Capítulo 8 - Iris Thompson

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Casarão dos Thompsons: 17/03/2015 - Segunda-feira , 2 a.m.


A rua estava vazia e, do outro lado dela vislumbrava a casa de Liz, que estava com todas as luzes apagadas como as daqui. Tomava coragem para entrar em casa, por isso fiquei sentada na varanda onde morava, com os pés cansados e doloridos de tanto dançar. Tinha certeza de que as tiras douradas da minha sandália estavam marcando e cortando a pele do delicado pé, o que os fariam arder ainda mais quando entrassem em contato com a água quente do banho, que pretendia tomar ao subir as escadas da sala de estar. Dancei tanto naquela pista de dança que não havia um centímetro do meu corpo por onde o suor não tenha passeado, no entanto valeu muito a pena. Me diverti da maneira que mais gostava e essa noite foi sensacional. Estar com eles era uma das coisas que mais apreciava fazer, além é claro, de sair com a Liz. No entanto, minha amiga de infância nunca gostou de chamar a atenção de ninguém, como eu costumava fazer quando estava dançando. Apesar de ser uma exímia dançarina de balé e não ter vergonha de se apresentar para uma plateia bem maior do que numa simples pista de dança; o que eu não conseguia entender, entretanto respeitava. Gostaria de leva-la comigo nessas saídas e aproximá-la dos meus colegas porque ela mesma não tinha muitos amigos. Incontestavelmente, eu era uma das poucas a saber como lidar com sua personalidade retraída.

Na noite anterior, pois acabara de passar das duas da manhã, saí com meus colegas de faculdade. Éramos um grupo de cinco pessoas, que costumavam sair aos finais de semana: o David, o Jason, a Sabrina, o Myke (nosso motorista que não bebia nunca), e eu. Há pouco mais de cinco minutos, ele me deixou perto da entrada da casa, onde meu carro encontrava-se estacionado e vim andando até aqui. Não tive coragem para continuar, por estar zonza por conta da bebida ingerida nas últimas horas e como estava escuro, não consegui encontrar minha chave. Muito menos, encontraria o buraco da fechadura para enfiá-la.

Mais um carro passara na rua e esse parou ao lado da minha casa, na garagem vizinha. Uma mulher usando um vestido vermelho com muitos brilhos, acreditava eu, abriu a porta do carro preto e saiu com uma criança desacordada no colo, equilibrando-se num salto bem maior que o meu. Enquanto choramingava por estar com os pés cortados, ela carregava uma menina em seu colo, que devia pesar uns dez quilos. Revirei os olhos para a cena ao meu lado e pensei que deveria parar de me lamuriar pelas dores que sentira nesta madrugada fria: os pés dela deviam estar bem mais doloridos que os meus.

Por isso, remexi mais uma vez o conteúdo da minha bolsa de mão, que largara nos degraus da escada. Busquei o objeto metálico, tentando encontrá-lo pelo ruído que faria logo assim que o encontrasse, entretanto comecei a ficar irritada por não conseguir localizar a porcaria da chave e até considerei a ideia de revirar todo o conteúdo no piso de madeira. Porém, a minha irritação evaporou e o alívio surgira ao sentir o chaveiro da Torre Eiffel nas pontas dos meus dedos, que prendia todo o molho de chaves.

Levantei devagar dos degraus e ao ficar em pé, ajeitei a bolsa em meu ombro para abrir a porta. Não foi difícil e logo a escancarei, já imaginando que bateria com força na parede oposta.

- Oops! – murmurei, encolhendo os ombros teatralmente.

Retirei um dos sapatos e sustentei meu corpo no batente da porta. O piso branco e preto parecia fazer uma dança em espiral e quase caí de cara no chão, ao desenroscar o fecho da sandália que insistia em ficar presa em meu tornozelo.

O alívio que meus pés sentiram ao tocar o piso frio foi indescritível. Sabe quando você passa horas e horas, com um sapato apertado e ao retirar o objeto de tortura parece que o mais duro solo lhe parece uma nuvem, ou melhor, o paraíso? Então, isso foi o que senti.

Primavera Sem Rumo (Livro 1) - CompletoWhere stories live. Discover now