerteza e constrangimento. Não sei ao certo se era por estar sendo observada ou por ver que ficava a vontade comigo ali de forma tão caseira.

Tinha algo de mais íntimo nesses pequenos momentos, mais íntimo até mesmo que sexo. Era como desnudar não o corpo, mas sim a alma.

- Então é assim que você relaxa? - perguntei tentando acabar com o constrangimento dela.

Amor de Motoqueiro - Concluído Where stories live. Discover now