I - Uma Dama Inesperada

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- Carregamos em nosso rosto, a história de nossas vidas

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- Carregamos em nosso rosto, a história de nossas vidas. Em nosso corpo, as marcas que provam que ainda vivemos. No rosto dela não havia nenhum indício plausível que expusesse qualquer que fosse as suas histórias, mas seu corpo para sempre teria realces de um estigma. Mesmo assim, ela era leve como uma folha bailarina que dançava no último acto de sua vida, antes de finalmente beijar o chão.

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Camden saiu do mar sem nenhuma pressa. Os ombros largos se moviam a acompanhar as passadas cadenciadas enquanto a água escorria pela camisa branca e ceroulas de mesma cor. Os fios dourados estavam todos para trás e os pés descalços afundavam na areia fria que fazia questão de recordá-lo que não era uma boa estação para dar mergulhos demorados como os que ele dava todos os dias.

Tinha feito uma promessa quase três anos atrás quando a maldita tragédia aconteceu. Ainda se lembrava da noite fria e os relatos dos habitantes do vilarejo que tinham assistido tudo sem conseguir chegar a tempo para impedir o grande desastre que assolou sua vida. Quem diria que tudo terminaria de tal forma? Podia esperar de tudo dado ao facto prevalente, mas nada se comparava ao destino fatal. Incertezas eram facas de gumes afiados que se enterravam aos poucos em sua pele, pois geravam esperanças amoladas e que não se calavam em seu interior.

Quem sabe se? Era a pergunta que pairava sua mente todos os dias, mesmo após tantos anos onde todos tinham esquecido, menos ele que vivia e revivia os momentos intensos antes de tudo aquilo ter acontecido. Só por isso mergulhava naquele mar de inverno, procurando manter o coração congelado tal como seu corpo tinha mostrado ao se adequar a temperaturas tão baixas. Ou pelo menos era no que acreditava, porque só depois é que percebeu a razão de não odiar as temperaturas invernais.

— Creio que estamos atrasados, Leão. Shame. — Se envergonhou e acariciou o focinho do cavalo que relinchou. Os orbes cinzas analisaram o céu que mostrava tons laranjas, roxos e amarelos numa mistura bonita demais para ter que ir embora ao invés de se sentar ali para apreciar. Porém, tinha obrigações por cumprir e um título que exigia toda uma têmpera intocável por mais que por dentro desejasse ter sido um rebelde sem causa.

Apanhou as roupas que estavam dobradas em quadrados perfeitos perto de um dos pedregulhos entre vários que se espalhavam aqui e ali, e puxou a camisa molhada por cima da cabeça, revelando o torso muito bem moldado, antes de se vestir com a outra peça que estava intacta. Abotoou em toda calmaria que lhe competia e só então se dispôs a usar o colete por cima. As calças vieram por cima das ceroulas, pois sabia que algumas camponesas se punham a espreitar sempre que podiam e deixavam risadinhas envergonhadas escaparem pelo ar. Calçou as botas e finalmente colocou o casaco, ficando pronto para partir.

Quando montou o Leão – um cavalo dourado de raça pura que reluzia com os últimos resquícios dos raios do sol – se lamentou por ser tão tarde, não queria ser indelicado com a convidada, ainda mais sabendo da situação na qual se encontrava. Lord Parker tinha sido bem explícito na carta que lhe enviou, tanto que Camden demorou algum tempo para responder, refletindo se seria correto concordar com a presença de uma jovem naquele estado, colocando sua reputação em causa. Sabia que a família Parker estava quase na falência e que algumas propriedades tinham sido colocadas em leilão para que pagassem as dívidas do falecido patriarca. Também sabia o quanto Joshua era determinado e ambicioso, não tardaria a reverter a situação, a fama dele corria entre os membros do parlamento e muitas foram as mãos que se estenderam para ajudá-lo, inclusive a sua. Por isso não gostou de saber que a quantia avultada que enviara a família umas semanas antes, não servira para pagar a dívida pessoal entre os dois, a qual tinha sido descaradamente cobrada num pedido inusitado. Não era incomum que homens de posições superiores copulassem com suas subalternas, muitas eram enviadas para longe, por isso Camden compreendeu que aquela situação talvez fosse diferente, pois Lord Parker fazia questão de que a enviada ficasse sob uma espécie de responsabilidade e não sozinha em algum lugar daquele país.

Nove Meses Para SempreWhere stories live. Discover now