Decisão Irreversível

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Depois de se retirar do shopping, Caian vai a outros lugares ali perto. Sempre com as palavras que Lorenzo disse à flor dos pensamentos. Contudo, definitivamente, ele já aceitou a ideia de que não pode ir para outro estado e, talvez, nem deva. Ao olhar sua pasta de documentos, observa que já entregou todos os seus currículos. E, finalmente, agradecendo a Deus em seus pensamentos, ele vai para casa.

16h23. Indo em direção à residência, de longe, ele avista quatro vizinhos na frente de sua casa. Um deles está um pouco distante dos outros, ao modo de que parece estar tentando fazer uma ligação do celular. E as outras três conversam, com um semblante que demonstra preocupação. Caian franzem a testa. Acha aquilo muito estranho. Começa a ficar nervoso. O coração acelera. Ele acelera seus passos. Ao chegar, pergunta, preocupado:

- O que tá acontecendo aqui?

- Sua mãe passou muito mal depois que você saiu. – Diz uma das vizinhas - Estava vomitando sangue, seu pai está lá dentro com ela, ele nos chamou desesperado e disse que não tem dinheiro para chamar um táxi e levar ela no hospital, estamos tentando falar com um amigo que tem carro e...

Sem esperar a vizinha terminar de falar, o rapaz corre para dentro da casa. Encontra seu pai massageando as costas de Maria Clara, ela está sentada na beira da cama, querendo vomitar... O chão encontra-se todo sujo de vômito, misturado com sangue. Totalmente nervoso, ele diz:

- Mãe! Mãe! Pelo amor de Deus... O que aconteceu?! É... Olha, o vizinho tá chamando o amigo dele... Você precisa ir para o hospital, agora!

- Ela não quer ir... Já insisti. Eu chamei os vizinhos para ajudar, ela quase desmaia. Vomitou muito e ainda tá com vontade. – Afirma Otoniel, falando alto.

O rapaz se ajoelha na cama, pega nas mãos da mãe, olha em seus olhos e diz:

- Mãe, se esse carro vier, vamos ao médico sim! Vou com você. Papai também vai. Você não pode ficar assim, minha mãe. Por favor! Vamos? Lá você terá todos os cuidados.

De repente, uma das vizinhas chega ao quarto e avisa que o carro chegou. Otoniel olha para Maria Clara e diz, decidido:

- Vamos Clara. Eu não vou deixar você ficar assim. Nem eu, nem seu filho. – Depois olha para o filho e continua - Caian arrume uma bolsa, pegue lençóis e roupas para sua mãe!

Eles entram no automóvel e seguem em direção à unidade de pronto atendimento da cidade.
São quase 18h00 quando eles chegam ao hospital público de Villa Áurea. Mas parece que não há notícias agradáveis ali. As filas estão enormes. Tanto de urgências, quanto de emergências. Otoniel e Caian estão aflitos. Maria Clara está quase desmaiando. Há apenas dois médicos atendendo cerca de 30 pessoas passando mal. Enfermarias lotadas. No entanto, devido ao estado de Clara, um dos enfermeiros consegue um atendimento mais rápido para ela, solicitando urgentemente a consulta a algum dos clínicos. Otoniel vai para a sala de consulta com Clara. Enquanto isso, Caian espera do lado de fora. O pai relata a situação de sua esposa, mostrando os exames e o diagnóstico de câncer, dado alguns dias atrás. Sem pensar duas vezes, o médico afirma que ela precisará ficar internada e, logo, a encaminha para a sala de internação. Pelo menos por uns dois dias, até aliviarem os sintomas e, depois disso, ela poderá retornar para casa. Depois de darem a notícia a Caian, Maria Clara se prepara para ficar e dormir no hospital. Otoniel, por sua vez, pega no ombro do filho, na porta da enfermaria e diz:

- Cuide da casa, filho. Vou ficar aqui com a sua mãe! Irei cuidar dela! Eu estou com meu celular. Prometo que te dou noticias, te ligo! Aliás, o médico disse que ela só vai ficar aqui por uns dois dias, depois ela decide se quer continuar ou se vai embora.

- Cuida dela, por favor pai. Vou ligar para você assim que chegar em casa!

Caian entra na enfermaria, dá um beijo e se despede da mãe. Segue pelo corredor daquele hospital que tem uma estrutura desumana. Ele olha para o local onde está andando. Pessoas de diversas idades esperando atendimento. Crianças gritando. Idosos deitados em macas velhas. Temperatura um pouco alta. As centrais de ar não estão funcionando normalmente. O calor é surreal. Foi sorte um dos médicos terem conseguido uma cama, na enfermaria, para sua mãe. Talvez seja pelo fato d'ela estar com câncer. Diante disso, ele passa a refletir no fato de que Clara não merece estar nessas condições. Repentinamente, ele ouve uma conversa entre duas mulheres em meio aos corredores: elas estão falando que as refeições do hospital são oferecidas somente aos pacientes e que o lanche, do lado de fora, é um pouco caro. Os acompanhantes precisam comprar a própria refeição. É angustiante para Caian saber que seu pai ficará com fome. Ou dividirá com a mãe – até porque os médicos vão reforçar a ideia de que Clara precisa comer. Simultaneamente, ele começa a lembrar da proposta de Lorenzo. De todas suas palavras positivas. Principalmente de quando disse que apostaria todas as suas fichas nele. No mais profundo de si, Caian sabe que tudo o que Lorenzo disse é verdade. Ele tira do bolso da calça o cartão com o número do recém-conhecido. Ele, novamente, olha para o lugar horrendo que sua mãe se encontra. Seu pai sem se alimentar. Logo ele pensa "seriam só três dias mesmo", "ele paga minha passagem de ida e volta", "quem sabe posso até receber algum dinheiro", "será que vou ou fico?", "minha mãe merece um plano de saúde e ficar em um bom hospital quando passar mal". Ele está pensativo. Provavelmente tomará alguma decisão.
O vizinho está o esperando do lado de fora, no carro. O jovem o encontra. Entra no carro. Explica a situação e eles retornam para casa.

21h00. Caian está lavando as louças. Ele já ligou para Otoniel e, até então, Maria Clara parece estar melhorando. Parou de vomitar. O enjoo passou. Mas as dores continuam... Caian agora está se imaginando em desfiles. Fotos e propagandas. Os elogios de Lorenzo perturbam sua consciência. Ele sabe que seu sonho de infância poderia ser finalmente realizado. Imagina o conforto dos pais. Uma casa com piscina. Carros. Fama. Uma vida de glamour – comum a modelos famosos. Ao mesmo tempo, persiste em recordar sua atual situação. Dívidas. Doença da mãe. Desemprego. Enfim. Ele fica pensativo. Olha para o celular em cima da mesa. Lembra-se de tudo ao mesmo tempo. Decide ligar para Lorenzo. Aliás, serão somente alguns dias.

- Alô. Fala Lorenzo. Sou eu, Caian, é...

- E aí, cara. Tudo bem? Pensou em tudo o que eu falei pra você? – Pergunta Lorenzo, animado.

- Sim! Eu vi que realmente estou precisando... Mas são apenas três dias mesmo, né?

- Claro. Não se preocupe! Pago sua passagem. Compro agora mesmo pela internet. Ainda te dou uma quantia em dinheiro para ajudar você e sua família, que tal?!

- Tudo bem! Eu só vou avisar meus pais. Te agradeço pela oportunidade, cara! Valeu mesmo!

- Você sabe que se for comigo mesmo, já vamos amanhã. Como fazemos?!

- Me espera diretamente no aeroporto. Antes das 16h estarei lá. Não se preocupe. Amanhã nos falamos melhor.

- Fechou então! Vou te aguardar irmão! Valeu! Boa noite. – Lorenzo se despede, vitorioso.

- Boa noite!

RepresáliaWhere stories live. Discover now