VANTE: GIRASSÓIS DE DANTE

By Gabbieah

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[GIRASSÓIS DE DANTE DISPONÍVEL PELA EDITORA EUPHORIA] Depois de doze anos sozinho, seu pai finalmente encontr... More

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Epílogo
Bonus!

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By Gabbieah

HOSEOK

Já faz uma semana que eu tenho sonhado com Taehyung. Sempre naquele episódio da rua, ele parado ao lado da janela do carro, me encarando. Eu ouço a buzina, olho para o semáforo, e quando volto a encarar a janela, ele não está mais lá.

É horrível. Sinto todo o nervosismo que senti na hora, e sempre acordo com o coração acelerado. Não acontece nada demais no sonho, mas ainda sim, acordo como se estivesse acabado de sair do pior dos meus pesadelos.

Corri os olhos por todo quarto, não vendo nada além das luzes da sala entrando pelas frestas da porta.

Atordoado, saí da cama, sem a mínima ideia de que horas eram.

Meus dedos tocaram a maçaneta fria, meus olhos precisaram de um tempo para se acostumar com a luz, ao passar pela porta. Tentei focar a vista em um ponto qualquer, acabando por encontrar Yoongi encolhido no sofá.

Enrolado em um cobertor vermelho, com Holly deitado em seu colo, enquanto assistia um episódio de Another.

– Tudo bem? – perguntou assim que dei a volta na sala em direção a cozinha.

– Eu tenho tido um sonho estranho essa semana – fui direto ao ponto, tirando da geladeira uma das garrafas de água.

– É um pesadelo?

– Não – alcancei um pacote de salgadinhos no armário – No dia em que aquela menina te atropelou com a bicicleta, eu vi o Taehyung na rua – contei, não tinha dito isso a ninguém até então – Desde esse dia, eu tenho sonhado com ele.

– Vocês conversaram?

– Não, eu estava indo buscar Jimin no trabalho, parei no sinal fechado e ele estava passando na calçada. Com outros dois garotos em direção a faculdade – expliquei, deixando a memória desse dia invadir meus pensamentos de novo – Taehyung me viu, e nos encaramos por um tempo. Eu me senti tão nervoso.

– Como ele estava?

— Bonito – comprimi os lábios, me sentando ao seu lado – E tenho certeza de que vi uma tatuagem no braço dele.

– Sabíamos que isso iria acontecer – arqueou as sobrancelhas, com um sorriso fraco – E você continua o mesmo idiota apaixonado pelo jeito.

– Meu coração acelerou como da primeira vez e doeu tanto... – confessei, baixando o olhar, me controlando para não começar a chorar na frente dele – Tenho sonhado com esse dia desde então, mas no sonho, eu desvio o olhar para o trânsito e quando olho de volta, ele desaparece, eu entro em pânico e acordo.

– Quer saber o que a minha psicóloga diria? – perguntou abrindo um sorrisinho.

– O que ela diria, Yoon?

Ele tem uma resposta dessas para absolutamente qualquer problema. E a essa altura eu nem me importo mais.

– Que você ainda não aceitou que perdeu – encolheu-se pelo frio – Ele some, então você entra em pânico. É como se o deixasse escapar todas as noites...

– Isso é tão melancólico – murmurei, levemente abalado pela sua explicação.

– Nada melhor do que pensamentos melancólicos durante uma madrugada fria – continuou – Agora quer saber o que eu acho?

– Sim.

– Bom, acho que você tem duas opções. Número um, aceita que acabou e segue sua vida. – mostrou o dedo indicador, enrolado em um band-aid da Hello Kitty – Número dois, para de choramingar e começa a correr atrás.

– Já perdi a chance.

– Você não sabe disso, e não vai saber se não falar com ele.

– Não sei, ele deve estar melhor agora.

– Então começa a aceitar que acabou, Hoseok. Tô cansado de te ver ouvir Ed Sheeran, ou sei lá que música de corno você anda ouvindo sempre que fica mal – jogou na minha cara – Não tem como viver assim para sempre. Dói, eu sei que dói, mas não vai passar se não deixar a ferida cicatrizar.

Assenti com a cabeça.

Um tapa doeria menos.

– Baixa o Tinder e vá à luta, meu guerreiro – deu tapinhas no meu ombro antes de se levantar – Ainda tem muito macho para quebrar o seu coração por aí.

– Um já foi o suficiente, valeu – murmurei, com um sorriso triste.

– Tá, agora cala a boca que está chegando na parte em que a garota morre com um guarda-chuva.

– Ah... é perturbador.

– Não, é sensacional – corrigiu.

Viramos a noite inteira assistindo, com Yoongi comemorando cada morte no anime. Quando chegamos no episódio final, o sol já começava a nascer.

Ele dormiu todo encolhido embaixo do cobertor vermelho no sofá, com o cachorro deitado no espaço vazio ao seu lado.

Até considerei acordá-lo e pedir que fosse para a cama, mas resolvi deixá-lo ali mesmo e evitar qualquer série de xingamentos que fosse direcionada à mim, só por atrapalhar seu sono, ainda que, quando ele acordasse mais tarde, reclamaria por eu tê-lo deixado dormir no sofá.

Fui para a minha cama, me enfiando de volta nas cobertas, pretendendo dormir até pelo menos por algumas horas antes de ir trabalhar, mas não consegui, não preguei os olhos em momento algum e quando começa a desligar, ele aparecia de novo.

E quando finalmente caí no sono, dormi mais do que deveria, dormi tanto que nem mesmo escutei o despertador e quando abri os olhos já passava de uma da tarde.

Com uma única mensagem do meu pai me xingando por não ter aparecido para trabalhar, depois perguntando se eu estava bem e essa, é uma das vantagem de ser filho do chefe, em momentos assim entendo o lado de Jungkook.

No meio do dia, meu pai ligou, insistindo para que eu fosse jantar em casa. Soou mais como uma obrigação do que como um pedido, ele estava me ameaçando, na verdade. Faz tanto tempo que eu não vou para casa, que não podia simplesmente recusar, sabendo que isso o deixaria magoado, ou pelo menos o faria vir até aqui me puxar pelos cabelos.

Sei que ele chega do trabalho perto das cinco horas, tive muito tempo para me preparar psicologicamente para o que poderia estar à minha espera.

Até mesmo no banho, já às quatro e trinta, minha mente não sabia decidir entre ir ou inventar uma desculpa para não precisar passar por esse perrengue. Covarde, é isso o que eu sou. Um covarde.

Como se já não fosse o suficiente, minha cabeça cheia de paranoias, Yoongi fez questão de me pressionar ainda mais enquanto eu me arrumava. Chegou até a me oferecer um calmante, rindo, se divertindo bastante às minhas custas.

No carro, eu tinha a nossa conversa da noite anterior, pairando na minha cabeça.

Tome uma decisão, Hoseok. Tome uma decisão.

Prefiro tomar um tiro, a ter que tomar uma decisão.

Impossível descrever a sensação que me subiu pela espinha, ao parar o carro em frente a casa. O nervosismo que me atingiu em segundos, é como ser levado de volta para quase dois anos atrás.

Respirei fundo, antes de descer do carro e ir em direção a porta. Toquei a campainha uma vez, passaram-se alguns segundos e a toquei de novo, nada. Na terceira vez, foi quando a porta finalmente foi aberta.

Eu perdi o ar, em segundos o chão embaixo dos meus pés pareceu se desfazer e o meu peito doeu, meu coração começou a bater tão forte que eu podia ouvir o som, podia senti-lo bombeando de uma forma tão assustadora que me paralisou.

Taehyung, que no primeiro momento parecia irritado – eu tinha me esquecido do quanto ele odeia que toquem a campainha mais de uma vez – agora me olha como se eu fosse algum tipo de extraterrestre, como se eu fosse um fantasma.

Somos isso mesmo, não é? O fantasma um do outro.

– Seu pai ainda não chegou – disse por fim, mirando os olhos em qualquer ponto que não fosse eu.

A voz dele. A voz!

Deus, como eu adoro o som da sua voz, agora mais grave do que eu me lembrava, mais firme, me faz engasgar.

Tinha uma das mãos apoiadas no batente da porta, a outra na maçaneta, as mangas compridas da sua blusa azul que usava, escondiam a tatuagem que tinha visto no outro dia.

O cabelo, diferente da outra vez, estava embaraçado, tinha a aparência de quem acabou de acordar, descalço, com a barra da calça dobrada para que não cobrisse seus pés.

Essa porra é tão nostálgica.

– Posso entrar para esperar? – perguntei, respirando fundo ao esperar sua resposta.

– A casa também é sua, entra – murmurou, me dando passagem.

A única coisa que mudou na decoração, foram os quadros e as cortinas, o resto continua exatamente como me lembro. O sofá é o mesmo, com todas aquelas almofadas, descansando no mesmo lugar de sempre.

O tapete não parece sequer ter sido removido nenhuma vez, assim como a poltrona branca, a mesa de centro, a estante.

A TV estava ligada em um canal infantil, passava um episódio de O Incrível Mundo de Gumball. A cena que passava, mostrava os personagens tentando explicar para um robô o que é o amor.

Taehyung fechou a porta, passando na frente, sentou-se no canto do sofá, subindo as pernas no estofado, mirando seus olhos em mim outra vez, como se estivesse esperando que eu fizesse algo.

Eu deveria dizer alguma coisa, não deveria?

– Quer alguma coisa? – perguntou baixo, tão sem saber o que fazer quanto eu.

– Não, valeu – me sentei na outra extremidade, sentindo meu estômago gelar só por estar perto dele.

Ficamos em silêncio, provavelmente por segundos, mas parecia uma hora inteira.

Diz alguma coisa. Qualquer coisa, Hoseok.

Eu não consigo, não consigo, não consigo.

É angustiante, a cada fala do personagem azul, meu coração palpitava em desespero, eu o via falar e até ouvia, mas tudo o que meus ouvidos captavam e meu cérebro processava, era o som da respiração de Taehyung, cada vez mais curta.

Nunca me senti tão pressionado em tão pouco tempo, virei o rosto para encara-lo, notando então seu olhar sobre mim. E no mesmo instante, levado pelo desespero, ele desviou os olhos para TV, soltando o ar com dificuldade.

Ele tinha um piercing na cartilagem da orelha, fazendo companhia para os dois outros brincos em seu lóbulo.

Por Deus, os mínimos detalhes são o que o tornam ainda mais bonito.

– Tudo bem com você? – criei coragem para perguntar, não deixando de reparar na sua mudança de comportamento.

– Vou bem, sim... – foi breve, puxando as mangas de sua camisa, mordendo o lábio – Minha mãe pergunta muito sobre você, seu pai também sente saudade – me encarou – Sinto muito que tenha te afastado deles.

– Tudo bem, não é culpa sua – puxei o ar com força – Foi eu quem escolhi me afastar.

– Você não... sente saudade daqui? – perguntou, com os olhos castanhos fixos nos meus.

– Não é da casa que eu sinto saudade, Taehyung...

Ele piscou algumas vezes, comprimindo os lábios, ao que suas mãos tremiam pelo nervosismo.

Muito bem, Hoseok. Você está tornando o clima ainda mais esquisito.

Minha pulsação estava acelerada, podia sentir cada célula minha, com o estômago revirando. Analisei seu rosto enquanto pude, parecia cansado, os olhos pesados denunciando a falta de sono, a boca ressecada, o tempo todo sendo maltratada pelos seus dentes. Ele não tinha o hábito de morder os lábios antes.

Ele morde o lábio com uma certa força, então percebo que está tentando engolir o choro.

– Sua voz está diferente – murmurei, ganhando sua atenção.

– Também estou mais alto – acrescentou, abaixando a cabeça, sem nenhum intuito de olhar pra mim – Acho que tenho a sua altura agora – apertou os dedos – Vou fazer vinte e um anos, Hoseok – lembrou.

A mesma idade que eu tinha quando fui embora. Agora eu tenho vinte e quatro, e ele está na faculdade. Como o tempo passou tão rápido?

– Isso é estranho...

– Eu sei – concordou.

Silêncio outra vez.

FALA ALGUMA COISA, HOSEOK.

– Tae... – chamei, mas ele não me encarou, manteve a cabeça baixa, o lábio inferior de novo preso aos dentes.

– O que? – sua voz vacilou, vi sua mão subir e tocar seu rosto, ele fungou.

Fala. Fala. Fala.

– Nada, deixa quieto – digo num sussurro.

Ele faz que sim com a cabeça, então se levanta, dá a volta no sofá e sobe as escadas em passos largos, desaparecendo por ela em segundos.

Estraguei tudo. De novo, eu estraguei tudo.

Nem mesmo tenho tempo para começar a me martirizar com isso, porque antes que eu possa decidir fazer algo a porta é aberta, Yerim passa por ela e abre um sorriso enorme ao bater os olhos em mim.

– Hoseok! – ela larga a bolsa e me puxa para um abraço – Que saudade que eu estava de você – me apertou, tão forte que me deixou tonto – Vai ficar para o jantar?

– Vou – sorri, tentando parecer o mais suave possível, torcendo para que não note que estou à beira de um ataque de nervos.

Não estou preparado para encarar um jantar estilo família, tentando fingir que está tudo bem, quando eu sei que não está, quando eles sabem que não está.

– Faz tanto tempo que você não vem aqui, seu pai fala de você o tempo todo – acrescentou, estendendo a mão para tocar o meu cabelo.

– Eu sei, não queria que fosse assim – murmurei, com um aperto no coração.

– Sabe quem mais sente sua falta? – perguntou baixo, usando a ponta dos dedos para afastar uma mecha do meu cabelo, alcançando meu olhar antes de dizer – O meu filho.

Se ela soubesse, o quanto isso me machuca, não teria dito.

– Sente é? – murmurei, baixando o olhar, ouvindo ela concordar.

– Conheço o meu filho, ele pode não querer conversar comigo sobre essas coisas, mas eu sei que ele sente... – pressionou os lábios, pensando no que dizer – Essa casa é grande demais, Hoseok.

Assenti com a cabeça.

– A amizade de vocês era tão bonita.

Amizade. Nunca foi só amizade, e ela nunca enxergou além disso.

Yerim vê, até onde ela quer ver. Talvez ignore todos os outros sinais, ou talvez, não tenha tempo para prestar atenção neles.

Acho que, sempre fomos muito óbvios, sempre no calor do momento, ousando querer mais e mais, o tempo todo. Buscando pele com pele, buscando sentir o sabor um do outro, não importa onde ou quando. Com Taehyung tudo sempre foi tão intenso.

– Que bom que veio jantar, deveria vir mais vezes, vai deixar o seu pai feliz – disse. Fazendo a mais pura chantagem emocional comigo. Se levantou, pegando a bolsa e preparando-se para subir – Fique à vontade, querido.

Tirei o celular do bolso, me perguntando o que diabos aconteceu com meu pai.

Nem Taehyung e nem a mãe dele voltaram para a sala, o que particularmente eu achei até bom. Sem mais conversas constrangedoras.

Meu pai finalmente chegou em casa, quase quinze minutos depois. Deixou as chaves e a carteira no mesmo lugar de sempre, sorrindo ao se aproximar.

– Tive certeza de que não viria, seu moleque traiçoeiro – deixou um tapa na minha nuca, ao passar atrás do sofá – Me perguntei qual seria a sua desculpa da vez.

– Eu disse que viria.

– Já falou com as outras pessoas dessa casa, ou continua fingindo que eles não existem? – perguntou com desdém.

Cruel.

– Falei sim, e eu não finjo que eles não existem.

– Sei...

– Inclusive, me disseram que você não para de falar de mim, que está morrendo de saudade do seu primogênito – provoquei, lhe arrancando um riso fraco.

– Vem aqui, garoto, anda – abriu os braços, esperando que eu me levantasse. Sem pensar duas vezes, saí de onde estava, deixando que seus braços me rodeassem – Quando você tinha oito anos, prometeu para mim que não me abandonaria em um asilo.

– E eu não abandonei – respondi confuso, me afastando para encara-lo.

– Mas está no caminho! – dramatizou – Inventando desculpas para não vir até a minha casa, garoto, eu vou te dar uma surra – ameaçou, acertando um tapa na minha nuca outra vez.

– Tá bom, não precisa falar duas vezes.

Conversamos muito enquanto preparamos o jantar, rimos, Yerim desceu e se juntou à nós na cozinha, mas nem sinal de Taehyung. Não até a mãe dele gritar, mandando que descesse para comer.

Quando desceu, com os olhos fixos no celular. Demonstrou surpresa ao me ver, certamente não esperava me encontrar ainda ali.

– Não estou com fome – maneou o olhar entre eu e a mãe, apertando os dedos em volta do celular.

– Está sim, senta aí – mandou.

Taehyung ponderou, bufando quando ela não pareceu não lhe dar escolha. Deu a volta na mesa, sentando-se exatamente ao meu lado, como fazíamos antes.

Sentamos e nos servimos, meu pai e a esposa foi quem começaram a puxar assunto. Eu respondia tentando ser o mais breve possível, já Taehyung sequer falava, não tocava na comida, só demonstrava querer voltar para o quarto.

Quando a palavra era dirigida à ele, erguia a cabeça, concordava, soltava uma ou duas palavras, inexpressivo e quieto. Ele não era assim, nunca foi assim, mesmo quando estava mal, Taehyung forjava um sorriso e tentava parecer bem, agora nem isso ele faz. Faz parecer como se já tivesse desistido de fingir, cansado dessa merda toda.

Isso me deixa assustado em níveis inexplicáveis, porque eu nunca sei o que esperar dele, não sei até onde ele pode ir, e me preocupa muito pensar nisso.

Ele não comeu quase nada, correu para o quarto quando teve a chance, deixando o restante de nós à mesa, em silêncio, sem a menor noção do que falar em seguida.

– Não sei mais o que fazer com ele... – murmurou Yerim, puxando o ar com força, apoiando os cotovelos na mesa.

– Tudo bem, é só uma fase – comentou meu pai, acariciando seu braço – O garoto só está passando por um momento complicado, é um adolescente, eles fazem isso.

Não é uma fase. Não é um momento complicado. Minha vontade é de ir atrás dele e descobrir o que está acontecendo de verdade.

– Ele mente, Youngsoo. – o fitou, de cenho franzido, irritada. Provavelmente já ouviu esse discurso mais de mil vezes – Meu filho é um mentiroso.

– Eu sei, e ele vai continuar mentindo – se levantou, juntando os pratos ao se levantar – Mentindo e te desafiando.

Colocou os pratos na pia, deixando que pensasse um pouco naquilo.

– Eu preciso descansar – suspirou, erguendo-se para deixar a mesa – Boa noite, Hobi – deu a volta, plantando um beijo rápido em meus cabelos – Não demore para aparecer, ouviu?

– Tudo bem – concordei, abrindo um sorriso fraco – Boa noite.

Ajudei meu pai a lavar a louça, com o garoto lá em cima, pairando na minha cabeça. Penso no que Yoongi me disse, mas não sei que decisão tomar, não agora.

Meu pai me acompanhou até o carro, quando disse que já estava indo. Me deu uma garrafa de cerveja, e me fez beber com ele, sentados na porta de casa. Observando as casas da vizinhança, a maioria com suas luzes apagadas e cortinas fechadas. Nunca vi crianças por aqui, vejo meninas e meninos, quase que da mesma idade que eu ou Taehyung, mas crianças, nunca.

– Quer falar sobre o Taehyung? – perguntou, levando a garrafa até a boca.

– Não tenho o que falar – fui seco, tentando cortar qualquer brecha que ele tivesse para estender o assunto, mas não funcionou.

– Então, vamos falar sobre sentimentos.

Soltei um riso descrente. Nunca em toda a minha vida, falamos sobre sentimentos.

– Essa porra é séria? – me virei para encara-lo, sentindo o peso de seu olhar rígido sobre mim.

– Sim, Hoseok – tomou outro gole da própria cerveja – Você pode não querer me contar o que se passa com Taehyung, mas isso não mudaria o fato de que, eu sei.

Eu sei.

Meu coração saltou dentro do peito. Sem coragem para olhar para ele, trouxe a garrafa até a boca, tomando dois goles antes de continuar.

Ele sabe.

– Como você sabe? – perguntei, tão atordoado, que quase não tive certeza do que falei.

– Conheço o meu filho – pigarreou – Eu te criei, te conheço como a palma da minha mão – deu uma breve pausa – E você é um cafajeste.

– Como é? – perguntei confuso, soltando um riso nervoso.

– Um galinha, meu filho – ergueu a garrafa na altura dos olhos, girando antes de beber o restante – Com catorze anos, você mentia dizendo que ia fazer trabalho na casa de alguém, quando eu sei, eu você só saía para beijar um garoto qualquer.

Continuou, sem pudor algum e eu só conseguia rir, de vergonha e desespero. Sem entender o motivo dele estar citando isso agora.

– Com quinze, você fugia no meio da noite para ir à festas, voltava às três da manhã, pulando a janela do quarto. Posso apostar um dedo, que foi com essa idade que você perdeu a virgindade.

Como eu queria que um buraco se abrisse no chão e me engolisse nesse exato instante.

– Com dezesseis, você começou a levar rapazes para casa – me encarou – Dizia que estavam indo estudar no quarto. O estranho, é que suas notas eram péssimas, mas você estudava muito no quarto com esses meninos.

– Pai, pelo amor de deus... – escondi o rosto com uma das mãos, não conseguindo conter a risada.

– Finalmente, dezessete – sorriu, parecendo se lembrar – Foi quando você parou de mentir, todo fim de semana era uma festa, e toda manhã no dia seguinte, tinha um moleque desconhecido saindo do seu quarto.

Contive uma risada fraca, criando coragem para encara-lo, com o rosto queimando de tanta vergonha.

– Os seus dezessete e dezoito, foram uns verdadeiros infernos para mim – deu uma pausa, balançando a cabeça enquanto pensava – Hoseok, você sumia, me mandava uma única mensagem para dizer que estava vivo, me deixava preocupado e aparecia quase dois dias depois, como se nada tivesse acontecido. Entrava pela porta de casa, às dez da manhã de um domingo, se jogava no sofá e dormia até anoitecer.

Faço que sim, pensando em cada festa que fui, em cada canto que me enfiei quando mais novo. Eu era um idiota inconsequente.

– Eu nunca te coloquei limites, sempre confiei em você, e nas pessoas com quem andava.

– Sempre confiou no Jimin e no Yoongi? – questionei, rindo ainda mais.

– Sim, Jimin porquê, mesmo sendo o que voltava mais bêbado, era o mais racional entre vocês. O mandante – descreveu – Yoongi era o espertinho, com uma lábia assustadora e tantas, tantas mentiras – riu – Ainda me lembro das baboseiras que ele inventava tentando encobrir você – arqueou as sobrancelhas num suspiro – E você, Hoseok, meu filho, com todos aqueles hormônios à flor da pele, você só saía de casa para transar, sempre com camisinha, eu espero.

– É claro, depois daquela nossa constrangedora conversa sobre sexo, ficou meio difícil de transar sem proteção.

Ele riu, riu muito, parecendo se lembrar exatamente do que eu estava falando.

– Eu te dei educação, agradeça por não ter pego clamídia.

Balancei a cabeça em concordância, deixando o silêncio pairar por alguns segundos, até sua voz tomar de conta outra vez.

– Tinha vezes, em que você me ligava, quatro da manhã, sem dinheiro para voltar para casa. Com seus amigos caindo de bêbados, me pedindo para ir buscar vocês.

– E você sempre ia – reforcei, sorrindo fraco – Deixava os meninos dormir no sofá, e de manhã os levava para casa.

Ele assentiu, abrindo outra garrafa.

– Quando fomos morar com Yerim e Taehyung, o seu comportamento mudou... – disse, dando o primeiro gole – Não tinham mais rapazes desconhecidos, transitando pela minha casa, não tinham mais festas no fim de semana – respirou fundo – No início, eu achei que você não queria que eles se irritassem, com você trazendo pessoas estranhas para casa no meio da noite, mas não era isso. Eu demorei para perceber... que os garotos pararam de vir, porque você já tinha um, no quarto ao lado do seu.

Ele me encarou, sustentou meu olhar, como se esperasse uma confirmação, e conseguiu, no instante em que eu vacilei. Levando a garrafa até a boca, com o coração batendo forte e o estômago revirando.

– Você e ele se aproximaram, criaram um laço muito forte em muito pouco tempo. Para onde você ia, ele seguia atrás, e de repente, Taehyung era o único com quem você andava, além de seus amigos.

Suas palavras me atingiam com tanta força, ao mesmo tempo em que podia ouvir minha pulsação acelerada.

– Qualquer um que prestasse atenção, poderia notar que, o que vocês tinham, era muito mais especial do que uma simples amizade. Não é o tipo de coisa que acontece sempre – baixou o olhar. Outro gole em sua cerveja – É importante sentir, é importante viver momentos como os que vocês viveram, porque em algum momento o seu tempo vai acabar, a vida não é eterna. Mesmo que tenha durado pouco tempo... Foram o quê? Seis ou sete meses? – franziu o cenho — Você teve sorte de ter vivenciado isso. Sorte de ter sentido, tudo o que eu sei que sentiu, quando esteve com ele. Porque são poucas as pessoas que realmente mexem com você.

Minha visão até então, completamente turva. Falei sobre isso com Jimin, com Yoongi, mas não tinha falado com o meu pai. A única pessoa, na qual eu sentia que precisava ter essa conversa, mas o medo sempre falou mais alto. Percebo agora, que esse medo não passava de uma grande besteira.

– Você nunca quis amar ninguém. Quando eu perguntava se estava namorando, você ria, como se eu estivesse contando uma piada – negou coma cabeça, sorrindo ao lembrar – Mas você amou Taehyung, e talvez ainda ame... – murmurou – A dor que você sente agora, não é nada, perto do que ele te fez sentir quando estavam juntos.

– Preferiria nunca ter sentindo nada – murmurei amargo, denunciando toda a mágoa que ainda existia em mim.

— Você, mais do que ninguém, sabe o quão importante é sentir dor e tristeza, sabe que não pode fugir disso.

– Só estou cansado – apertei os olhos, sentindo as lágrimas quentes, escorregarem pelo meu rosto – Não acho que tenho disposição, para passar por tudo isso outra vez.

— Não pode ter medo de amar, Hoseok. Nunca tenha medo de amar alguém, entendeu?

Balancei a cabeça em negação, respirando fundo, com a garganta se fechando, tremendo, prestes a desabar.

Apoiei os cotovelos nos joelhos, escondendo o rosto, sem saber como controlar o choro.

Sinto tanta saudade dele.

– Me desculpa – murmurei, enxugando o canto dos olhos – Por ter causado isso... me desculpa, pai.

– Tudo bem, não precisa se desculpar – levou a mão até o meu cabelo como carinho – Não é culpa sua, a gente não tem controle sobre esse tipo de coisa, e tudo bem.

– A mãe dele sabe?

– Suponho que não – disse baixo, com uma breve pausa – Se sim, eu já saberia...

– Ela vai me odiar – murmurei, me deixando desabar um pouco mais.

– Não vai, não – prendeu os dedos aos meus fios de cabelo – Quando, ou se, ela descobrir, pode demorar um pouco, mas ela vai entender.

Concordei com a cabeça. Não consigo imaginar uma situação, onde ela não me odeie por ter transado com o filho de dezoito anos dela, embaixo da sua própria casa, por quase sete meses.

– Como o Taehyung está? – resolvi perguntar, secando o rosto, trazendo a garrafa até a minha boca.

– Ah, ele tem deixado a mãe louca – riu soprado – Já viu as tatuagens dele no braço? Aquilo rendeu uma discussão de mais de uma semana, foi um verdadeiro inferno.

– Ele vai até o final quando põe uma ideia na cabeça – soltei um riso frouxo.

– Tem mentido muito também. Yerim sempre deu dinheiro a ele, não precisa de um motivo, ele pedia, e ela dava. Mas de uns tempos para cá, ele tem usado o dinheiro para ir em festas... – suspirou pesadamente – Semana passada, esse garoto chegou em casa, cinco da manhã, mal conseguia ficar de pé. A mãe dele surtou, foi terrível.

Merda.

– Eu acho que, ele só está perdido, confuso, tentando se encontrar, sabe? – me encarou por um instante.

– Não... – balancei a cabeça em negação – Não é só isso, nunca é só isso com Taehyung.

– De qualquer forma, ele não fala com a mãe, muito menos comigo. O garoto se isolou, criou uma barreira de proteção e não deixa ninguém chegar perto – se levantou, pegando as garrafas vazias, parando para me encarar – Talvez ele fale com você.

– Acho que ele não confia mais em mim, pai – confessei, o acompanhando de volta para dentro.

Ele assentiu, sem falar mais nada, por pelo menos dois minutos.

– Vai dormir no sofá – avisou, tomando as chaves do carro de minhas mãos – Não vai sair daqui depois de ter bebido.

– Foram só duas garrafas.

– Boa noite, Hoseok – disse alto, já subindo as escadas com as minhas chaves.

Bufei, me jogando no sofá, liguei a TV, passando pelos canais até encontrar um filme no mínimo interessante. Mandei mensagem para Yoongi, avisando que não voltaria para casa hoje. Ele somente visualizou, mandando um emoji em seguida.

Com tudo o que acabou de acontecer, minha mente parece trabalhar mil vezes mais. Sinto que vai ser impossível dormir essa noite.

Com as vozes dos personagens soando baixas e a iluminação fraca vinda da TV, um frio me corre pela espinha, essa casa é, de fato, grande demais. Encarando o breu dos cantos da sala, minha mente se pergunta como seria se um monstro saísse dali, não tem absolutamente nada no escuro, mas o medo irracional tende a nos fazer supor coisas desse tipo.

– O que está fazendo? – a voz rouca me fez sobressaltar, posso jurar que meu coração parou.

– Nunca mais faça isso, nunca mais, ouviu? – cobri o rosto, respirando fundo, ainda sem saber onde ele estava.

– Te assustei? – perguntou, pude ouvir seus passos se aproximando, então o toque de suas mãos nos braços do sofá – Vai dormir aí?

– Meu pai levou as minhas chaves – fui breve, abrindo os olhos, encontrando o seu rosto pouco iluminado logo acima de mim.

Ele concordou, distanciando-se outra vez, tirando da mesa o molho de chaves da casa e se dirigindo até a porta.

– Achei que estivesse dormindo – murmurei, o acompanhando com o olhar.

– Eu durmo o dia todo – respondeu, abrindo a porta, enfiando as mãos nos bolsos.

– Onde vai?

Não esperava uma resposta, ele não parecia disposto a me dar algum tipo de explicação.

– Fumar.

Arqueei as sobrancelhas, não deveria demonstrar tanta surpresa, mas é inevitável.

E isso é tudo o que diz antes de passar pela porta. Minha mente ainda tentava compreender a situação, teorizando sobre inúmeras coisas que ele poderia ter ido fazer realmente, ou ele só foi fumar, no sentido mais literal possível.

Tenho vontade de sair para conferir, mas não faço.

Ele volta quase vinte minutos depois, e só pelo cheiro que vem dele quando passa por mim, tenho a confirmação de que estava mesmo fumando.

Eu tinha tantas perguntas para fazer, mas ao mesmo tempo sabia que não tinha mais intimidade pra isso.

Demorei para dormir, com tudo isso me rodando a cabeça. Um medo repentino me consumindo, coberto pela forte sensação de incompetência.

Saber que há algo de muito errado, e não ter a mínima ideia de como ajudar a consertar.

Quando acordei no dia seguinte, com meu pai me sacudindo, ele já estava arrumado para ir para trabalhar. Me entregou as chaves do carro, e saiu de casa, logo depois de Yerim.

Taehyung, que assim como eles estava arrumado para ir para faculdade, só esperou nossos pais passarem pela porta, para largar a bolsa e se dirigir de volta para o quarto.

Não precisei perguntar para saber que ele estava matando aula, esse hábito nunca mudou pelo visto. Também não me obriguei a ir atrás dele, mesmo que meu subconsciente implorasse por isso, só peguei o carro e voltei para casa.

Com a enorme sensação de estar falhando com Taehyung, pesando sobre mim outra vez.

E quando cheguei, quando passei pela porta a primeira coisa que fiz foi tirar o celular do bolso, abri minha conversa com ele e digitar, só por descargo de consciência:

"Me desculpa."

"Eu sinto sua falta"

E antes que eu pudesse bloquear a tela e guardar o celular outra vez, eu enxerguei o online, eu o vi os dois riscos azul indicando que ele tinha recebido e lido a mensagem. Meu coração pulou e por um minuto achei que fosse morrer.

Digitando...

E nada.

Nada.

Minutos se passaram e nada.

Solto o ar num riso contido, bloqueando a tela do celular e cobrindo os olhos com as mãos, me odiando um pouco mais quando minha garganta se fechou, quando meu rosto começou a arder e as lágrimas começaram a escapar, antes mesmo que eu pudesse tentar contê-las.

Eu perdi, realmente perdi.

🌻

oie, passando pra lembrar que meus @s são gabbieah_ no twitter e gabbie.ah no instagram.

também existem os ig dos vhope de vante os @s são hobivvante e thvvante 🙃

até semana que vem!

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