(5) Apenas Jack

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O dia passou demoradamente. Aproximadamente meia hora depois de Luca ir embora, Jack me carregou até a cozinha -eu insisti para que ele me deixasse andar, mas o garoto não aceitou-, colocou-me em uma das cadeiras de madeira envernizada, e com minhas indicações, preparou arroz -acabou deixando que queimasse um pouco-, purê de batata, bife -escolhido por ele, obviamente por ser algo mais fácil para se preparar- e salada de rabanetes. Depois do almoço, jogamos xadrez -este não foi muito divertido, pois meu adversário ganhou a maior parte das rodadas-, e até Xbox. Conversamos um pouco sobre filmes, o que não foi muito emocionante já que ele sempre gostara de filmes de ação, e eu, comédia. Eram 16h30 quando já não tínhamos mais nada para nos entreter.

— Luca está estudando?

— Não, ele... é meu professor.

Estávamos sentados no sofá. Jack arqueou uma das sobrancelhas.

— Sério? Ele deve ter uns vinte anos, no máximo.

— Também achei estranho. Mas, quem sabe ele prove que idade não é sinônimo de eficiência, não é?

Queria terminar logo com aquele assunto.

— É... talvez. — Respondeu ele, parecendo pensar em outra coisa por um momento. — Sabe, não o interrompi mais cedo só para provocá-lo, talvez um pouco... Só que... é realmente normal as pessoas faltarem às aulas algumas vezes. — Ele riu.

Eu havia pensado nisso por algum tempo depois que Luca fora embora. Realmente não havia motivo para preocupação. Então, pensei que talvez ele só quisesse me ver e arranjara um pretexto -muito esfarrapado- para isso. Certo. Talvez eu estivesse me superestimando demais, porém, essa era a única resposta imaginável que eu havia encontrado para a visita de Luca.

— Quer pipoca? — Perguntei, levantando-me.

— Ei! — Jack segurou meu braço. — Senta aí, mocinha.

— Jack, posso andar. Não dói nada. — Franzi o cenho. — Bem, incomoda um pouco andar com faixas enroladas nos pés.

— Posso imaginar... — Ele sorriu e me soltou.

Ao caminhar pelo pequeno corredor que me levaria à cozinha, pude sentir seus olhos dourados em cada movimento meu. Ele estava cuidando de mim. Tudo bem, eu havia mentido um pouquinho, alguns cortes ainda ardiam quando pressionados contra o chão, mas não era nada muito grave, o vidro nem cortara profundamente nenhum lugar, foram apenas alguns cortes. Na cozinha, abri um dos armários e peguei um pacote de pipoca para micro-ondas sabor manteiga.

Não estava com fome, a pipoca tinha sido apenas uma desculpa para acabar com o assunto "Luca". Ele e Jack haviam se desentendido poucas horas atrás daquele mesmo dia, seria péssimo se Jack decidisse demiti-lo. Abri o micro-ondas e coloquei o alimento lá dentro. Dois minutos e meio depois já estava pronta a nossa refeição, coloquei-a numa tigela de plástico e fui para a sala. Jack girava no dedo o anel que o pai -adotivo- havia dado a ele poucos meses antes de falecer por conta de uma pneumonia. Mesmo que não o chamasse mais de pai, ele não podia negar, o garoto o amava, e esse amor havia sido recíproco.

— Ele sempre te amou.

Jack me olhou enquanto eu me sentava no sofá ao seu lado.

— Sua mãe também. — Ele me respondeu, então emendou: — Lisa também...

Lisa Bontempo, a garota que me ajudara em tudo em minha vida toda até meus quinze anos. Sempre fora minha irmã e amiga, mas de uma hora para outra, começou a me tratar com desdém, eu acreditava que não havia motivos para isso, mas me senti culpada por qualquer coisa que tivesse feito, e no fim, nem pude pedir desculpas.

Feche os olhos, Anjo (livro 1)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora