XV - Conversa franca

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"Miranda, Douglas Miller está aqui." Emilly anunciou abrindo caminho para o rapaz. A editora, que estava virada para a janela, girou o corpo reconhecendo a presença do rapaz.

"Douglas." ela disse meneando a cabeça levemente. "Gostaria de uma água, café, chá?" Emilly arregalou os olhos levemente. Miranda nunca oferecia nada, geralmente essas coisas eram tratadas por ela, mas não de forma tão breve. 

"Uma água, por favor."

"Emilly, duas águas." A ruiva rapidamente pegou duas garrafas de San Pellegrino, dois copos, e os colocou na mesa. "Douglas, sente-se por favor." Miranda apontou genericamente em direção as cadeiras posicionadas em frente a sua mesa. "Emilly, feche a porta e não nos incomode em hipótese nenhuma. Isso é tudo." Mais uma vez a assistente arregalou os olhos, desta vez preocupada com o rapaz que estava ali.

Assim que a posta se fechou, Miranda abriu uma pasta de cima da mesa e puxou o papel. Parecia muito surreal, mas apesar das mãos estáveis, seu interior parecia tremer.

"Reconheço esta caligrafia como sua. Correto?"

"Sim." Douglas quase sussurrou.

"Quanto?"

"O quê?" Ele parecia confuso agora.

"Quanto você quer para não contar a Andrea quem eu sou?"

Ele sorriu. Da maneira mais estranha do mundo, em uma reação que Miranda nunca recebera antes, ele respirou fundo e fechou os olhos por uns cinco segundos. Quando abriu, seu rosto tinha uma expressão serena e todo o seu nervosismo tinha simplesmente dissipado.

"Em nome da minha preocupação com uma das minhas melhores amigas, a Andrea, e em consideração ao seu motorista que foi seu grande advogado hoje - e muito insistente para que eu viesse aqui -  nós vamos começar de novo. Você tem exatamente um minuto para perder a atitude e então nós vamos conversar como pessoas civilizadas."

Ela abriu a boca e fechou. Abriu de novo. Fechou.

"Eu não vim aqui para conversar com a editora chefe, nem com a rainha de gelo, nem com a La Priestly. Esta eu conheço, leio todas as cartas editoriais desde os meus quinze anos, escuto rumores. Eu estou aqui para falar com a mulher que esteve no meu café e se apresentou com um sorriso no rosto. A mulher que te feito Andrea dormir em um horário razoável e de quem ela fala com um sorriso largo, com os olhos brilhando. Eu posso falar com a Miriam?"

Miranda sentiu o rosto arder, os olhos lagrimejando um pouco. Ela respirou fundo, considerando que cada palavra do rapaz exalava sinceridade. Estava muito claro o motivo dele ser um amigo tão próximo de sua Andrea, eles eram absolutamente parecidos.

"Tudo bem, Douglas, vamos conversar. Vejo que você tem em interesse no bem-estar de Andrea. Me desculpe se o julguei de maneira errada, mas é geralmente dessa forma que as coisas funcionam no meu mundo."

"Eu entendo. Desculpas aceitas."

"Posso perguntar como você descobriu?" Ela alcançou o copo, bebericando um pouco de água.

"Claro." Ele retirou um cartão do bolso. "Da primeira vez que você esteve no café, eu achei a figura muito familiar, mas dado ao seu estado na dita ocasião, achei improvável que alguém conhecida por extremo controle emocional fosse desabar ali." Disse de forma leve e Miranda sinalizou com a cabeça para que ele continuasse. "Acontece que da segunda vez em esteve no café, assim que você e a Andy saíram eu fui varrer o salão e isso estava caído bem onde você estivera minutos antes." Ele colocou o cartão em cimada mesa e ela reconheceu seu cartão de visitas rolando os olhos com a própria ingenuidade.

"Sendo tão bom amigo da Andrea você não contou a ela o que descobriu? Por quê?"

"Acredito que na atual situação eu poderia te perguntar a mesma coisa, não?" Quando Miranda ia responder, quase se sentindo ofendida pelo tom de voz do rapaz, ele continuou. "Eu e a Andy conversamos algumas vezes sobre você. Eu tentei sinalizar algumas coisas para ela. A verdade é que ela sabe que você esconde algo, ela sente, e, ao mesmo tempo, ela tem completa confiança em você, Miranda. Ela inclusive tem um acordo com ela mesma sobre nunca jogar o seu nome no google, porque não quer ser influenciada por opiniões alheias em relação a você. Os instintos dela, junto ao que você a proporciona quando estão juntas, tudo isso deixa claro para ela que você é uma mulher influente. Ela não é boba, ela só confia em você."

A mulher sentia seu coração apertar. Como pôde ter deixado as coisas irem tão longe desse jeito? "Eu não tinha intenção de... eu não..." Nada parecia soar certo aos seus ouvidos.

"Eu vejo agora as coisas com mais clareza. Antes eu pensava que você estava tentando se aproveitar de alguma forma. A verdade é que o Roy está certo." Ele sorriu de forma genuína.

"Roy?"

"Sim, ele disse que vocês duas juntas tem algo especial. Eu consigo ver isso agora, porque só de pensar nela os seus olhos brilham do mesmo jeito que os dela brilham ao falar de você."

Miranda umedeceu os próprios lábios com a ponta da língua, em seguida bebeu mais água, utilizando o tempo para deixar assentar tudo o que acabara de ouvir.

"Porque só agora você entrou em contato comigo?"

Ele ponderou por alguns segundos. "Eu estive vendo nas últimas semanas alguém que considero como irmã se apaixonar da maneira mais pura que pode acontecer, Miranda. Eu sei que tem muita coisa que ela ainda não te contou, mas a maneira como ela está se entregando a isso é algo que eu não esperava mais ver. Não quero que ela volte ao estado de dormência em que vivia antes."

"Muito bem... Eu não esperava que a Andrea fosse se tornar alguém tão importante em minha vida. Também não vou negar aqui que sinto algo, porque você me observou e pontuou muito bem o que viu, seria um insulto a sua inteligência dizer o contrário." Ela se levantou e olhou para fora da janela. "Eu planejo conversar com ela depois da semana de moda de Paris, porque antes de pensar em nós duas preciso pesar nas minhas filhas e ver como elas se adaptariam a toda situação."

"Por mim, tudo bem. Eu não estou aqui como um inimigo, Miranda. Estou aqui como aliado. Qualquer pessoa que trate Andy com respeito e que a faça sentir especial tem valiosos pontos comigo." Ele pausou por um momento. "Eu também não vou fingir que você não se moveu por trás das cortinas para que os artigos dela começassem a ser publicados em grandes jornais e revistas." Ela rolou os olhos.

"Eu posso, ou não, ter mencionado o nome dela, algumas vezes." Desta vez Miranda sorriu, uma onda de alívio a tomava. Pela primeira vez tinha esperança real de conseguir contar a verdade sem destruir tudo. "Obrigada pela conversa franca, Douglas. Sua sinceridade é muito apreciada e eu não vou esquecer disso."

"Obrigado por conversar comigo."

Agora mais relaxada, ela conseguia ver que ele tinha se vestido de forma meticulosa para encontrá-la. Claramente alguém que lia a revista e que tinha extremo respeito por seu trabalho.

"Agora que colocamos tudo em pratos limpos, que tal um tour comigo pelos corredores da Runway?"

Os olhos dele brilharam de forma radiante. "S-sério? Seria uma honra."

"Então vamos." 

Ela lincou um dos braços com ele e os dois saíram relaxados, Miranda explicava a escolha dos vidros para os corredores e sobre como o layout físico do escritório também tinha impacto sobre o produto final da revista.

Emilly estava na cozinha quando ouviu a porta do escritório abrir. Ao ver o desenrolar da cena, ela sentiu a necessidade de se sentar em um dos bancos. "Eu amo o meu trabalho."  Ela murmurou enquanto as duas vozes desapareceram corredor afora.






Dois Cafés (Mirandy)Où les histoires vivent. Découvrez maintenant