• P ú r p u r a •

2.4K 292 18
                                    


A amizade é uma alma com dois corpos.

*

— Faça o que ele lhe pedir, minha filha — foi a última coisa que escutei de meu pai, antes dele ficar estático, sem voz e perder os sentidos.

Sabia que ele não estaria ileso, que por não ter pago a dívida que fizera, eles iriam bater nele até o coitado não ter forças.

Minha família é pequena. Minha mãe nos abandonou quando eu era apenas uma bebê. Foi através da minha tia que preencheu lacunas que uma influência feminina poderia fazer em minha vida.

No colegial eu tenho Naia. Uma amiga maravilha a quem confio plenamente. Ela nunca me deixou na mão por nada nesse mundo. Sempre fizemos votos de fidelidade, custasse o que custasse. Mas naquela época, eu nunca imaginava que era a vida de meu pai que estava em jogo.

Se tirarem meu pai, tiraram metade de mim.

Coloquei em meu corpo um vestido preto, uma carteira da mesma cor e um anel de pérola.

Naquela noite, eu não conseguia fazer a maquiagem. As lágrimas a borravam. Meu estômago doía como nunca havia sentindo.

"Se eu não quiser, se não conseguir?"

"Então eu começo matando seu pai."

Aquela voz fria em meu ouvido não parava de lembrar-me o qual cruel aquele homem poderia ser.

Respirei fundo, e senti como se uma pedra estivesse no meio da minha garganta. Machucando, cortando. Coloquei minha mão no pescoço tentando amenizar a dor.

"Não Kate" - gritava Naia, sorrindo. - "Não olhe! Não olhe!" - dizia ela, com as mãos em meus olhos. Me guiando para dentro do meu próprio quarto.

"Não estou olhando sua boba!"

"Estamos bem perto."

Suas mãos saíram do meu rosto, mas ainda permaneci com olhos bem fechados.

"Certo! Agora abra!"

Quando abri, piscando bastante pelo tempo que fiquei apertando meus olhos para não entrar em tentação de abrir, aos poucos eu fui entendo o que tinha ali.

Uma cesta de palha.

Caminhei até minha cama. Do nada, pulou, dentro da cesta, uma gatinha branquinha como a neve.

"Eu sei que seu pai é alérgico, que você não pode ter animais em casa, mas comprei para você, prometendo que vou cuidar dela."

"Naia, eu tenho uma gatinha?" - Estava tão feliz.

"Você tem!"

"Podemos chama-la de... Ah, já sei! Floquinho!

Sufoquei com meu próprio ar. Segurei-me na parede porque estava difícil manter o equilíbrio enquanto tudo rodava ao redor.

Com dificuldade, retornei ao banheiro. Abri gavetas a procura de um remédio para dor. Eu não sabia identificar onde ela começava e terminava, mas estava me massacrando de dentro para fora.

Como ter coragem de ir para casa de uma amiga sua, sorrir para ela, criar mentira para entretê-la e no fim, sem uma gota de sangue quente, envenená-la? Envenenar alguém que você ama. Que só de ti ver fica feliz, alguém com uma vida tão longa para desfrutar.

Tinha um espelho enorme na minha frente, mas eu não conseguia me encarar, mesmo se quisesse, eu tinha medo de olhar-me em meus próprios olhos.

Escutei a porta do quarto bater.

HELL | Série Dark Virgin | Edição 01Where stories live. Discover now