20 - Rosas de Desespero

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Não foi tão difícil explicar o funcionamento real de Limáni para Obster, que estava realmente interessado no assunto e aproveitou cada mínimo detalhe que só um zé ninguém que cresceu na marginalidade como eu poderia saber

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Não foi tão difícil explicar o funcionamento real de Limáni para Obster, que estava realmente interessado no assunto e aproveitou cada mínimo detalhe que só um zé ninguém que cresceu na marginalidade como eu poderia saber. A conversa correu tão bem que me vi nostálgica contando sobre Corredor, o melhor ladrão que essa cidade já viu, ele roubava dinheiro da nobreza como se fosse fácil.

O sujeito habitava num dos níveis mais profundos da cidade de baixo, tornando sua captura impossível para Guarda uma vez que ele conseguia se esgueirar para os túneis. Leônidas era o herói para todos as crianças da favela, que, como eu, sonhavam ter metade do talento dele, era um homem simples de sorriso gostoso, melhor amigo de Amadeus desde a infância e até hoje há o vazio de sua presença nos becos.

Nostalgia envolveu meu aposento na segurança de saber que Farvi não vai ser problema tão cedo, sonhei com meu aniversário de treze anos onde finalmente me meti a beber com os adultos no botequim que Arnaldo sempre frequenta. Todos sorriam naquela noite, Leônidas apareceu muito tarde e reclamou ao encontrar crianças no lugar, contou histórias a Batata, Tortão e eu sobre seus feitos passados quando ainda tinha nossa idade.

Por fim na emoção do álcool insisti tanto para ganhar um mísero beijo, que após torcer o nariz e constatar que eu não daria "uma moça para casar" — frase que fez todos os presentes caírem na gargalhada —, consegui ganhar um beijo inocente na testa do homem magricelo e alegre. Foi a última vez que o vi vivo, alguns meses depois seria preso e executado pela guarda.

Minha fuga, a conversa com Farvi e o encontro com Nihor pareceram um sonho desconexo ao acordar, mas a silhueta em pé na varanda fez questão de me lembrar que tudo aquilo realmente aconteceu após negociar com Obster. Não faço ideia de como voltei pra cá, mas logo que comecei a me erguer, Nihor tomou rumo à minha cama e só pude suspirar exausta de tudo isso. É estranho pensar que a rotina de incertezas na favela eu ainda consegui ser alegre, ver meus heróis de perto e aproveitar do pouco que tinha.

— Você mexeu na minha cabeça?

Minhas memórias estão realmente confusas, cenas oscilantes de rostos conhecidos e um vazio profundo no peito me atormentam.

— Não, Farvi conseguiu puxar alguma informação de você quando o respondeu... Imagino que tenha sonhado com alguém que ama.

Alguns dos rostos em minha cabeça se tornam mais confusos ainda com essa explicação, Nihor deve ter enlouquecido com a idade ou pelos desejos homicidas para com minha pessoa. Ele checa minha temperatura e então volta a me olhar irritado, o que me faz ter certeza que estou bem de saúde, mas não por muito tempo.

— Há uma diferença entre gostar de me desafiar e tentar se matar, Elin, é um milagre ter saído viva dessa insanidade.

— Olhe, tive um sonho muito bom com alguém querido que morreu, não vou azedar minha manhã com seu pessimismo — retruco imitando a cara feia.

Eleita da DiscórdiaWhere stories live. Discover now