24. A Viagem Continua

211 43 27
                                    

Durante a noite, pararam num parque de estacionamento. Comeram sopa e mais algumas frutas e dormiram todos com as suas mantas cobertos até à cabeça. Aquelas roupas realmente eram melhores do que as que Bela trouxera. Eram largas e confortáveis e o lenço impedia o cabelo de se pegar ao rosto com o suor.

O calor continuava, pegava-se à pele como moscas em pleno Alentejo. A cabeça de Bela voltou pesar enquanto o corpo tornava-se gelado a derreter e tudo o que ela desejava era água. À noite, no entanto, ficava ameno e até mesmo frio e ainda mais húmido do que durante o dia. Bela era quem bebia mais água, e por diversas vezes, tinham de ir buscar mais para ela. No entanto, não reclamavam.

O corpo de Bela parecia normal, não havia qualquer mancha na pele fora as picadas insistentes dos mosquitos, mas doía-lhe tanto como se tivesse uma enorme e dolorosa nódoa negra que preenchia todo o seu corpo. Fosse qual o jeito que desse ao dormir, doía-lhe sempre o corpo e passar dias na estrada apenas com fruta e sopa que às vezes nem conseguiam aquecer parecia endurecer ainda mais  o corpo. Sentia-se um bambu seco que se vergasse muito partia. Mas ela comia, ela dava voltas com Harta. Ele era o seu guia. Se ele se atirasse de um penhasco ela provavelmente ia com ele. Sem ele, ela não conseguia fazer nada naquele país-forno-tropical. Falar com ele era fácil, mas ele por vezes bloqueava e apenas olhava para ela, como se ela lhe pudesse ler os pensamentos. Ela tinha a sensação que mesmo se soubesse bahasa indonésio não o conseguiria entender.

Estavam a chegar a casa. A mãe de Harta falava muito, estava entusiasmada. O pai de Harta sorria disfarçadamente. O próprio Harta estava contente. Aqueles dias de pelo calor de um inferno verde tinha desfeito qualquer pessoa, por muito forte que fosse. Bela estava ansiosa por um bom banho e jantar. Estava farta de sopa e fruta. Sentia o seu corpo rugir e reclamar por todo o lugar e a razão não era só fraqueza. Uma cama, nem que fosse um colchão no chão já seria um verdadeiro luxo. Sentia-se uma papa amassada.

Por vezes, sonhava com o seu apartamento e com a sua vida em Portugal. Parecia que tinha sido noutra vida. Viveu no paraíso e depois daquele acidente de avião era como tivesse morrido e ido para o inferno: um local desconhecido, sem dinheiro, onde quase ninguém falava a mesma língua, onde era uma mendiga à mercê da bondade dos outros. A família Dewi comprovava que até no inferno, existem pessoas boas.

Investigação na IndonésiaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora