você não gosta de mim como eu gosto de você

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Há duas coisas que Ten e bebidas me entorpecem: minha autossabotagem e desmotivação. Porque às vezes, digo, sempre... sempre há algo que barra, sabe? Sempre há algo que barra meu bem-estar. Sempre há eu.

Eu sempre soube lidar, aprendi a acordar pela manhã e ter remédios pra ingerir como café. Aprendi a agradecer elogios, mas principalmente a não acreditar. Os anos passam e eu apanho mais, porque eu estou sozinho e caído, e aparentemente não quero me levantar. Eu aprendi a chorar no escuro, no meio da noite, justamente para ninguém me escutar. Às vezes grito de dor contra o meu travesseiro e nem sei de onde vem forças. Eu me derroto de propósito, aprendi a perder do que ganhar, aprendi a lidar, eu prefiro chorar.

E, meu Deus, tudo é tão tedioso para mim, desinteressante. Não há nada de extraordinário no mundo, não há nada de extraordinário em mim. É como se eu estivesse sentado no ponto de ônibus, assistindo o coletivo que me leva para casa parar bem na minha frente e eu não mover um músculo. Esse ônibus é como a minha vida. Ela está passando e eu não estou fazendo exatamente nada senão assisti-la de camarote, sem nem mesmo protagonizá-la.

— Você quer que eu arranje um pouco de bebida? — sussurro próximo ao seu ouvido enquanto acaricio sua nuca com afeto.

— Hm. Pode ser — ele concorda com a cabeça.

Estou muito agitado, é bom que eu me apresse mesmo. Quanto menos demorar, mais rápido voltarei para perto dele e me sentirei bem. Maldita ansiedade de voltar para ele, eu fico submisso dessa necessidade esquisita de querê-lo perto o tempo todo.

Estou meio tonto... Meus calcanhares giram, trôpegos, perdem-se no meio do caminho como se desconhecessem o significado de andar. Deve ser porque meu cadarço está desamarrado e alguém pisou nele. Só que não dá pra mudar o fato de que já me impulsionei para frente e, atrapalhado, me choco com o moço que serve bebidas. Meus reflexos funcionam tarde demais, por isso que dou de cara com o chão ao decidir recuar do tombo já dado.

A princípio acho que nada do meu corpo sofreu grande impacto, mas prontamente a dor na minha testa surge para dizer que eu caí de cara no chão forte demais. Se eu não morro agora, sou imortal. Merda, como foi que até na hora de recuar eu me atrapalhei todo e, ao invés de me equilibrar, tombei para o lado e meti a fuça no assoalho? Só faço merda, francamente...

E de repente começa uma confusão ao redor de mim, muitas vozes, muitos timbres, muitas palavras, muitas perguntas... E eu estou muito enjoado, a dor na testa fazendo-me pensar que talvez eu esteja em coma depois de um traumatismo craniano. Há anos eu não bato a cabeça e, recobrando-me de quando era criança, fico feliz em sentir isso outra vez. O único problema é que, só talvez — enfatizando, só talvez —, eu esteja meio bêbado e, rindo desse jeito, faz com que todos me estranhem mais ainda.

Mãos me ajudam a me levantar e, eufórico, eu rio cambaleante enquanto procuro uma cadeira para descansar. A bebida é quente; a música, envolvente; e os braços ao redor do meu corpo guiam-me apressadamente por aqui. Jogado numa poltrona, encaro Chittaphon me olhando preocupado sob o rosa néon pintando seu cabelo preto que cobre o olhar escuro e intenso.

O tempo está passando rápido demais ou eu não estou muito bem. O garçom traz um saco de gelo e Ten senta-se ao meu lado, pressionando-o contra a região que eu me machuquei. Ele acaricia meu cabelo, eu me arrepio porque meu corpo não resiste ao seu toque. Me empurram água, eu bebo. Me empurram um suco, eu bebo de canudinho, assoprando e fazendo bolhas até Chittaphon me pedir pra parar.

Bloody Mary, por favor — peço ao garçom. Estou ficando irritado com esse gelo na minha testa. E essa dor infernal que não para...

— Você não vai beber mais — Ten decide por mim.

— Eu estou bem, sério — afasto o gelo da testa. — Bloody Mary e Cosmopolitan — refaço meu pedido ao garçom que, após um suspiro impaciente de Ten, acaba por ir providenciar minhas bebidas.

— Se você beber mais e quebrar alguma parte do corpo, eu vou te deixar pra morrer aqui sozinho — Ten deixa o saco de gelo sobre a mesa e tira o celular do bolso.

Acho que ele está irritado por estar se preocupando comigo, como aconteceu no dia que quase fui atropelado e meu celular foi pro além. Ele tem o jeitinho dele de se importar comigo e ele é muito, muito precioso em pensar em mim assim. Por isso que acaricio sua nuca e encosto meu queixo no seu ombro.

— Hm... Sai, Taeyong — ele se inclina para o lado quando me sente abraçá-lo. — Você sabe que eu não gosto de grude. Sai, sai.

— Ah, por quê? — choramingo no seu ouvido, abraçando-o mais forte.

— Me sinto encurralado, sai — Ten dá tapinhas na minha mão para fazer-me soltá-lo.

Paro de agarrá-lo e fico quietinho na minha, com as pernas grudadas e um olhar distante e triste.

— Poxa, Ten... Pena que você não gosta de mim como eu gosto de você...

Ele finge não escutar enquanto responde mensagens no celular caro dele. Percebo que tudo que tenho é eu mesmo, então me abraço para me consolar. Mas quando eu passo a mão na testa com o intuito de tirar o cabelo que, molhado pelo gelo, está caindo sobre meu rosto, dou-me conta de que não é só eu mesmo que eu tenho... Eu também tenho um galo na testa. 

café et cigarettes༶✎༶tae•tenWhere stories live. Discover now