o início

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— Nossa primeira viagem de casados foi incrível. — eu disse assim que chegamos em São Paulo.

A primeira de muitas. — ele disse entrelaçando nossas mãos.

O hotel onde ficamos era lindo e nós passamos dias encantados no Havaí, nós finalmente tivemos a lua de mel que merecemos e aquele lugar era o verdadeiro paraíso. Nós passamos o ano novo sob o céu mais lindo que eu já vi, são momentos que jamais vou esquecer.

Desde que nós nos casamos a alguns meses atrás estávamos planejando nossa lua de mel mas estávamos só esperando as férias de Raphael pelo Palmeiras para viajar e como só acontece no final do ano a gente ficou ansioso na espera.

Eu precisava muito daquele momento.

Faz cinco meses que eu descobri que tenho um linfoma de Hodgkin e esse é meu último mês de vida, acontece que o câncer já comprometeu todo o meu organismo e mesmo com o tratamento o médico me disse que eu deveria aproveitar esse tempo o máximo que eu pudesse porque não havia esperança, ninguém além de mim e do meu médico sabem disso e eu não quis contar a mais ninguém pra que esses meses não sejam o tormento da minha família e do meu marido. Quando o médico me contou sobre esses últimos meses eu fiz o meu casamento ser a coisa mais linda do meu ano, foi a noite mais mágica que eu já vivi com Raphael e nós fizemos juras que vão ficar pra sempre comigo.

Nós passamos dez dias no Havaí e agora voltamos pro Brasil para passar o resto das férias com as nossas famílias, na frente deles eu nunca demonstrei nenhum sinal de fraqueza e tento sempre parecer a pessoa saudável que todo mundo conhece. Assim que desembarcamos em São Paulo já avistamos minha mãe que veio nos buscar e assim que ela nos viu veio correndo nos abraçar.

— Filhota, que saudade! — ela disse grudando em mim.

— Foram só dez dias longe, dona Márcia. — eu disse fazendo ela rir.

— Meu genro, você cuidou bem dela? — ela perguntou recebendo beijos de Rapha.

— Sempre! — ele sorriu.

Raphael e eu namoramos desde os 18 anos e ele é o meu primeiro amor, minha mãe é completamente apaixonada por ele e cuida dele como se ele fosse um filho. É a maior incentivadora do nosso relacionamento desde sempre e toda vez que a gente fica longe ela morre de saudade, fico me perguntando como ela vai ficar depois que eu for embora.

Quem vai pra casa dela nos fins de semana fazer as unhas dela, arrumar o cabelo, ver Ritmo Quente e morrer de amores pelo Patrick Swayze? E o meu pai? Quem vai ajudar ele a mexer no computador, a olhar os emails, quem vai sentar pra ver um jogo do Palmeiras com ele?

E o Rapha?

Quem vai torcer por ele feito maluca no Allianz? Quem vai acordá-lo com um beijo todos os dias e deixar uma surpresa em sua mochila quando ele viaja com o time? Quem vai dançar com ele no meio da sala quando toca a sua música preferida?

Me peguei distraída no carro olhando pela janela enquanto minha mãe e Rapha cantam alegremente, esses momentos vão me fazer a maior falta do mundo. Assim que chegamos em casa já passava das nove da manhã, nós iríamos amanhã para Maresias com as nossas famílias passar o resto das férias e precisávamos descansar hoje porque estávamos exaustos.

Minha mãe tinha um compromisso então só tomou um café com a gente e depois foi embora, nós dormimos um pouco depois do almoço e quando acordamos no fim da tarde ele pediu uma pizza e nós fomos assistir um filme. Nós éramos caseiros e meu pai sempre nos chamava de velhos mas a gente adorava esse programinha de pijama no sofá, amanhã iríamos pra Maresias e eu sei que não seria essa paz.

Casa cheia, família enorme, piscina, praia, muita bagunça... eu já posso imaginar o quanto isso também vai me fazer falta porque eu gosto muito. Levantei para tomar um remédio que fazia parte do meu tratamento enquanto Rapha estava distraído com o filme, troquei todos os frascos e ele acha que são vitaminas que qualquer mulher toma, eles éram fortes e algumas vezes me faziam me sentir mal mas eles também me fazem ter um pouco mais de resistência mesmo quando me sinto fraca.

Olhei uma foto nossa na mesinha de cabeceira e por um momento uma tristeza profunda me tomou, fico pensando nas coisas que perderemos e dentre elas a mais especial: nosso bebê.

Rapha e eu somos apaixonados por criança e sempre falamos sobre a que queremos ter, é o nosso maior sonho e eu sinto tanto em não poder realizar. Eu queria que nós fôssemos infinitos.
Senti o nó na garganta e quando percebi já estava chorando copiosamente na cama sem conseguir parar de maneira alguma, eu perderia toda a vida com Rapha e tudo o que eu idealizei desde os meus 18 anos vai ser só uma memória dele.

— Amor? — ouvi a voz dele no quarto.

— Meu deus, o que aconteceu? — ele correu para me abraçar.

Eu não conseguia falar nada e ele só me abraçou tentando me acalmar, sua boca no topo da minha cabeça diziam coisas que aos poucos iam me fazendo cessar o choro até que ele parasse por completo. Rapha sempre conseguia me acalmar não importava a situação.

— Tá tudo bem agora? — perguntou me olhando.

— Sim. — eu respondi secando as lágrimas.

— O que houve? Foi uma crise de ansiedade? — perguntou preocupado.

— Acho que sim. — eu disse e ele sentou na minha frente.

— É só respirar fundo, eu tô aqui com você. — ele disse e eu sorri de leve.

— Eu te amo muito. — eu disse e ele selou meus lábios.

— Eu também te amo demais. — ele disse unindo nossas testas.

Ele era o cara mais especial que eu já conheci depois do meu pai e me dá uma vontade enorme de chorar toda vez que penso no assunto, já houve algumas vezes que pensei em contar tudo pra ele mas não poderia. Não quero destruir tudo agora e prefiro ser egoísta o suficiente para guardar tudo só pra mim, na minha cabeça isso poupa bem mais ele e a minha família quando eu for embora. Pelo menos eles vão ter uma boa lembrança da gente nesses últimos meses e de como eu fui muito feliz ao lado deles.

A última música • Raphael VeigaWhere stories live. Discover now