100 - TIVE UMA CONVERSA PERTURBADORA COM MINHA FILHA DE 7 ANOS.

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- Papai, papai, eu vi um zumbi.

Eu estava na cozinha fazendo chá quando minha garotinha entrou correndo, ela correu pela porta dos fundos tão rápido que quase tropeçou no degrau, derramei água fervendo da chaleira em uma caneca mal olhando para ela.

- Ah, foi querida, você viu?

-Sim, sim, papai, eu vi, seu rosto estava todo pálido e bagunçado, era muito nojento papai.

Eu coloquei a chaleira de volta e peguei o leite, eu respirei profundamente, eu realmente tinha que ser mais cuidadoso com o que eu assistia na TV durante a noite, Rose tem o hábito de esgueirar-se escada abaixo à noite e na semana passada ela me pegou assistindo The Walking Dead e desde então ela não consegue tirar os zumbis da cabeça, eu continuo dizendo a ela que eles não são reais, mas isso não parece fazer diferença.

- Querida, o que nós já falamos sobre zumbis?

Eu tirei o saquinho de chá da caneca e joguei no lixo.

-Você sabe que se continuar falando sobre eles, papai vai ter problemas com a mamãe novamente.

- Sim papai, mas eu vi um.

- Sim, eu sei querida, mas eu já verifiquei o quintal duas vezes ontem e posso prometer que é uma zona livre de zumbis.

-Não, mas não foi no quintal.

- Como é?

-Ele não estava no quintal.

Eu levei a caneca até os lábios, mas voltei pra mesa novamente. Eu me virei para olhar para a Rose, seus cabelos estavam bagunçados pelo vento e suas pequenas bochechas muito vermelhas, como se ela tivesse acabado de correr.

- Amor?

Coloquei minha melhor voz severa como pai.

- Vou fazer uma pergunta e quero que você seja sincera comigo. Você estava andando de bicicleta na rua dos Fundos?

Eu não precisava fazer a pergunta porque eu já sabia a resposta.

Rose pode brincar sozinha no jardim e às vezes se ela nos pedir permissão primeiro, nós a deixamos andar de bicicleta pelo caminho no fundo da nossa casa, aquele que passa por todos os jardins dos outros vizinhos, mas é claro ela pode fazer isso com a nossa permissão. O nosso bairro é muito seguro, mas como aquele ditado diz, todo cuidado é pouco, há alguns meses atrás houve um roubo em uma estrada próxima, e no ano passado alguém foi assaltado na rua principal, alguns anos atrás em uma cidade um menino desapareceu, isso estava muito longe daqui, é claro, mas foi uma notícia nacional por alguns dias até as buscas fracassarem, e isso deixou os pais muito mais cautelosos, Rose estava ficando mais velha e ela era uma garota muito aventureira, mas ainda assim precisa ter limites. Em algumas ocasiões ultimamente Rose tem cruzado esse limite, andando de bicicleta mais longe do que deveria, não entrando imediatamente quando a chamamos, esqueirando-se pelo portão dos fundos quando ela só estava brincando no jardim. Enquanto eu olhava para a Rose agora notei seu rosto ficando cada vez mais vermelho, ela olhou para longe de mim, para o chão da cozinha e arrastou os pés.

- Papai eu só saí um pouco. Ela disse.

- Eu só estava conversando com o senhor Wenderson, porquê eu o vi no seu quintal, eu disse olá e ele deu um pulo.

Ai, então aí está, o senhor Wenderson era o zumbi de Rose, ontem era o carteiro, e no dia anterior era um vizinho diferente. Eu tomei um gole de chá e balancei a cabeça, Wenderson era na verdade um candidato melhor para ser o Zumbi, o cara morava sozinho e parece ter cerca de cem anos, rugas por todo o rosto, sua pele parece um balão vazio, porém sempre que conversava com ele sobre a cerca do jardim ele parecia estar bem, só um pouco solitário, eu não poderia ter Rose andando por aí chamando as pessoas de Zumbi.

- Querida, me ouça. Eu sei que você não foi longe nem nada, mas eu não quero que você...

- Mas eu voltei logo depois, papai. Rose interrompeu.

Ela estava olhando pra mim agora, olhos azuis, grandes e suplicantes.

- Eu prometo papai. Eu até disse não quando o senhor Wenderson me ofereceu um sorvete, porquê eu sei que você não gosta que eu pegue coisas de estranhos.

Eu abri minha boca para responder e parei.

- Ele ofereceu sorvete pra você?

-Sim ele ofereceu, mas eu disse que não, o senhor Wenderson realmente queria que eu entrasse e pegasse um na casa dele, mas eu disse a ele que eu tinha que ir pra casa e depois eu voltei aqui pra dizer que eu tinha visto um zumbi.

Rose estava balbuceando agora sua voz unindo como motor, mas eu parei de ouvir, minha mente ainda estava presa em algo que ela havia dito um momento antes, o senhor Wenderson realmente queria que ela entrasse e pegasse um, tomei outro gole de chá e fiz uma careta, isso não era bom, eu não me importava com os vizinhos conversando com minha garotinha, mas eu não gostava do pensamento deles a convidando para entrar, não sem nós lá, nem que fossem apenas velhinhos, gentis e solidários.

Eu decidi ir dar uma volta e visitar o senhor Wenderson mais tarde, e lhe dizer isso pessoalmente, gentilmente é claro, mas com muita firmeza. No final porém, eu não tive chance, porquê alguns momentos depois que eu tive o pensamento Rose disse outra coisa, algo que afastou tudo da minha mente e acabou com qualquer ideia que eu pudesse ter de ir até a casa do senhor Wenderson, ela disse algo que me deixou completamente assustado.

- Por favor papai, não me impeça de brincar no jardim, prometo que não vou mais fugir, eu não quero que o Zumbi me pegue.

- Rose, eu não vou impedi-la de brincar no jardim, mas você tem que me fazer algumas promessas também. Primeiro, prometa-me que você vai parar de chamar as pessoas de zumbi, o senhor Wenderson é muito velho, ele não é um morto vivo.

Rose franziu a testa.

- Mas eu não fiz isso.

- O que você quer dizer com não? Você acabou de chegar aqui alguns minutos atrás chamando ele de um.

- Não eu não fiz isso.

- O senhor Wenderson não era um zumbi, eu vi o zumbi na casa dele mas não era ele.

Eu fiz uma careta, eu coloquei a caneca na mesa e comecei a bater os dedos na mesa e ansiedade.

- Como assim, querida? Você viu alguém na casa dele?

- Sim, eu pude vê-lo papai. Ele estava pressionado contra a pequena janela do porão enquanto eu conversava com o senhor Wenderson.

Meu corpo inteiro estremeceu nesse momento.

- O quê?

- Sim papai, foi realmente assustador, seu rosto estava todo ferido, ensanguentado, e sua boca estava aberta como se estivesse gritando comigo, mas você sabe o que mais me deixou confusa, papai?

Eu tentei manter minha voz firme.

- O que querida?

- Bem, eu não sabia que as crianças também poderiam ser zumbis, pensei que eram apenas adultos, mas eu acho que devo estar errada, porquê a pessoa no porão do senhor Wenderson parecia um garotinho.

Contos De Terror 1° EDIÇÃOOnde as histórias ganham vida. Descobre agora