Capitulo 17

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Ainda a Gabi não tinha chegado a casa, já eu sabia o que ela tinha feito. Não o soube pela Gabi, não soube pelo Steff, nem mesmo pela minha mãe. Se em Trás-os-montes existia a D. Olinda, na igreja que a minha mãe frequentava todas as mulheres eram Donas Olindas.

Não há muito para contar, mas a história chegou a mim porque a mãe de alguém, contou à tia de uma pessoa, essa pessoa contou a um primo, o primo falou com o irmão e o cunhado do irmão tinha sido meu colega de carteira no colégio. Foi assim que eu recebi a informação.

Fico perdido sem saber o que sentir, ou o que fazer. Não consigo ficar feliz, nem ficar triste…sinto a ausência de qualquer sentimento!

A lógica diz que os boatos não são exagerados, vindo da Gabi até esperava sangue, uns dentes partidos e gritos, muitos e bons gritos. Mas não houve nada disto, apenas chegou a mim uma troca de palavras dura e a humilhação que a minha deve ter sentido…mas não quero pensar nisso!

A casa já começou a ganhar vida, oiço a Vicki correr de um lado para o outro. Steff vai falando com ela num tom baixo e ela ri com cada palavra que ele diz.

Não vejo, mas imagino a cena, mas os protagonistas são, a Lexie, eu e uma criança, que eu não quero que exista.

Na minha mente não existem muletas, nem doenças, eu nunca a deixei. No meu sonho somos apenas nós de volta de uma mesa a tomar um daqueles pequenos-almoços cinematográficos, a olharmos para o relógio, porque temos de nos apressar…um almoço familiar com a minha mãe, é isso mesmo, com a minha mãe que nos aguarda…

Na minha cabeça, levanto-me da mesa com a agilidade de anos que já não existe, dou-lhe um beijo, ela faz má cara porque diz que eu sou sempre o primeiro a arranjar-me. Eu pisco-lhe o olho…

Sonhar acordado é triste…uma percentagem de nós fica ali a ver a cena passar à nossa frente, enquanto a outra nos faz abrir os olhos para ver o que nos rodeia, para nos dizer que nada do que queremos é real.

Tenho sonhado imenso acordado e a dormir.

Existem dias em que acordo durante a noite a transpirar, com o coração a bater a mil à hora, com os olhos húmidos…tento-a alcançar e não consigo. Ela parte com David, ou com algum outro homem que eu não conheço e nem olha para trás. Eu tento correr, tento andar mais rápido, mas as muletas fazem questão de me lembrar que elas existem. Invariavelmente caio, fico prostrado no chão, grito o nome dela, mas a minha voz não se liberta da garganta e os gritos morrem, sem chegar aos meus lábios.

Mas também tenho os sonhos bons, em menos quantidade, em muito menos quantidade. Os sonhos bons fazem-me sentir um tarado, acordo sempre no melhor momento e geralmente com uma erecção mostra. Sinto-me culpado por ser com o seu corpo que eu sonho, ela é tão mais que isso, mas é com ele que eu sonho. Arranjei uma explicação plausível, para me sentir melhor, não sei.

Quando fazíamos amor, quando estávamos nus de corpo e alma, não existia mais ninguém, não existia nada. Não existia um passado para nos atormentar, um prazo para nos amar-mos, nem existia ninguém que nos pudesse arrancar um do outro. Éramos um do outro, como se fossemos os únicos habitantes da terra, os sobreviventes de um acidente apocalíptico.

O arrependimento é uma das piores coisas que existe. O arrependimento vem do que eu gostava de ter dito e não disse. Nunca lhe quis dizer muita coisa, mas aquela que eu quis e não disse, dá cabo de mim. Todas as vezes que fizemos amor, eu quis dizer que a amava. Nunca lhe sussurrei ao ouvido o quanto a amava, o quanto ela era importante, em vez disso disse-lhe: “Que a amava foder…!”, “Que amava estar dentro dela…”, “Que amava o modo como ela gemia e dizia o meu nome.” ou “que amava o jeito que ela me deixava excitado”, disse que a amava as acções dela, sempre dentro de um contexto…mas nunca disse que a amava, que amava toda a embalagem e o conteúdo.

Quando te deixei, amor (disponível até 03/05)Where stories live. Discover now