você quer o quê?

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Toda vez que paro de chorar, do nada começa a escorrer. Escondo meu rosto na camisa do restaurante, mas só encharca. Caminho apressado pelas ruas, ao descer do ônibus. Não enxergo qual chave é a certa, então levo cinco minutos procurando, dez minutos agachado chorando na frente da porta - com a desculpa de que não consigo distinguir a certa das erradas - e mais sete minutos testando as chaves com a mão trêmula. Eu me odeio por estar assim.

Quando entro em casa, não ligo a luz. Capengo pelo corredor, tropeço em alguma porcaria, caio de barriga na cama. Fico aqui, em silêncio, abafando o som com o travesseiro. Debaixo dele, sinto algo metálico com couro. Puxo para fora, então jogo para qualquer canto. A gargantilha que ele esqueceu aqui, após nossa noite, não significa mais nada para mim. Nada. Quero que ela não signifique nada.

Acordo com dor - não estou falando só exterior. Não me lembro quando dormi, só sei que chorei. Não sei que horas são, mas ainda é manhã. Pego o mesmo ônibus que estou acostumado a pegar, mas não é o mesmo motorista de bigode que me cumprimenta com um humor péssimo. Me pergunto se a vida dele é tão horrível assim, para que não sorria uma vez sequer para qualquer passageiro. Mas agora não estou em posição de julgar ninguém. Acho que agora entendo ele.

Chego no restaurante. Ele está funcionando como sempre esteve, mesmo com a ausência do tailandês. Não quero mais vir aqui, então chamo Jaehyun para conversarmos. Diz que é pra subirmos e conversarmos a sós, mas insisto em dizer que será rápido.

— Venha mesmo assim —diz, subindo as escadas que eu subia para amar alguém.

Eu sigo, porque estou cansado. Silencioso, quieto e sem cor. Não me sento, como ele pede para que eu faça. Não quero trocar farpas, não quero brigar hoje. Vim só resolver uma coisa e ir embora. Tenho compromisso com a solidão.

— Eu só quero resolver uma coisa... — digo. — Eu quero me demitir.

— Você quer o quê? - a surpresa dele me faz até questionar se quero isso mesmo.

— Me demitir — repito.

-— Ah, eu não creio que você está fazendo isso porque...

— Eu estou fazendo isso porque quero e... preciso — interrompo. — Era só isso mesmo.

— Sua demissão, uh? — ele parece lamentar, porém curioso. — Vai acabar sem seguro desemprego...

—  Não estou nem aí. Não preciso do governo — cruzo os braços.—- Por favor, resolva isso para mim. Eu só... quero dar um jeito em tudo.

Jaehyun me encara por alguns segundos, depois levanta-se com o celular na mão.

— Tá, vou informar ao Ten — me diz. Engulo em seco. Eu não gostaria disso.

Jaehyun afasta-se um pouco, fica perto da janela, procura o nome de Ten no contato e inicia a chamada. Eu não sabia que estava no viva-voz até escutar a voz que faz o meu estômago embrulhar:

— Nem embarquei ainda e você já está sentindo minha falta? — sai do telefone.

— Não é isso, é que... Senti necessidade de lhe informar uma coisa — fala, olhando para mim. — O Taeyong está se demitindo. Só para você saber mesmo.

Ele fica em silêncio por alguns segundos. Sério, parecem eternos.

— Eu já ia pedir para você demitir ele... então pra mim, tanto faz — depois disso, ele encerra a chamada do nada.

Jaehyun fica olhando do telefone para mim inúmeras vezes, sem entender nada. Ainda com a mesma cara de quem não está entendendo nada, caminha e senta-se onde Ten costumava sentar.

— Tá, então você vai ter que escrever uma carta de demissão, por favor — nem olha para minha cara, já preparando os materiais. Ele realmente está pensando no que acabou de acontecer.

Passo a manhã aqui, resolvendo burocracia e financeiro. Me canso facilmente, pois me dá tédio. Assim que sou liberado, ele diz que foi bom me ter aqui. Respondo o mesmo, mas apenas para ser simpático. Aperto meu passo para casa. Ten deve estar embarcando daqui a poucas horas.

Não vou a aeroporto nenhum. Vou pra casa, troco de roupa e resolvo assistir séries. Segunda temporada de You e agora a garota mudou. Tenho que escutar os gemidos de Love, porém não me incomoda mais. Não há ninguém ao meu redor para desconfiar que estou assistindo vídeos eróticos. Não há ninguém... Não há ninguém...

Merda, estou chorando de novo.

café et cigarettes༶✎༶tae•tenOù les histoires vivent. Découvrez maintenant