Questão de tempo

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Eu chorei porque queria bolo.

Fiquei emocionado com a música que estava tocando.

– Eu não faço a menor ideia do que você está dizendo – é a que escolho.

Pedro e Damien eram como irmãos.

A história era conhecida, os dois vizinhos que eram tão próximos que chegavam a se parecer fisicamente, uma amizade que uniu duas famílias.

Pedro passava o natal na casa de Damien todos os anos com sua mãe e avó.

Damien levava seu pai e sua mãe para a casa de praia de Pedro todos os anos para o ano novo.

Um frio percorre minha espinha com a possibilidade de ser exposto. Vergonhosamente exposto.

– Ah, eu sei do que estou falando, só não sei de quem estamos falando.

Graças a Deus.

– E você supôs que eu tenho uma paixonite? – digo dando um sorrisinho de lado e me aproximando dele mais uma vez. Ele franze os lábios e abaixa os olhos mais uma vez para mim, como se me dissesse para continuar indo até ele.

Era fácil demais distrair Pedro.

– Mas sei que você está apaixonado – ele tenta mais uma vez, mas a voz já sai mais baixa, menos decidida.

– Como você pode ter tanta certeza? – apoio a mão no queixo e agora estou bem na sua frente, o encarando.

– Como eu não teria? – ele levanta dois dedos. – Das duas umas. Ou a pessoa em questão é um imbecil, ou o amor é não correspondido. Caio. Você anda mais triste do que alegre. Eu sou seu amigo, e por mais idiota que você acha que eu seja, eu noto isso.

Solto uma risada e ela não é falsa. Pedro era realmente um ótimo amigo.

– Isso é bem gentil da sua parte.

– Agora me dá um abraço, idiota nenhum merece você, ok? – Assinto obediente e estendo os braços e um sorriso para Pedro que morde o lábio antes de me puxar para si, me apertando.

Ele realmente gostava de abraços.

– E onde ele está? – a porta do quarto se abre enquanto ainda estou agarrado a Pedro. Damien aparece do outro lado, e recua quase um passo inteiro ao ver a cena. Sinto os braços do meu amigo se estreitarem ao meu redor.

– Lucas me disse que você passou mal – os olhos dele passam de Pedro para mim em instantes, indo e vindo.

– Sim, mas está tudo agora. Pedro me ajudou – digo, encostando a cabeça no peito de quem me envolvia. Os dedos de Damien tocam meu braço e então os olhos dele se dirigem a Pedro.

– Me deixe vê-lo – ele pede e eu quase bufo.

Que porra é essa?

– Eu tô te ouvindo, meu Deus, eu estou bem – retruco, me soltando, noto que o tom ríspido que sai da minha boca não é intencional. Eu não queria ser grosso. – Pode voltar ao que você estava fazendo antes. – Termino e só então fecho a boca.

Eu não queria, mas não podia evitar.

– Você tá chateado comigo? – Damien parece terrivelmente confuso e eu não o culpava por se sentir assim.

Tentar entender o que se passava era cansativo.

– Eu deveria deixar vocês? – Pedro pergunta.

– Por favor – Damien diz, fazendo Pedro passar a mão pelo cabelo e soltar um suspiro, sei que ele não quer ir, não é do feito dele me deixar sozinho, mas mesmo assim ele pareceu decidido a obedecer.

– Qualquer coisa estou lá fora. – A porta bate eu preferia fazer qualquer coisa a ter essa conversa com Damien.

Eu conhecia esse cenário.

Conhecia os elementos.

A convivência era uma dádiva para o saber e eu sabia, meu melhor amigo não tinha noção de verdade sobre como eu me sentia. Não porque ele fosse um homem cruel ou insensível, não porque ele me odiasse ou quisesse me ver sofrer.

Ele só não me via como uma opção.

Não importa o quão crente Lucas seja que eu poderia simplesmente me sentar e dizer que o amo, porque eu já tentei, tentei em todas as vezes que ele esteve solteiro, tentei até não ter mais vontade de tentar.

Era melhor ser amigo que não ser nada.

– Quer me dizer o que houve? – Damien começa e está visivelmente inquieto.

– Eu passei mal durante a festa – respondo, abrandando o tom de voz.

– Ótimo, me deixe te levar no médico, sabe o quanto odeio te ver mal. – ele estende a mão para que eu pegue, mas continuo parado no lugar.

– Eu estou bem agora, tudo o que quero é um pedaço de bolo – tento mudar de assunto.

– Não vai dizer porque está chateado? Ótimo. – Ele insiste e como uma criança se senta no chão. – Eu não saio daqui até fazermos as pazes.

– Damien... – eu tento.

– Tenho a noite inteira – Ri um pouco, empurrando o incomodo para longe e me junto a ele no chão.

– Eu não estou chateado, tá bem?

– Não mesmo? – ele repete.

– Não.

– Então posso expulsar os meninos para vermos um filme só nós dois? Eu meio que tenho um presente – encaro o chão. Apoiando os cotovelos no joelho.

Damien jamais facilitou, nem por um segundo, meu processo.

– A sua namorada, ela não está... – ele arregala os olhos por um momento e para em silêncio um pouco, como se entendesse.

E eu acho que entende, só não sei como interpreta.

– Ela não está. Foi embora agora pouco.

– Eu queria que os meninos ficassem – digo com honestidade e ele concorda a contragosto.

– Pode esperar aqui um pouco? – assinto e ele se levanta do chão e sai pela porta, apenas para voltar instantes depois em posse de uma sacola que prontamente me entrega.

– Abra – ele pede. Puxo uma pequena caixa e desembrulho uma caneca de cerâmica branca com uma plaqueta de cinema desenhada.

É adorável. É a cara dele.

– Você gostou? – ele pergunta ansioso.

– Eu adorei – afirmo e é verdade.

– Eu tenho uma combinando – Damien diz, vitorioso.

– Isso é pelo trabalho?

– Isso é porque hoje faz seis meses que estamos morando aqui, juntos.

Ah.

Meu coração se acelera por um momento e eu preciso me manter centrado.

– Eu prometo te comprar uma coisa – digo, tentando mudar o ambiente. – Sabe se estamos precisando de frigideiras personalizadas?

– Não seja bobo.

– Não estou sendo, feliz seis meses. Damien.

Oblíquo Where stories live. Discover now