Senhorita Primavera

Parte 3

Ciúme atingiu Leo a de longe observar, então para roubar minha atenção cavucou prateleiras inferiores onde havia de One Piece à 20th Century Boys e retirou meu primeiro contato com sexo: mangá A Girl on The Shore sobre dois adolescentes em relacionamento casual. Curiosidade, nojo, confusão. Olhos infantis refletiram desenhos de genitálias feminina e masculina, porém a minha era diferente daqueles; iria aparecer na medida que eu crescesse? Bom, se dava pra fazer xixi, não devia fazer diferença nenhuma... Folheando fui interrompida por Marilú arrancando-me o livrete da mão; já às nove, após lanche, fomos postos à cama na base de broncas. Mas aquilo me fascinou de tal forma que deitada entre Melody e Leo, ouvindo brando funk ao ar, massageei lateral da barriga com ponta das unhas. A ponderar, "Eu existo...?"

Engrenagens que giravam no cérebro levaram-me à sala naquela noite, aproximadamente onze horas. Parei encarando o homem e a mulher que cochilavam no sofá, frente a televisão ligada numa novela qualquer. Assisti-os por minutos roncar como minha barriga. Então fui pra cozinha, subi cadeira para alcançar a pia e peguei uma faca... pois colheres estavam sujas. Abri a geladeira, apanhei caixa de leite, cortei lacre tanto como meu dedo; derramei mais do que enchi o copo em cima da mesa. Aí pus-me a retirar o pó achocolatado do pote com o talher inapropriado e misturar. "Eu existo." Afirmei angustiada. Quando fui guardar a caixa, pé escorregou no leite que vazou pro chão. Bam! Meu corpo caiu. Crack! Cacos espalharam. Ensopada, fui dentre os vidros na ponta dos pés, corri pelo corredor para checar se haviam despertado. Ainda bem que, cochilavam feito anjos...

Explorei a procura de panos, quando não encontrei, usei meu pijama para secar e embrulhar toda a prova do crime. Carregando trouxa cortante saí pro quintal e me livrei dos pedacinhos atrás do primeiro arbusto que vi. "Eu existo." Repeti. Adentrei, meu plano foi esconder as roupas no tanquinho cheio em um dos banheiros; voltei ao quarto e fui recebida pelo beagle, assim que a porta fechou, barulho da TV cessou... Eu estava nua e passos aproximando despertaram desespero. Me apressei a vasculhar o guarda-roupa e achei meu vestido de quadrilha, no meio do caminho percebi ser uma péssima ideia então arremessei-o pra baixo da cama e frenética retornei. Tap, Tap, Tap... chegava cada vez mais perto. Roubei camiseta verde e shorts praianos de Leonardo, me enfiei neles e deitei! Alguém entrou, checou e foi embora. Ali permaneci como se acabada de nascer à meia noite, parida naquela cama.

À manhã seguinte, acordei com Marilú desenhando um bigode em Leo sentado ao colchão. "Bom dia flor do dia!" Ela falou. Sentei também e ao despreguiçar, notei um band-aid na ponta do meu indicador... confusa o encarei. "Você esqueceu a caixa de leite em cima da mesa." Sorriu mãe, "Não tinha nada que fazer isso." E sorriso desvaneceu. "Se queria achocolatado, tinha que ter me acordado.” Por sorte, já estávamos atrasadas pra festinha então ela conteve sua lição num simples questionamento, "Onde você jogou os cacos de vidro?" Enquanto pegava meu vestido na cômoda? Então o que taquei abaixo da cama devido meu lapso de julgamento... Neste exato momento, gritos estridentes ecoaram pela casa e talvez por todo o bairro. Nós três demos um pulo. Minha audição recém-acordada zumbiu no que entrou ao quarto, Melody, usando o preto vestido caipira, pontilhado de florzinhas rosas e entrelaçado com fitas vermelhas subindo seu tórax. A peça estava completamente rasgada e ensanguentada. Ela mais parecia uma assassina mirim parada à porta...

O beagle bagunceiro tinha pegado o vestido, levado lá fora, achado os cacos e tentado beber o leite derramado, e cortado os lábios e blá blá blá. Tinham rastros de sangue nos pisos mas graças à Deus, nada grave ocorreu... bom, nada além de Melody bater seu pé no chão ao gritar "Não! Não! Não!" enquanto Marilú tentava explicar que ela precisaria dançar co'outra veste. Melody estapeou o cachorro, havia muita raiva em meninazinha pequena demais…