Sempre fui tão acostumada a deixar os meus problemas de lado para cuidar dos de outras pessoas, que quando algo muito sério acontecia em minha vida, eu apenas deixava para lá. Ignorava. Fingia que não era algo grave, mesmo quando isso consumindo o fundo da minha alma.

- Não estou guardando os meus problemas para mim mesma. - disse, tentando convencer mais a mim mesma, que ele.

- Então por que está tão pensativa? - ele perguntou. - Digo, é óbvio que você pode ficar quieta desse jeito sempre que quiser, até porque será bastante tranquilo para mim, mas eu sinto que tem algo a mais do que um simples "momento de reflexão".

- Sabe, você é estranho. - disse, tentando mudar de assunto. - Uma hora me trata como uma criança e briga comigo, outra hora fala coisas como essas, em uma tentava de me incentivar. Por que faz isso? - comecei a mexer no canudinho do sucoesperando que meu segurança respondesse a minha pergunta, mas não exatamente isso o que ele fez.

- Aonde conseguiu isso? - perguntou, com sua voz calma.

- O suco? Bem, é óbvio que eu...

- Não, o suco não, esse bracelete. - ele apontou para o bracelete azul que eu usava em minha mão direita, e ergui uma sobrancelha confusa, encarando-o. Seus olhos, surpreendentemente, pareciam bastante interessados.

- Ganhei de um amigo quando tinha oito anos de idade. - respondi, sorrindo enquanto olhava para o bracelete. - A gente meio que fazia o mesmo cursinho, mas ele foi embora quanto eu me senti capaz de me aproximar dele. 

Quando eu era mais nova, costumava observar um garoto que passava pela rua da minha antiga casa todos os dias da semana. Sempre no mesmo horário, ele caminhava tranquilamente, sem ligar ou prestar atenção nas pessoas ao seu redor. Parecia ansioso e focado demais para isso.

Esse seu modo sempre despreocupado e focado de agir me fazia querer falar com ele. Entretanto, seu rosto sério e bastante objetivo me deixava com medo de puxar assunto e ser respondida de forma dolorosa.

Por conta dessa minha covardia idiota, enquanto o tempo passava e passava... eu precisei, consequentemente, parar de observa-lo quando comecei o cursos de artes e nossos horários pararam de se bater. No começo, me senti bastante triste. Tinha abandonado algo interessante, por algo que me fazia sofrer diariamente, já que meus colegas não eram tão receptivos assim quanto eu pensava ser. Entretanto, ainda assim, minha paixão pela arte me fez continuar, embora o preço disso fosse parar de observar o garoto desconhecido.

Em uma dessas minhas aulas de arte, o professor no pediu para desenhar algo que nós gostávamos bastante, mas não possuíamos certeza se iriam nos fazer bem futuramente.

Me recordo que algumas crianças desenharam batatinhas fritas, andar na rua enquanto chovia, abraçar um cachorrinho enquanto espirrava por ser alérgico, e quando chegou na minha vez... bem, quando chegou na minha vez ninguém entendeu o meu desenho. Isso porque eu havia o desenhado. O garoto desconhecido.

Confuso, o professor perguntou o motivo de eu ter desenhado alguém, ao invés de algo, e naturalmente, eu respondi: "Pessoas também podem nos deixar confusas em relação a nos fazer bem ou não". E apesar da leve tristeza expressa em seus olhos ao escutar minha explicação, meu professor me deu um dez, e disse que se eu quisesse, conseguiria ser uma grande artista.

Uma pena que o que era para ser um grande dia feliz, tornou-se um pesadelo quando o cursinho acabou e o professor foi embora, me deixando sozinha com meus colegas de classe, que frustados por não conseguirem a nota máxima, pegaram meu desenho, o rasgaram, e logo depois saíram da sala, felizes, enquanto eu me afundava em lágrimas.

Nunca gostei de fazer a mesma coisa duas vezes. Para mim, meus primeiros desenhos, apesar de rabiscados demais ou com traços demais, ou até mesmo pintados demais, sempre eram mais bonitos e mais significativos do que cópias. Fazê-lo e refazê-lo era algo que eu nunca gostava, pois o segundo desenho nunca me causava tamanha êxtase, quanto o primeiro, apesar de muitas vezes bem melhores e traçados.

Não sei por quanto tempo fiquei chorando dentro daquela sala vazia até de repente pegar no sono por causa do cansaço, e também não fazia questão de lembrar. Entretanto, apesar dos vários anos que se passaram, eu ainda me recordo, e provavelmente iria me recordar para sempre, do momento em que a porta se abriu e ele adentrou a sala de aula com os pedacinhos do meu desenho perfeitamente encaixadinhos com uma fita transparente em sua e pediu desculpas pelo comportamento dos meu colegas, mesmo eles sequer sendo próximos dele.

Sua voz, calma como uma canção de ninar, me deixou com ainda mais vontade de chorar. Não por tristeza, claro, mas sim por vergonha. Eu me sentia envergonhada demais por estar vendo-o daquela forma tão patética, e o sentimento só aumentou, quando ele se abaixou e sorriu para mim e perguntou: "Posso ficar com o desenho? Eu gostei, você tem talento."

Sem saber o que fazer, apenas acenei, sorrindo fraco, e vendo-o alargar um pouco mais seus lábios, ao dizer: "Já que aceitou, não posso ir embora sem antes de dar algo também." Pegando uma de minhas mãos, ele colocou um belo bracelete azul lá e disse, antes de sair da sala: "Você tem talento, então não deixe se afetar por coisas como essa. O mundo por si só é uma competição diária. Seja forte".

E desde aquele dia, eu não o vi mais. Óbvio que tentei saber mais sobre ele sobre os professores do colégio, que apenas respondiam que não podiam dar informações confidências sobre seus alunos, mas confirmaram que ele era um estudante de lá, que estava faltando as aulas por problemas familiares.

- Nalu? Pelo amor de Deus, em que mundo você está vivendo hoje? Marte? Saturno? -a voz do meu segurança, dessa vez, soou um pouco irritada. - Você novamente não escutou o que eu acabei de dizer, não foi?

- Claro que escutei. - afirmei novamente, mesmo sabendo que era uma bela mentira. - Dessa vez, você disse que precisa de mim sendo alegre e divertida para equilibrar a sua chatice.

- Ou tirar minha paciência. - ele murmurou. - De qualquer forma, dessa vez eu não vou repetir o que falei.

- Bem, não deve ser nada importante então. - dei de ombros.

Semicerrando seus olhos, ele encarou meu bracelete por alguns segundos novamente, e de um jeito um pouco estranho, disse:

- Você mudou bastante.

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Desculpa o capítulo grandão!!!

New security ❄ Im JaebumWhere stories live. Discover now