Coração curado [Concluído]

O que diz muito com poucas palavras

"Ainda somos jovens e imaturos, nem se preocupe com isso
Musgo com certeza cresce
Em uma pedra que não rola
Se você não puder voltar
Vá e atravesse diretamente pela sua frustração e esqueça-as
Deixe para lá
Não é fácil, mas grave isso no seu coração"
BTS - Never Mind pt. 2

— Oi, meu nome é Hortênsia. — Me apresentei. — Jin pediu para eu trazer seu almoço. Namjoon disse que você deve comer, e, Jungkook complementou que só assim você pode ser realmente forte e saudável. Jimin disse que é importante para que você seja sempre bonito assim como é, e Taehyung falou que se você não comer ele virá pessoalmente te alimentar. Por último, mas não menos importante, J-Hope te solicita para um ensaio às seis horas da tarde, já que você não respondeu a mensagem dele.

Inspirei fundo e soltei o ar enquanto ele me olhava com as sobrancelhas erguidas. O homem estava daquela forma desde que falei meu nome.

— Acho que não esqueci nenhum recado. Ufa. — Repassei mentalmente todas as mensagens antes de dizer o que eu mesma queria. — Por favor, coma. Está realmente delicioso.

Estendi a bandeja em um gesto de oferta.

Ele saiu da porta e acenou para eu entrar em seu estúdio. Sim, era um estúdio. E apontou para uma mesinha na frente de um sofá, e foi sobre ela que eu coloquei a bandeja. Eu estava pronta para sair, contudo ele fechou a porta.

— Se não for desagradável, me faça companhia. — Disse com simplicidade.

— Não, tudo bem. — Sentei-me no sofá enquanto observava os equipamentos ali.

— Então você compõe... — Falei mais para mim mesma do que para ele.

— Sim, e não somente eu. — Ele respondeu enquanto começava a comer.

Os minutos seguintes foram preenchidos por um silêncio absolutamente confortável no qual eu refletia as tantas e tão intensas experiências que eu tinha tido desde que aceitei ver aquele jardim. Experiências que me ajudaram a me enxergar melhor e a ver as raízes de alguns dos meus sofrimentos. Muitos deles começaram quando eu já nem me lembrava mais.

De repente fiquei triste quando me lembrei que em breve teria que voltar para casa e eu não sabia se tudo estaria pacífico por lá. Seria o mesmo que sair de uma dimensão e entrar em outra paralela na qual minha vida era feita de sofrimento e tristeza.

— Não precisa ser assim. — Yoongi falou como se tivesse lido meus pensamentos.

Olhei para ele assustada, mas ele não esboçou nenhuma alteração. Seu rosto continuava tão sereno quanto antes. Inesperadamente sossegado assim como sua voz baixa, rouca e grave. Ao contrário dos demais, ele falava com tranquilidade ímpar. Olhar para ele fazia com que todo o caos do meu mundo se tornasse ordem e calmaria.

Ele parou o tsunami do sofrimento que eu tinha acabado de desatar ao pensar na minha vida. Yoongi deteve aquela terrível força da natureza que eu não conseguia controlar, e para isso ele ó precisou existir, ali, na minha frente.

Ele sorriu e eu suspirei.

— Eu, minha família... Nós... — Eu não conseguia falar.

— Faça isso com calma. — Ele disse enquanto finalizava a refeição.

"Fazer isso" era equivalente a falar sobre aquelas coisas difíceis. Eu concordei com a cabeça. Por que eu queria me abrir com ele? Não sei exatamente. Ele fazia com que eu me sentisse segura. Era uma pessoa que respeitava meu tempo.

— Eu não percebo como sair do sofrimento. — As palavras se arrastaram para fora de minha boca. Pareciam pesadas demais para se moverem rápido. As próximas vieram acompanhadas de lágrimas. — Eu não entendo mais como viver.

Engoli em seco enquanto começava a chorar. A expressão dele se alterou pouco, mas não era nada que me desencorajasse a continuar.

— Eu lutei todos os dias até aqui, mas parece que foi inútil. Parece que o universo está contra mim. — Eu já soluçava. Havia algo realmente reconfortante em dizer aquelas coisas em voz alta. Era como se eu arrancasse um tumor do âmago de meu ser. — Me sinto terrível e incompetente.

Foram as últimas palavras que eu disse antes de desatar a chorar sem parar. Não era qualquer choro. Era um choro dolorido de quem tem feridas demais abertas e não sabe mais como continuar. Um choro triste demais para ser colocado em palavras. Um grito de desabafo.

Yoongi esperou pacientemente até que passasse. Sentado em sua posição confortável, dizendo tudo e nada ao mesmo tempo.

Quando finalmente passou, ele pegou uma de minhas mãos entre as suas e olhou no fundo de meus olhos.

— Não importa o que seja, acredite que vai passar. — Ele começou a falar. — E você vai fazer isso um dia de cada vez, porque é assim que se vive. Você não pode viver o ontem mais e nem o amanhã antecipadamente. Apenas o hoje.

Ele afagou minha mão.

— Você já fez um bom trabalho resistindo até aqui. Foram vencidas muitas batalhas, uma a cada dia. E eu sei que hoje você vai fazer um bom trabalho também, mesmo que seja simples. Mesmo que no final nada saia como o planejado. — Garantiu. — Se algum dia não der certo, ainda haverá um amanhã para viver. Um dia novo, para um trabalho novo. Se hoje não deu certo, talvez amanhã dê.

— Não sei se tenho forças. — Suspirei.

— Sim, você tem. Só não se cobre demais. Cada coisa a seu tempo. — Ele sorriu.

O sorriso mais acolhedor, reconfortante e quente de toda a minha vida. Era como um abraço, do qual eu tinha precisado por muitos dias.

— Obrigada, vocês são os melhores vizinhos que eu poderia ter. — Falei emocionada.

Ele riu.

— Nós não somos seus vizinhos. — Ele revelou e fiquei pasma, mas antes que eu pudesse dizer qualquer coisa ele encostou a ponta de dois dedos sobre meu coração. — Nós somos seus inquilinos.

Yoongi então soltou minha mão. Ele e tudo começaram a se desfazer em uma nuvem de poeira brilhante que foi varrida para longe, até que só restasse a escuridão.

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O que tem de marra, tem de bom. ♡