5. PINK-ROMANCE

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Kara zorel

Olhar para o livro que preciso logo à minha frente, entre os dedos longos de lena luthor , desperta em mim o desejo de simplesmente dar um passo e arrancá-lo de suas mãos.

— Nem pense nisso — ela diz, como se estivesse ciente da natureza dos meus pensamentos. — Essa belezinha será toda minha pelos próximos quinze dias. -

— Eu vi primeiro — afirmo e cruzo os braços, me encostando na estante atrás de mim. — É errado se aproveitar do fato de ser mais alta para ficar com livro. -

— Errado? Eu também tenho que ler esse livro e que diferença fará para você, Kara ? Basta colocar algo no Twitter e em menos de uma semana, terá dez edições diferentes desse livro. Não seja birrenta, isso é feio, ainda mais para uma booktuber. -

Eu sei que o argumento de lena está certo. Eu realmente poderia apenas comentar sobre o que preciso ler e receberia o livro das editoras em troca de apenas mencioná-los em minhas redes sociais. É assim que funciona o mundo das permutas, mas eu não posso mais fazer isso, não apenas porque abandonei meu canal, mas porque eu perdi minha reputação.

Ter a noção disso machuca e me preocupa ao mesmo tempo. Eu sei que é apenas um livro e que se fosse em outros tempos, poderia comprá-lo, mas na atual situação financeira da minha família, e sem minha contribuição, não posso ter certos luxos. Será que as pessoas só têm noção da vida simples que levam, com problemas comuns, depois que tudo muda?

Olho para as prateleiras ao meu redor, ainda sentindo aquele sentimento de pertencimento, e penso se algum dia terei coragem de voltar a ser a Kara do Pink-Romance, uma booktuber reconhecida e respeitada por suas boas avaliações e paixão por romances com finais felizes.

Pensar no meu trabalho também me lembra de que quando comecei, não tinha nenhum livro e que muitas vezes esperava Alex terminar de ler algum livro para que eu também pudesse aproveitar, porque apesar de a minha família ter mais condições antes, ainda assim não dava para me dar tantos livros quanto eu queria, então minha prima e eu fazíamos listas e comprávamos o que a outra não podia ter.

Olho mais uma vez para o livro nas mãos de lena e decido que não irei brigar. Eu sei que o vi primeiro, mas esperar para ler não é uma novidade para mim e ainda quero conservar aquele sentimento bom da terapia de que posso fazer qualquer coisa. Brigar me faz ficar ansiosa, com raiva e eu não quero ter de lidar com esse tipo de sentimento hoje, na verdade só quero tentar aproveitar a aula como antes.

— Quando você terminar de ler, me avisa que eu pego o livro. - lena  arregala os olhos, provavelmente estava pronta para brigar, mas apenas dou de ombros e sigo o caminho até o balcão da biblioteca, decidida a ler Dom Casmurro primeiro, mesmo que a história que mais tenha me chamado a atenção seja a outra.

Eu escuto o barulho de conversas antes mesmo de chegar e assim que meu pé cruza a entrada, vejo as pessoas aglomeradas nas mesas, em pé perto da papelaria e dos locais destinados ao Xerox. São tantas pessoas que eu fico estática, as vozes fazem com que meu coração fique acelerado.

Sinto meu estômago revirar. Tento dizer a mim mesma que são apenas pessoas conversando e que não existe nada de ameaçador nisso, mesmo que eu tenha me desacostumado a esse ambiente, ficando sempre em casa e me sentindo segura ao lado da minha mãe.

Sei o quanto é ridículo uma garota de dezenove anos sentir a necessidade de estar próxima da mãe, mas é como se mamãe fosse a minha segurança, aquela pessoa que me garante que tudo vai ficar bem. Até mesmo o perfume dela me acalma.

Cat diz que não há nada de errado eu ter uma pessoa que faça com que me sinta segura e que é muito certo ter alguém que saiba lidar com minhas crises de pânico, mas que ainda assim, devo tentar as coisas por mim mesma.

Se não fôssemos OpostasWhere stories live. Discover now