Ele caminhou até ela devagar, os olhos tristes e o nariz vermelho, como se ele tivesse acabado de chorar. Se agachou ao lado da garota, sentando-se no chão com um certo desanimo.
- Scar.
Ele a chamou, a voz baixa e calma, mas um pouco emaranhada, segurando o choro. Thomas a soltou, dobrando as pernas e apoiando os braços sobre ela. A cabeça pendendo para trás até encostar na cabeceira de ferro da cama atrás dele. Scarllet levantou o rosto, virando-se para Minho, que no mesmo instante passou o polegar em suas bochechas, secando o rosto da namorada. Ele mordeu os lábios, semicerrando os olhos como se pensasse de que forma diria a ela o que precisava.
- Eles partiram.
Ele sussurrou, baixo. Dizer aquelas palavras em voz alta faziam as coisas se tornarem mais reais. Scarllet levantou o bilhete que Nick deixou, esticando para Minho, que franziu as sobrancelhas, confuso. Depois, ergueu o bilhete em sua mão, o que Newt deixara, e entregou a ela. O rosto de Scarllet se tornou ainda mais triste. Scarllet leu o papel, escrito com uma caneta hidrográfica preta:
Eles deram um jeito de entrar aqui. Estão nos levando para viver com os outros Cranks.
É o melhor mesmo.
Obrigado pela amizade de vocês.
Adeus.
- Newt... - Scarllet sussurrou. O nome do amigo reverberou no ar como uma sentença de morte.
- Ele deixou isso. - Minho abriu a outra mão, deixando amostra o cordão de Newt, que Scarllet ainda não tinha visto. - O cordão de que falaram. Acho que é para você.
Scarllet demorou a assumir coragem para pegar o cordão na mão de Minho. Suas mãos ainda tremiam, não importava o quanto ela mandasse pararem.
- Ainda estou aqui, Scar. - Minho sussurrou, a cabeça baixa. - Sei que não posso substitui-los, mas ainda estou aqui. Então, por favor, não me deixe.
Logo todos estavam sentados juntos. O objetivo era conversar sobre o próximo passo a ser seguido, mas a realidade era que não tinham nada para dizer. Os cinco apenas olhavam para o chão, nenhuma palavra a ser dita.
Por alguma razão, Thomas não conseguia tirar Janson da cabeça. Será que voltar seria mesmo um modo de salvar Newt? Cada parte dele se rebelava contra a ideia de retornar ao CRUEL, mas, se voltasse e conseguisse completar o Experimento...
Minho rompeu o pesado silencio:
- Quero que os quatro me escutem. - parou por uma momento para olhar cada um deles, depois prosseguiu. - Desde que fugimos do CRUEL, tenho seguido qualquer idiotice que vocês têm me pedido para fazer. Sem me queixar. Pelo menos, não tanto. - lançou um sorriso amargo para Thomas. - Mas, aqui e agora, estou tomando uma decisão, e terão que fazer o que eu disser. Se alguém recusar, que vá para o inferno.
Thomas e Scarllet sabiam qual seria a decisão do garoto, e estavam de acordo com ela.
- Sei que temos objetivos maiores em mente. - continuou Minho. - Precisamos entrar em contato com o Braço Direito e descobrir o que fazer em relação ao CRUEL. Vocês sabem, todo esse mértila de salvar o mundo. Mas primeiro temos que encontrar Newt e Nick. E esse detalhe não está aberto a discussão. Nós cinco vamos onde for preciso para resgatar eles.
- Eles chamam o lugar de Palácio dos Cranks. - disse Brenda. - Tem de ser esse o lugar no qual Newt se refere no bilhete. Alguns daqueles Camisas Vermelhas provavelmente entraram no Berg, encontraram os garotos e constatavam que estavam infectados. E permitiram que Newt deixasse um bilhete. Não tenho nenhuma dúvida de que foi isso que aconteceu.
- Parece um nome tirado de conto de fadas. - zombou Minho. - Já esteve lá?
- Não. Toda cidade importante tem um Palácio dos Cranks, um lugar para onde mandam os infectados, no qual possam levar uma vida relativamente suportável, até que atinjam a Insanidade. Não sei o que fazem com eles depois disso, mas não me parece um local agradável de se viver, não importa quem você seja. Os Imunes trabalham nesses locais e são muito bem remunerados. Quem não é Imune jamais se arriscaria a contrair o Fulgor. Se quiserem ir até lá, temos de pensar bem antes. Estamos completamente sem munição.
Apesar da terrível descrição, o olhar de Minho emanava um brilho de esperança.
- Já pensamos bem. Pronto. Sabe onde é o Palácio mais próximo?
- Sim. - respondeu Jorge. - Passamos por ele quando viemos pra cá. É no ponto mais distante deste vale, na frente das montanhas, a oeste.
Minho bateu uma mão na outra.
- Então é exatamente para onde vamos. Jorge, ponha este pedaço de mértila no céu.
- Estou contente por participar dessa pequena aventura, muchacho. - disse Jorge, levantando-se. - Estaremos lá em vinte minutos.
Jorge cumpriu a palavra quanto ao horário. Aterrissou o Berg em uma clareira, aos pés de uma floresta que se estendia pela encosta da montanha, surpreendentemente verde. Cerca de metade das árvores estava morta, mas a outra metade parecia ter acabado de se recuperar de anos de calor fustigante. Essa constatação deixou Scarllet mais triste: o mundo provavelmente se recuperaria algum dia dos clarões solares, mas o encontraria desabitado.
Desceu a rampa da porta de carga e deu uma boa examinada no muro que cerca o que só podia ser o Palácio dos Cranks, a poucas centenas de metros distantes. Fora construído com grossas tábuas de madeira.
Respirou fundo. Antes de chegar, prometeu a si mesmo que tentaria. Faria o possível para recuperar os garotos e não deixaria a tristeza leva-la antes de ter certeza que não havia nenhuma mísera chance de tê-los de volta. Enquanto isso, faria o possível para se manter forte, por Minho, como ele estava fazendo por ela a meses.
O portão mais próximo começou a se abrir, e duas pessoas apareceram, ambas portando enormes Lança Granadas. Pareciam exaustas, mas, mesmo assim, assumiram uma postura defensiva, as armas em posição. Obviamente tinham ouvido o ruído do Berg e acompanhado sua aproximação.
- Não é um bom começo. - murmurou Jorge.
Um dos guardas gritou algo, mas Scarllet não conseguiu entender o que dizia. Minho a puxou para perto, se certificando de que estaria ao seu lado caso algo acontecesse. Não deixaria os guardas se aproximarem da garota.
- Vamos até lá conversar com eles. - disse Thomas. - Devem ser Imunes, do contrário não estariam com esses Lança-Granadas.
- A menos que os Cranks tenham assumido o controle. - sugeriu Minho, lançando um sorriso irônico para Thomas.
- Seja como for, vamos entrar. - afirmou Scarllet, sua primeira frase desde que leu os dois bilhetes, o que deixou os quatro amigos surpresos. - Não sairemos daqui sem os garotos.
O grupo caminhou lentamente até o portão, certificando-se de não fazer nada que pudesse causar alarme. A última coisa que Scarllet queria era ser atingida por um Lança-Granadas de novo.
Conforme se aproximavam, notou que a aparência dos guardas era ainda pior do que havia percebido a distância. Estavam sujos, suados e cobertos de feridas e arranhões.
Pararam diante do portão, e uma dos guardas deu um passo à frente.
- Quem são vocês? - perguntou. Tinha o cabelo negro e um bigode, e era mais alto que o parceiro. - Não se parecem muito com os cientistas imbecis que vêm aqui as vezes.
Jorge ficara com o encargo de falar por todos eles, como havia feito no aeroporto ao chegarem em Dever.
- Jamais saberiam da nossa chegada com antecedência, muchacho. Somos do CRUEL, e dois dos nossos garotos foram capturados e trazidos pra cá por engano. Viemos buscá-los.
O guarda não pareceu muito impressionado.
- Acham que dou a mínima pra vocês e para esse trabalho idiota no CRUEL? Não são os primeiros arrogantes que chegam aqui e agem como se fossem os donos do lugar. Querem visitar os Cranks? Fiquem à vontade. Principalmente após o que tem ocorrido nos últimos tempos. - deu um passo para o lado e fez um gesto exagerado de boas-vindas. - Desfrutem da estadia no Palácio dos Cranks. Não há reembolso nem troca, no caso se perderem um braço ou um olho.
A tensão no ar era quase palpável, e Thomas temeu que Minho acrescentasse alguma observação engraçadinha e mandasse aqueles caras para o inferno, por isso, apressou-se em dizer:
- O que quer dizer com "o que tem ocorrido nos últimos tempos"? O que está acontecendo?
O sujeito deu de ombros.
- Este não é um lugar que se possa chamar de feliz. É tudo que precisam saber.
E não acrescentou mais nada. Thomas não gostou do andar da carruagem. Havia algo estranho ali.
- Bem... sabe se alguma pessoa - Thomas não achava certo dizer Cranks. - nova foi trazia para cá nos últimos dois dias? Vocês têm um registro?
O outro guarda, baixinho e troncudo, de cabeça raspada, pigarreou, para perguntar:
- Quem estão procurando? Homem ou mulher.
- Homens. - respondeu Scarllet, apressada. - Se chamam Newt e Nick. São mais altos do que ele, - ela apontou para Thomas. - um loiro que manca e um moreno.
O sujeito respondeu:
- Posso ter alguma informação a respeito. Mas saber e dizer são duas coisas bem diferentes. Vocês parecem ter bastante dinheiro. Desejam compartilhá-lo?
Scarllet voltou-se para Jorge, que cerrava o maxilar. Minho falou antes que Jorge se manifestasse.
- Temos dinheiro, sim, seu cara de mértila. Agora nos diga onde ele está.
O guarda ajustou, com ferocidade, a mira do Lança-Granadas sobre ele.
- Mostrem-me os cartões de dinheiro, ou esta conversa está acabada. Quero pelo menos mil.
- Ele está com tudo. - disse Minho, apontando o polegar para Jorge, os olhos cravados no guarda. - Imbecil ganancioso.
Jorge puxou o cartão e balançou-o no ar.
- Terão de me matar para arrancar isto, e sabem que, sem minhas digitais, não vai funcionar. Terão o dinheiro quando for a hora, hermanos. Agora mostrem-nos o caminho.
- Tudo bem, então. - concordou o homem. - Sigam-me. Mas lembre-se: se alguma parte do corpo de vocês for arrancada devido a um encontro desafortunado com um Crank, aconselho-os enfaticamente a deixar essa parte do corpo para trás e correr na velocidade que o diabo fugiria da cruz. A menos que seja uma perna, claro.
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