O sábio subestimado

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"Nunca será tarde para fazer o que você quer fazer!
Porque em um ponto de algum dia, tudo o que você fez
Será exatamente o que você vai ser"
BTS - Intro: O!RUL8,2?


Bati na porta do quarto com leveza, mas determinada a fazer o que eu tinha prometido. Já bastava não ter entregado um recado, esse já era meu limite de incompetência.

— Jungkook você disse que não vin... — O homem na minha frente parou de falar assim que viu que não era o amigo dele quem estava parado na porta.

— Eu... — Era difícil falar enquanto aquele olhar intenso que ele tinha ficava mirado diretamente em mim. — Ham... — limpei a garganta porque a palavra tinha ficado entalada ali. — Ele pediu para eu vir aqui no lugar dele...

Intenso. Intenso demais! Um simples olhar estava me fazendo perder as forças das pernas, da fala, de tudo. Estava me afogando. Parei de fitar o rosto dele e olhei para o chão a fim de me recuperar.

Depois de me analisar dos pés à cabeça, com uma seriedade sem igual, sua expressão se amainou um pouco.

— Tudo bem, então. — O homem me puxou para dentro do cômodo onde ele estava.

Inicialmente pensei que ali era um quarto, mas estava claro que não. Tinha bastante espaço, um teclado, alguns objetos aos quais não detive minha visão e no centro do lugar, uma cadeira. Uma cadeira simples, feita em madeira escura e de assento largo.

Ele caminhou até a cadeira com passos singelos – não estou maluca, isso existe e eu vi.

— Você pode se sentar aqui. Estou treinando o texto de um monólogo que eu mesmo escrevi. — Ele explicou. — Você gosta de monólogos?

— Gosto sim. — Respondi. Prontamente tratei de me sentar naquela cadeira e demonstrar toda minha boa vontade.

Sempre gostei das artes performáticas, apesar de minha condição financeira não me dar oportunidade de ter acesso a muitas delas. Um monólogo, então... Creio que era uma raridade. No fundo eu quis que aquele homem ali fosse bom nisso porque um monólogo mal feito ou mal interpretado faz com que qualquer ser humano se agarre com o sono e nunca mais o solte.

O homem mexeu em um interruptor e ligou uma luz avermelhada que incidia no espaço logo a minha frente.

Ele se posicionou ali e, apesar de não ter feito nada demais, apenas uma mudança de expressão, eu já tinha vontade de aplaudir. Eu podia sentir a dor em cada linha de seu rosto.

— Eu sinto, aqui, — ele pousou um punho fechado sobre o coração — um vazio, forte demais para ser dominado. E apesar de ser vazio, me preenche. Inunda. Transborda pelos meus olhos, como lágrimas de desespero. Eu não quero ficar sozinho aqui, mas não tenho escolha. Nenhum de nós tem. Estamos presos em gaiolas invisíveis. Daqui, deste detestável pedestal — ele apontou para o chão —, eu posso tocar as nuvens e nada mais. Nenhum calor humano a mais.

O homem ergueu os dedos como se estivesse acariciando nuvens, na face havia uma expressão de quem cede à loucura pouco a pouco.

— Eu não peço muito — olhou diretamente para mim —, somente liberdade — a entonação da palavra foi mudando ao passo que ele falava, na sílaba final quase já não era mais audível. — POR ACASO EU PEÇO MUITO? — O grito e a expressão de raiva, que vieram em seguida, fizeram meu coração pular. — Qualquer ser medíocre tem a liberdade de ir e vir, porém não eu. Não sem me machucar. Não sem machucar alguém. — Ele colocou duas mãos sobre a face e deixou a cabeça pender. Quando levantou o olhar riu com ironia. — Quem sou para chamar a outros de medíocres? Acaso o medíocre não sou eu? Um fantoche. Alguém me salve daqui, eu imploro — ele se ajoelhou e ergueu os braços como se estivesse preso por cordas. — Alguém devolva minhas asas modestas de ser humano comum. — Ele começou a chorar e eu também. Minha vontade era cortar aquelas cordas invisíveis e tirá-lo da terrível agonia na qual ele se encontrava.

Coração curado [Concluído]Où les histoires vivent. Découvrez maintenant