Onde está Flora?

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DANIELLE CLAYTON POV

Dizem que antes de morrer, tudo o que a gente viveu passa bem na nossa frente como em um filme, nunca fui muito supersticiosa, então essa história parecia só mais uma que avós contam para assustar... Mas como se a vida não fosse irônica o suficiente, ela resolveu me provar que minha avó estava certa.

Fui levada como em um sonho a adolescência, quando beijei uma menina pela primeira vez e senti que naquele momento uma resposta foi dada as minhas inúmeras dúvidas. Então era isso, eu gostava de garotas. Lembro que a primeira coisa que fiz foi contar ao papai, meu então melhor amigo e herói, e lembro como se fosse ontem dele olhar nos meus olhos e dizer "não aguentava mais esperar, eu já sabia!"

- Danielle, 25 anos, acidente de carro. Duas fraturas na perna, possível traumatismo craniano e uma parada cardíaca, ela está morrendo!

Fui levada ao dia em que perdi meu pai para a morte após um infarto e no quanto as coisas mudaram a partir dali. Me lembrei de não derramar uma lágrima quando recebi a notícia que o perdi, mas depois, de chorar por cinco dias sem parar quando notei que ele não entraria mais pela porta de casa. Mamãe estava grávida e ele simplesmente foi embora. Seríamos nós três sozinhas sem o nosso anjo da guarda.

- Vamos, Dani. Esse é seu nome, uh? Fique comigo!

Pressão no peito.

Fui levada ao dia, dois meses após a morte do meu pai, em que minha mãe anunciou um novo namorado. Não fazia sentido na minha cabeça, ainda mais com ela esperando uma filha. Ela não esperou nem o corpo do meu pai esfriar!

- Você não pode ir embora. Vamos, Dani. Fique!

Pressão no peito.

Fui levada ao dia em que minha irmã Flora nasceu. No meio da escuridão em que eu me encontrava, pegar aquele frágil e lindo ser humano nos braços me deu a sensação de que a vida ainda tivesse algum sentido. Ela precisava tanto de mim e eu igualmente dela. Os cabelos de Flora eram mais escuros que o meu, mas ainda assim ela era tão linda! Seus olhos não eram os de papai, como os meus, eram escuros como carvão. Flora tinha uma beleza especialmente dela.

- Ela está nos deixando, Dra. Jamie!

Pressão no peito.

Passei por momentos importantes da infância, adolescência e vida adulta. Momentos insignificantes e momentos que trouxeram a mim muitos significados. Momentos de alegria temporária, mas de uma tristeza eterna.

Fui levada a memória em que descobri que Flora não era filha do meu pai. Isso explicava muita coisa, minha mãe já o traia há muito tempo com Henry e o casamento dos meus pais não era tão feliz quanto eu achava.

Lembro de sair de casa após descobrir, há exatamente 2 anos, quando Flora tinha 5, e tentar uma vida sozinha. Só via minha mãe quando era pra ver minha irmã, porque nós temos uma conexão gigantesca. Não gosto da minha mãe, ela não me faz bem, a evito sempre que posso, mas não posso fugir, ela me deu uma irmã que é tão vítima dessa história quanto eu. Ambas fomos condenadas com uma figura materna que tem tudo, menos o dom da maternidade.

Os anos se passram, cada um com seu acontecimento importante. Faculdade, namoradas, amigos e tristeza. Por mais que eu tentasse me deixar ser feliz, me via sendo impostora dos meus próprios sentimentos. Era como se eu não merecesse estar bem, mas eu tentava. Eu sonhava. Eu sonhava com o dia em que eu finalmente sentiria que tudo iria se resolver. Uma hora as coisas teriam que dar certo. Eu não parava de sonhar.

Pseudo-sonhadora. Pseudo-fotógrafa. Pseudo-artista. Triste por inteira. E era hora de ir.

- Mais uma vez, vamos! Dani, por favor!

Pressão no peito.

E foi assim que minha vida medíocre foi interrompida aos 25 anos de idade, não conquistando nada e sem a capacidade de me apaixonar, tendo como único e eterno amor, uma irmã de 7 anos que eu amava incondicionalmente, que eu deixaria sozinha com a minha mãe e que estava no carro junto comigo no dia do acidente.

Tudo bem, era hora de partir.

Espera.

Uma irmã que eu amava incondicionalmente e que estava no carro junto comigo no dia do acidente. Essas palavras martelavam na minha cabeça repetitivamente. Eu não podia ir embora, eu não podia ir e deixar Flora. O pânico foi invadindo meu corpo, mas eu não conseguia acordar! Por que eu não conseguia acordar? Onde está Flora? Meu Deus, me deixe acordar! Eu preciso acordar! Eu preciso acordar!

- Dra. Jamie, ela está reagindo!

°°°

3 dias depois...

Minha cabeça parece que vai explodir, mesmo de olhos fechados, a luz do ambiente me incomoda. Tento abrir os olhos mas os fecho imediatamente com a claridade. Devagar, tento novamente, com calma. Não sei onde estou, mas sei que não estou em casa. Minha atenção é chamada para o barulho de um dos aparelhos ao meu lado direito e eu percebo que ele tem um fio ligado a minha mão. Tento mais uma vez reconhecer o ambiente e falho, nada faz muito sentido.

Adormeço novamente.

Acordo logo depois, dormi por cinco minutos? Cinco horas? Dez dias? Não saberia dizer. Minha boca está seca, minha perna dói, e minha cabeça continua com a sensação de que vai explodir. Agora, um pouco mais consciente dos meus pensamentos, noto que estou em um hospital. O desespero percorre minhas veias e eu finalmente lembro de Flora. Começo a gritar desesperadamente, mas sinto que minha voz não sai, meus pulmões não obedecem. Ameaço puxar os fios que estão na minha mão e tenho minha atenção interrompida pela porta do quarto se abre.

Não espero a enfermeira falar e de imediato pergunto:

- Onde está a minha irmã? Você tem notícias dela? - Pergunto.

Minha voz soa rouca, desacostumada, sinto que dormi por muito tempo. Tento me manter com os olhos abertos, mas meu corpo implora para eu os fechar.

- Sua irmã está perfeitamente bem e em casa, ganhou apenas um arranhão. - Disse a senhora de cabelos grisalhos que checa o aparelho ao lado da minha cama.

Respiro aliviada, mas não convicta. Precisava de certezas.

- Preciso vê-la. Você pode ligar pra ela, por favor, dizer que acordei? Ela deve estar preocupada! - Falo.

Acalmo meu tom de voz, se preciso de um favor, preciso saber pedir.

- Sim, vamos fazer isso daqui a pouco. Mas agora, você precisa descansar. Vou chamar a doutora e já volto. - Diz a moça se retirando da sala e não me dando tempo de responder.

Porra!

Espero impaciente pela enfermeira, mas ela não volta. Estou inquieta, agitada e triste. Não consigo parar de pensar em Flora. Tento lembrar do acidente, mas não consigo. Só lembro de um clarão invadir o meu lado do motorista e mais nada. Me arrependo e balanço a cabeça na tentativa de fazer esses pensamentos irem embora, pois não estou segura de que Flora está bem, isso só vai acontecer quando eu vê-la.

Meus pensamentos são interrompidos quando ouço a porta do quarto abrir novamente. Dessa vez, não é a senhora de cabelos grisalhos que entrara anteriormente, é uma visão muito mais bonita. Uma mulher de cabelos escuros acima do ombro, que sem olhar pra mim, vem em minha direção. Ela usa jaleco e não tira os olhos da prancheta que carrega, tão pequena, mas que passa uma energia tão confiante. Não consigo tirar os olhos dela, mas o faço assim que ela olha pra mim.

- Danielle... Dani, você não sabe a alegria que é te ver acordada. - Ela diz em pé na minha frente e com um sorriso tímido olhando em minha direção.

The One {{DAMIE FANFICTION}}Where stories live. Discover now