51. A Distância de Harta

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Depois do jantar, ao falar com Harta perguntou-lhe se ele sabia de algum outro sítio para além da biblioteca onde pudesse ir trabalhar no relatório na sua folga. Tinha que passar tudo o que se lembrava dos cadernos para computador e confirmar algumas informações. Aproveitava e via mais uma vez o e-mail.

Agora que voltou a morar com ele, passavam todos os seus tempos livres juntos e adormecia ao ouvir a sua respiração todas as noites. No início, reparou no som da sua respiração porque a incomodava. Agora, não conseguia adormecer antes de o ver a dormir. Depois de ouvir por mais de um mês, tornou-se um hábito, que tinha um efeito calmante para Bela. Tinha sentido falta da calma natural de Harta.

Harta apenas ficava nervoso quando Bela falava da Global ou em voltar para Portugal. Fora isso, tudo parecia fazer parte de um movimento natural da vida em que o bem e o mal acontecem como as ondas do mar. Até mesmo depois da casa arder ele ficara triste, devastado, mas sem raiva, sem ânsia de justiça. Aceitou apenas como mais uma maré que se converteu num tsunami. Bela não o conseguia compreender, mas também não o conseguia deixar de admirar. Não era para compreender, era para admirar. O mar nunca se poderia compreender na totalidade e não era por isso que deixava de ser belo, majestoso e poderoso. 

Na noite seguinte a ter a conversa sobre Batari, Bela parou de escrever o caderno ao sentir o toque da mão de Harta na sua. As suas mãos eram ásperas do trabalho árduo que tinha feita a maior parte da sua vida. No entanto, o seu toque era suave como se não quisesse fazer muita força para a magoar. Como ela fosse um cristal a proteger. 

Ele pediu para ver o caderno de apontamentos dela e estava a tentar ler em português enquanto ela admirava as suas feições. Ele tentava falar e imaginar como as palavras seriam ditas. Ele era um génio em línguas como Bela nunca fora, tinha uma admiração-inveja por isso. Se ele viesse a Portugal não levaria um mês para saber falar como qualquer português. Bem, se calhar tinha um sotaquezinho. Ela já conseguia quase falar com ele em português e ela mal sabia dizer mais do que olá e obrigada em bahasa indonésio. Era uma vergonha. Para ele era apenas um passatempo tentar aprender novas línguas. Para ela, uma necessidade.

Ele parou de ler ao reparar que ela estava a admirá-lo e ficaram a olhar-se durante uns momentos até que Bela riu-se. Ele acariciou-lhe a cara.

Ela agarrou-lhe a mão e beijou-a. Tocou-lhe nos calos com os dedos e beijou-os. Ele ficou a olhar para ela sem saber bem o que fazer. Ela olhou para ele e avançou. Estava ansiosa para sentir os seus lábios. Ele aceitou o seu beijo e agarrou-lhe a nuca, tocando suavemente no seu cabelo e envolveu-a no seu abraço. Bela arrepiou-se ao sentiu o seu calor a envolvê-la. Eles perderam-se nos beijos, cada um incentivava outro e já não conseguiam parar. Os corpos comprimiam-se um contra o outro querendo ser um só. Mas quando Harta desceu a mão e tocou-lhe na anca, ele estagnou. Afastou-se. Sem dizer uma palavra levantou-se e fechou-se na casa de banho.

Bela ficou no sofá acalmar a respiração e o fogo que tinha dentro de si. O que se passou?  Ele parecia tão à-vontade na primeira noite que dormiram juntos, sem t-shirt nem nada... já não era a primeira vez que ela sentia que ele fugia do contacto físico com ela. Não lhe pareceu que ele não se sentisse atraído por ela também...

Harta quando saiu da casa de banho disse boa noite e deitou-se. Manteve-se o mais afastado possível e nem sequer olhou para ela. Demorou bastante a adormecer, tanto tempo que Bela adormeceu antes de conseguir ouvir a sua respiração tranquila.


No dia seguinte, ele parecia fugir dela. Foi trabalhar cedo, nem olhou para ela. Ela foi trabalhar e quando voltou ele estava na mesma postura evasiva. Fazia tudo para não se sentar perto dela e quando lhe falava não a olhava nos olhos. Bela sentiu um frio no peito, como se o seu coração fosse gelar. O que ela teria feito para ele reagir assim? 

Investigação na IndonésiaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora