Não pare a Música

By AliceHAlamo

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A dança é composta por vários elementos. Você tem a coreografia, o tempo, a música, o dançarino, a técnica... More

Capítulo 1 - Sasuke
Capítulo 2 - Naruto
Capítulo 3 - Ino
Capítulo 4 - Gaara
Capítulo 5 - Quebra de rotina
Capítulo 6 - Suas lentes
Capítulo 7 - Interesses
Capítulo 8 - O que os outros pensam
Capítulo 9 - Encantado
Capítulo 11 - Punição
Capítulo 12 - Fora de Foco
Capítulo 13 - Desafio
Capítulo 14 - Intensidade
Capítulo 15 - Mudanças
Capítulo 16 - Tensão
Capítulo 17 - Entre jogos e bebidas
Capítulo 18 - Escolhas
Capítulo 19 - A queda
Capítulo 20 - Bolha
Capítulo 21 - Luz acesa
Capítulo 22 - Segredos
Capítulo 23 - Permissão
Capítulo 24 - Montanha Russa
Capítulo 25 - Gravidade
Capítulo 26 - Amarga Vitória
Capítulo 27 - Forjada em veneno
Capítulo 28 - Aberto
Capítulo 29 - Relações
Capítulo 30 - Linda
Capítulo 31 - Cores
Capítulo 32 - Oportunidades
Capítulo 33 - Elos
Capítulo 34 - Marcas da alma
Capítulo 35 - Resgate
Capítulo 36 - Suporte
Capítulo 37 - O que tem atrás das cortinas
Capítulo 38 - Socos da vida
Capítulo 39 - A morte do Cisne
Capítulo 40 - Acerto de contas
Capítulo 41 - Vida
Epílogo

Capítulo 10 - Ajuda "mútua"

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By AliceHAlamo


Cinco horas da manhã.

Sasuke acordou melhor naquele dia. Embora não tivesse muito ânimo, o corpo não doía, e ele tentou usar isso como argumento para enfim conseguir se levantar. Na ponta dos pés, elevou os braços e se espreguiçou, manteve a postura enquanto escovava os dentes e repetiu, como sempre, o mesmo ritual antes que a música na sala começasse e ele iniciasse o alongamento.

Tinha que treinar passos de ligação, era inadmissível que errasse tanto algo tão simples, tinha conseguido apenas uma vez, dias atrás, quando a maldita câimbra o interrompeu. Assim, cinco horas e vinte e três minutos, apoiou o celular na estante e deu play no vídeo. Passou os quinze primeiros minutos se alongando sem tirar os olhos da tela, repetindo diversas vezes a parte da coreografia que não devia ter mais de vinte segundos.

A primeira vez que tentou resultou em nada mais que aborrecimento, a segunda foi um pouco melhor, a terceira... ele realmente consideraria aquilo uma tentativa? A quarta o levou ao chão por trocar os pés na hora de fazer a primeira volta, a sexta o fez pressionar as mãos na cabeça e contar até dez para não tacar o celular longe... mas tudo bem, ele tinha até às sete horas para aprimorar os passos, tinha uma hora e dez minutos para isso, setenta minutos, quatro mil e duzentos segundos para que ele pudesse repetir uma sequência de vinte! Duzentas e dez tentativas. Não desistiria na vigésima, mesmo que essa o tenha feito quase derrubar o celular a apertar play novamente na música.

O trecho da música já estava gravado em sua cabeça e, a cada vez que ele repetia, era como se uma informação nova fosse adicionada. Tinha a melodia de cor e, depois da quinquagésima tentativa, já conseguia definir os instrumentos, um a um, depois passou a contá-los, sempre adicionando um ou outro. No fim, faltava apenas começar a anotar as notas do piano na folha de partitura que desenrolava em sua mente.

Era uma derrota caminhar até o celular e retomar a música, não teria que fazer isso se estivesse com um pianista. Ah, sim, aquela era uma boa vantagem, tinha tido sorte por Naruto aceitar ajudá-lo e, agora que parava para pensar, ele havia feito aquilo mesmo tendo outras responsabilidades na frente, outras ordens, Orochimaru não deveria ter gostado... Aliás... era a segunda vez que Naruto o ajudava e ia contra o professor, isso sem considerar que ele também havia, para sua sorte, preferido levá-lo ao vestiário em vez de deixá-lo com Orochimaru.

Ah... havia acertado o passo antes da câimbra o interromper. Como tinha sido...? Lembrava-se de Naruto sugerindo, para sua irritação é claro, diminuir a velocidade da música e... Velocidade! Sim, quando Naruto sugerira mudar a velocidade, Sasuke alterou o tempo de dois movimentos.

Suspirou, ansioso, apertou o play do celular e respirou fundo enquanto aguardava as notas certas. Sem pressa, não tinha motivo para correr, lembrava que havia feito aqueles primeiros segundos devagar devido à hesitação; depois, quando notou os olhos de Naruto o espiando pelo espelho, tinha se desconcentrado um pouco, e isso o atrasou nos segundos seguintes... Inacreditável... havia acertado a sequência justamente porque tinha se distraído por saber que o pianista o observava, ansioso, numa nítida torcida para que ele enfim concluísse a cena.

Pela primeira vez na manhã, conseguiu finalizar os passos de ligação de maneira limpa, correta! Mas uma vez só não conta... pode ser sorte, não é mesmo? E não podemos esquecer que a prática leva à perfeição! Por isso, encheu o peito de ar e se posicionou, esticou o braço e, de novo, fez a música preencher a sala vazia.

* * *

Às sete horas, Madara apareceu na sala, estranhando o silêncio. Era comum ouvir os passos de Sasuke, o arrastar do pé pelo chão ou algum barulho que fosse acompanhando a música, mas, daquela vez, entrou na sala e viu Sasuke deitado no chão.

Cruzou os braços e se apoiou no na parede. Sasuke estava deitado no chão com os olhos fechados, a respiração ainda tentando se acalmar e ensopado de suor. Do jeito que estava, parecia que não se mexeria tão cedo nem se quisesse, e isso fazia Madara ter que cerrar os punhos e contar até vinte para não se meter. Sasuke não sabia mesmo a definição de "pegar leve", e isso o tirava do sério! Estava a mais um metro de distância e via as micro fasciculações dos músculos das pernas dele. E depois Hashirama lhe dizia que estava exagerando, Mito falava que era assim mesmo...

Desligou o celular e o jogou de leve sobre a barriga do sobrinho antes de ir para a cozinha.

— Vai tomar um banho — mandou, irritado, Sasuke sabia que não poderia levá-lo à faculdade naquele dia e, ainda assim, abusava nos exercícios. — Vou fazer o café, e hoje você come o que eu servir — decidiu ao abrir as portas do armário fazendo mais barulho do que deveria.

Sasuke emitiu algum som concordando, difícil ter certeza, e virou-se de lado no chão porque sabia que não conseguiria se levantar sem apoio. Cambaleou até o banheiro, deixou a roupa suja no chão e ligou o chuveiro enquanto o corpo deslizava pela parede até sentar-se no chão frio.

Não devia se demorar ali, tinha que sair mais cedo para pegar o metrô, mas os músculos exigiam o descanso que ele não podia dar naquele momento. A água quente ajudava, livrava-os dos tremores causados pela exaustão, e ele fez uma nota mental para não se esquecer de levar algumas frutas para comer na faculdade, não queria outra câimbra durante os ensaios.

Encostou a cabeça no azulejo frio e fechou os olhos, abrindo-os somente quando o susto pelas batidas na porta o fizeram despertar. Tinha dormido? Nem sabia dizer.

— Já to saindo! — gritou, antes que Madara arrombasse a porta achando que tinha morrido.

Tomou um banho rápido e saiu, xingando alto ao ver o horário no celular. Vestiu-se com a primeira roupa que encontrou e correu para se sentar à mesa.

Leite, café, salada de frutas, pão com frios e requeijão. Levou os olhos da comida ao tio duas vezes até revirá-los e decidir que não valia a pena discutir: Madara enfiaria aquela comida em sua garganta se fosse preciso. Comeu, sob atenta observação e um som claro de aborrecimento do tio.

— Mito vem te buscar — Madara falou após checar o celular, e Sasuke arqueou a sobrancelha. — Não adianta me olhar assim, também fiquei sabendo agora.

Sasuke relaxou o corpo na cadeira e comeu mais devagar. Mito foi pontual, como sempre, e ele recolheu o material e entrou no carro dela desconfiado.

— Bom dia. — Ela sorriu.

— Bom dia. O que aconteceu? — ele perguntou de imediato, não gostava de ser enrolado.

— Como assim? — Ela franziu o cenho. — Passei para te dar uma carona e para falarmos do médico.

— Médico?

— Joelho, lembra? Você me mandou uma mensagem já faz mais de uma semana para vermos isso. — Ela riu, e Sasuke enfim compreendeu. — Pensei em te dar uma carona e aproveitar para te perguntar por que quer a consulta. Se machucou?

— Não tenho certeza, mas você sabe como Madara é... se eu pedir a carteira do convênio para marcar uma consulta, vai achar que estou morrendo.

Mito sorriu e concordou.

— Eu dou um jeito de pegar a carteira, não se preocupe. Mas está tudo bem? Está doendo?

— Não muito, só quando forço demais.

— O que é todo dia. — Ela fez uma careta de desgosto.

— Mito... — ele pediu, cansado daquele assunto.

Ela suspirou, Sasuke era como Madara, teimoso, ela sabia que não conseguiria nada insistindo demais; somente o fato de ele ter ido falar com ela sobre o joelho já era prova de que tinha um pouco da confiança dele, então não desperdiçaria aquilo.

— E os ensaios? Seu professor já começou a gritar o quanto vocês são horríveis e que não vão conseguir ir a lugar nenhum sem a bênção dele? — ironizou ao se lembrar de quando Madara havia ido assistir a uma das aulas de Sasuke e presenciara o professor repreendendo a turma.

Sasuke riu anasalado.

— Orochimaru só sabe fazer duas coisas: infernizar a vida dos outros e mentir — comentou, e a voz fria fez Mito parar para observá-lo enquanto o semáforo estava vermelho.

— Mentir? — ela repetiu.

— Deixa pra lá. Ah, eu vou precisar de um livro esse semestre — mudou o assunto. — Acho que vi ele no seu apartamento uma vez. Posso mandar o nome depois?

— Claro!

Sasuke agradeceu e despediu-se brevemente quando Mito o deixou na faculdade. Quatro horas. Tinha quatro horas de aula naquele dia e tinha que fazer valer cada minuto, não teria tempo depois de estudar em casa. Abriu o notebook assim que o professor entrou e digitou atentamente cada parte da aula. Durante as discussões inúteis dos outros alunos, das dúvidas que ele se perguntavam como um aluno naquele período da faculdade ainda podia ter, abriu o calendário e marcou os trabalhos que já havia adiantado e tentou saber como conseguiria tempo para se reunir com o grupo para o mais novo projeto de marketing. Se a professora o deixasse fazer sozinho... Sem chance, já conhecia a fama dela. Suspirou, inconformado, teria que dar um jeito.

Meio dia, as aulas terminaram. Adicionou os contatos dos integrantes de seu grupo no celular e apressou-se. Almoçaria perto do ballet mesmo, era melhor. No metrô, conferiu o celular e revirou os olhos com a mensagem de Neji avisando que se atrasaria. Ótimo... estava contando com ele para reservar uma sala vazia e não ter que conferir, de novo, uma a uma.

Checou o horário assim que chegou à estação final, o ballet ficava a menos de duzentos metros dali e o restaurante também. Pelo horário, deveria estar lotado, mas Sasuke sabia que não tinha condições de começar a treinar sem almoçar antes.

Entrou no restaurante com um suspiro pesado. O dia quente não ajudava em nada a refrigeração do lugar, muito menos as pessoas e suas vozes altas. Pegou um dos pratos disponíveis e se serviu ao mesmo tempo em que procurava por uma mesa livre mais distante do barulho. Sorriu ao achar. Pediu um suco gelado para o garoto do balcão e caminhou com o prato em mãos até a mesa.

Sabe aqueles momentos em que você se pergunta se realmente as estrelas estão alinhadas ou se há alguém no mundo rindo de você? Bem, Sasuke praguejou e fechou os olhos com irritação ao colocar o prato na mesa no exato momento que outra pessoa fez o mesmo.

A última mesa... a última mesa naquele lugar fresco e longe do barulho... Ergueu o rosto para encarar a outra pessoa e franziu o cenho ao reconhecê-la.

— Sasuke! Não sabia que você também almoçava aqui de vez em quando. — Naruto lhe sorriu animado enquanto se sentava na sua mesa.

Olhou ao redor, queria tanto almoçar sozinho, quieto no próprio canto enquanto repassava o vídeo da coreografia... Sentou-se, derrotado, torcendo para que Naruto não abrisse a boca enquanto ele assistia ao vídeo.

— O que é isso? — Naruto perguntou quando ele posicionou o celular e colocou os fones. — Você sabe que o almoço é uma hora sagrada, né?

— Nunca fui religioso — respondeu irônico.

— Você não pode ver o vídeo depois de comer? Faz mal fazer os dois juntos.

— Você não pode cuidar da sua vida? — Sasuke o encarou, sério, mas tudo o que viu foi Naruto com os braços cruzados sobre a mesa enquanto o observava com um estranho sorriso no rosto. — Que é? Perdeu algo?

— A sua educação talvez — provocou, e Sasuke estreitou o olhar. — Ah, vamos, você não deve levar cinco minutos para comer as... folhas e... meu Deus, sério que você só come isso? — Naruto perguntou surpreso e indignado ao analisar o prato de Sasuke.

— Se você não quiser me ver vomitando durante os giros e os saltos, acho que vai preferir que eu coma só isso.

— Certo, certo. — Ele ergueu os braços, convencido. — Mas acho que não vai te matar perder quinze minutos comendo, ou menos já que não tem nada nesse prato, para depois assistir o vídeo.

Sasuke tirou os fones, não por concordar com Naruto, mas por perceber que já tinha perdido mais de cinco minutos naquela discussão idiota. Começou a comer em silêncio, mas seria ingenuidade demais pensar que essa situação se prolongaria por muito tempo.

— Veio direto da faculdade? — Naruto perguntou, e Sasuke apenas concordou. — Sua aula de hoje não é só à noite?

— Ensaio — respondeu, e Naruto abriu a boca em surpresa para então parecer animado.

— Vai ensaiar de novo aquela coreografia? Se importa se eu tocar enquanto isso?

— Vou achar uma sala vazia dessa vez.

— Por quê? — Naruto o olhou em dúvida. — Eu preciso treinar a música e você precisa ensaiar a coreografia. Ajudaríamos um ao outro.

— E como é que eu estou te ajudando nisso? — Sasuke perguntou impaciente.

— Não gosto de tocar para uma sala vazia, gosto de plateia ou de alguém para dançar enquanto toco, me ajuda a me concentrar — explicou antes de voltar a comer. — Ah! E também é realmente bom ver você dançando.

— Bom? — Sasuke perguntou, desconfiado.

— Interessante, eu diria — Naruto disse como se buscasse a palavra correta. — Enfim, eu te ajudo, você me ajuda. Por quê não?

Sasuke tinha a resposta para aquilo, "porque eu não quero", ele diria, ou então podia justificar citando o momento estranho que tiveram antes de Orochimaru aparecer na sala na última vez, mas optou por não fazer isso. Gostava de ouvir Naruto tocando o piano, aliás, gostava até mesmo de observá-lo enquanto tocava, o que ele sabia sim que era bem estranho e vinha tentando ignorar o fato. Mas, além disso, Naruto era meio que sua certeza de que Orochimaru não teria como importuná-lo; ele não estaria sozinho afinal.

— Ok — respondeu e voltou a comer fingindo não perceber o sorriso animado que Naruto lhe direcionava.

— Ótimo! Agora, me fala, quantos anos você tem? — perguntou, e Sasuke suspirou, crente de que aquele seria um longo almoço.

* * *

Sasuke não admitiria jamais que havia aproveitado a conversa com o pianista durante o almoço, muito menos de que havia se distraído mais do que uma vez enquanto o ouvia falar com visível interesse sobre as obras clássicas que apresentariam. Não, nunca, até porque não havia motivo para se mostrar à vontade com ele, já havia aprendido bem sua lição, não dava para confiar em quem fazia parte daquele grande sistema que era a companhia de ballet.

Sim, sistema, um bem grande e cheio de falhas e podres que Sasuke conhecia de cor, mas que todos, todos, tentavam encobrir atrás das cortinas. Não havia sido à toa que Tobirama tinha sido demitido por Tsunade, denunciar o sistema nunca é bom e mesmo a pessoa que você acha que é de confiança pode fazer parte dele. Se Tsunade de fato se importasse com eles, ela tomaria medidas após o suicídio de duas bailarinas no ano anterior por depressão e anorexia, ela interferiria na humilhação que alguns dos professores os faziam passar, ela faria com que as audições e a competição pelos papéis fossem mais justas! Mas Tsunade não se importava, pelo menos não quando a companhia era grande para um ou outro caso chamar a atenção. O que eram dois suicídios quando a escola possuía mais de quinhentos bailarinos? O que era um aluno reclamando de abuso de poder quando todos os outros se calavam com medo de nunca mais alcançar seus sonhos? É, porque ainda tinha isso! A companhia era a melhor do Estado, a única porta para as escolas internacionais, a única esperança para as audições na escola de Bolshoi! Ser expulso ou abrir mão da sua vaga ali seria o mesmo que enterrar a carreira como bailarino... E, sobre isso, Sasuke não podia falar muito, afinal, ele também compactuava com aquilo e, na única vez que tentara mudar o sistema, falhara miseravelmente.

Por um momento, perguntou-se se Naruto também cederia uma hora ou outra àquele mundo. Ele parecia alguém correto, transmitia segurança a ponto de Sasuke achar natural andar ao seu lado até a sala em que ensaiariam, e, até o momento, não parecia compactuar ou concordar com Orochimaru em nada. Um bom sinal? Talvez...

— Orochimaru só dará as aulas a partir das cinco horas hoje — Naruto informou ao jogar a bolsa de qualquer jeito ao lado do piano e então remover o fino pano que o cobria.

— E por que está me falando isso? — Sasuke desconfiou.

Naruto abriu a tampa das teclas e então olhou para Sasuke com o cenho franzido.

— Vocês quase se atacaram ontem durante a aula, foi assustador. Achei que fosse gostar de saber que ele não iria te importunar — falou como se fosse óbvio.

Sasuke bagunçou os cabelos, o dia anterior tinha sido péssimo, alguém tinha sabido que Ino havia virado modelo na mesma agência que Hanabi Hyuga e a notícia se espalhou como as chamas de um incêndio. Nem mesmo ele ou Neji, que costumavam impor algum "respeito", vulgo medo, conseguiram barrar os comentários. Não era só inveja, era ódio, o mais puro ódio, o sentimento que cada um ali cultivava desde o dia que souberam que teriam que disputar seu lugar.

Os olhares de indignação evoluíam para desprezo, alguns não faziam questão de disfarçar e soltavam os comentários de deboche ao passar ao lado de Ino no corredor. Havia sido um inferno, um pelo qual Ino passou com a cabeça erguida e o sorriso de sempre, como se estivesse dentro de uma bolha de proteção. Uma fachada. Sasuke e Neji conheciam-na bem para saber que era apenas o modo dela de encarar a situação, mas que o travesseiro não passaria a noite sem algumas lágrimas. E tudo piorou durante a aula...

A sala nunca esteve tão cheia de alunos de outras séries para lhes assistir, e Orochimaru já entrou no recinto visivelmente irritado. Ele sorriu maldoso ao ver a plateia, como se achasse certa graça da situação, depois os olhos pararam sobre a barra do centro, onde Sasuke e Ino estavam.

— Ino, barra da frente. Sakura, fique na bara do centro hoje, parece que temos uma estrela entre nós, não é?

Na hora, o sangue de Sasuke ferveu, mas Ino apertou sua mão sobre a barra discretamente e caminhou até a primeira barra. Naruto o observou, como se soubesse que ele queria interferir e estivesse esperando para ver o que faria. Neji estava logo atrás de Ino na barra e sussurrou algo em seu ouvido antes que Orochimaru começasse os exercícios.

Tudo, exatamente tudo, que Orochimaru podia corrigir na execução de Ino, ele fez, parando a música, fazendo-os repetir a coreografia de cada exercício várias vezes, obrigando Ino a repetir a sequência que tinha errado sem melodia e sozinha, diante da sala toda.

— Parece que está se dedicando demais à sua nova carreira que esqueceu como dançar. Espero que seu novo investimento dê certo, embora eu tenha minhas dúvidas...

A fala foi como acender um fósforo, e o riso de quem assistia foi tacá-lo à pólvora.

— Dúvidas? É claro que tem, alguém que não pode nem fazer parte da bancada para as audições não tem como avaliar uma modelo, não é mesmo? — Sasuke falou, alto o suficiente para calar as risadas.

— O motivo de eu não fazer parte da bancada não lhe diz respeito, Sasuke. Abaixe o tom e ponha-se no seu lugar — Orochimaru falou com um tom entediado. — Continuando, fondue, de novo graças à nossa celebridade, lado esquerdo para ver se vocês acertam assim. Naruto, música, por favor.

— Não — Sasuke respondeu.

— Não? — Orochimaru estreitou o olhar.

— Nós já fizemos cinco vezes fondue, todas as cinco você ignorou os erros dos demais e focou em Ino, mesmo ela sendo a que menos erra aqui.

— E? Acho que está se esquecendo de que aqui, nesta sala, eu sou o professor. E, se Ino é a que menos erra, como você mesmo disse, a sala vai muito mal. Por isso, de novo sim.

— Até quando? Até você achar que já humilhou ela o suficiente na frente de todo mundo? — Sasuke elevou a voz.

— Até quando eu achar o suficiente! — Orochimaru rebateu, ríspido.

Sasuke riu debochado e abaixou-se para pegar a água no chão. Naruto acompanhou o movimento e prendeu a respiração quando o viu sorrir cínico e encarar Orochimaru em seguida.

— Com licença, professor, estou enjoado — ele falou, fez uma reverência de má vontade e saiu da sala.

Naruto arregalou os olhos e só voltou a respirar, como todos que esperavam uma ação de Orochimaru, quando o professor olhou o relógio e anunciou:

— Intervalo de cinco minutos.

É, Sasuke parou para pensar enfim, Naruto tinha razão de achar que ele gostaria de saber que Orochimaru não estava na escola. Deixar a sala de aula era uma das maiores quebras de hierarquia dentro de uma escola de ballet, nem ele acreditava que tinha mesmo feito aquilo e havia ficado até tarde ouvindo um longo sermão de Neji e Ino.

— Pode sim me prejudicar, se é o que está pesando. Orochimaru não costuma gostar de quem compactua com os alunos rebeldes, pode perder o emprego se ficar se intrometendo como da última vez.

— Estou bem assim, não precisa se preocupar. — Naruto deu de ombros.

— Não estou preocupado, estou te deixando ciente para depois não jogar a culpa em mim.

— Não irei. E então? Vamos começar? Primeiro ato de novo?

— Pode tocar alguma coisa antes para o alongamento?

— Algum pedido especial? — Naruto sorriu ao se sentar de frente ao piano.

— Você escolhe.

Era estranho como os olhos de Sasuke o traíam. Certo que sempre tivera uma pequena paixão por piano, mas isso não justificava como sua atenção era atraída para o pianista toda vez que ele iniciava uma música. Já sabia mais detalhes de Naruto do que alguém desinteressado saberia, podia até mesmo arriscar a medida entre os ombros dele, afinal, as costas largas eram uma das poucas coisas a que podia ter visão sem se entregar, não se arriscaria a olhar para o espelho em busca do rosto dele. Quer dizer, não muitas vezes...

A camisa social branca era justa, vestia bem no corpo de Naruto a ponto de Sasuke conseguir ver a movimentação dos músculos à medida que os braços se moviam para que as mãos alcançassem as teclas do instrumento. Além disso, a postura dele era bonita, as costas não se curvavam, permaneciam elegantemente eretas, e apenas a cabeça movia-se de acordo com a melodia. O cabelo dele era a única parte desalinhada do conjunto; tinha um corte reto na região da nuca, mas as mechas loiras pareciam gostar de tomar diferentes direções. Em certos momentos, ele jogava a cabeça para trás, como se tivesse se deixado levar pelo que tocava, e nessas horas Sasuke o olhava pelo espelho porque já havia notado que Naruto sempre mantinha os olhos fechados naquele gesto. Havia um sorriso delicado, uma leve expressão de prazer e plenitude, os lábios às vezes moviam-se como se cantarolassem em silêncio a música, e logo a postura voltava a ser perfeita e os olhos azuis buscavam o mosaico preto e branco à frente.

Aquela era a deixa para desviar o olhar, Naruto o observaria em breve, era curioso, fazia muito isso durante as aulas. No entanto, apesar do cérebro ter enviado o comando aos olhos, a melodia calma e lenta tinha mais força e agia como um entorpecente, lentificando seus reflexos e impedindo que a razão guiasse corretamente o corpo; ela não entrava só pelos seus ouvidos, eles eram apenas uma das portas de entrada, Sasuke podia sentir a vibração no ar e no piso de madeira, cada nota se unindo para formar uma correnteza e o arrastar para longe do bom senso. E o resultado não podia ser diferente do esperado, Naruto ergueu a cabeça e o espiou pelo espelho, os olhares se encontrando em surpresa e contemplação muda, que Sasuke só se viu obrigado a quebrar quando ouviu a própria respiração cortar o encanto da música e as batidas do coração se sobreporem à ela.

Sentado no chão, abriu as pernas, as mãos seguraram a ponta de um dos pés, e ele abaixou a cabeça. Fechou os olhos enquanto se xingava em pensamento e permanecia naquela posição até que a face perdesse o calor que a tinha invadido de súbito.

Foco, foco, foco, foco, repetiu até que a respiração se acalmasse. Encarou a madeira escura do piso e, mais centrado, virou o tronco para repetir o alongamento do outro lado. Ao fim, levantou-se, Naruto já devia conhecer a sequência do alongamento ou o quanto costumava demorar, uma vez que a música o acompanhou, terminando não muito depois.

— Primeiro ato — falou sem encará-lo.

Naruto separou a partitura, embora já a tivesse decorado.

— Pronto — avisou.

Sasuke caminhou até o canto da sala e se posicionou, esperou até as notas anunciarem sua entrada e então começou o ensaio.

Naruto não havia mentido quando dissera que gostava de plateia quando tocava ou de alguém dançando suas músicas, aliás, esse era um dos motivos para ele trabalhar ali. Entretanto, além disso, ele particularmente apreciava quando Sasuke dançava. Não era só a dança, era a junção de várias singularidades do bailarino que ele podia perceber enquanto ele dançava, como quando ele vibrava ao fim da coreografia ao acertá-la ou como ele simplesmente parecia revoltado ao errá-la e reiniciava, do zero, a sequência. Era interessante ver o empenho dele, e era também contagiante, como se a dedicação dele o fizesse torcer para que Sasuke conseguisse terminar a coreografia com excelência.

Tocava, mas não apenas isso, ele tocava para Sasuke, exclusivamente para o bailarino! Era prazeroso, instigante, como se os dois estivessem criando e apresentando arte um para o outro. Ah, sim, porque Sasuke não estava dançando para ele mesmo, os olhos negros já tinham se encontrado com os seus diversas vezes durante a coreografia, e saber disso fazia Naruto... se divertir. Era como se eles competissem, não de forma negativa, mas como se a atenção que trocavam os instigasse a dar nada menos que o melhor, e o sorriso de canto que isso tirou de Sasuke com certeza não passou despercebido...



Notas Finais: Nossa! Semana que vem acabam os capítulos escritos em abril! Felizmente, temos capítulos escritos até dia 20/08 por enquanto <3 Vamos ver se o camp de Julho não nos garante mais alguns, não é?

Estão gostando? Teorias? Comentários?

Até segunda que vem <3

Beijoss

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