- Abre a porta, Zack! - ouvi Sara, esposa do meu irmão gritar para meu sobrinho.

- Não dá, tô jogando! Pede pra Lisa! - ele gritou de volta. Ouvi Sara falar, mas foi só um murmurinho incompreensível. Ouvi alguns tropeços e a porta se abriu e minha sobrinha arregalou os olhos quando eu sorri.

- Tia Ivy! - Lisa gritou antes de me abraçar. Eu a abracei de volta, ela havia crescido tanto.

- Oi, querida.

Zack apareceu atrás dela e sua expressão foi igual. Deus, ele estava ainda maior que ela.

- Mãe, a tia Ivy está aqui! - Lisa gritou e Sara apareceu.

Depois de todo o frenesi e das crianças fazendo um milhão de perguntas e de eu dar os presentes a elas, eles estavam quietos no sofá, os olhos pregados no celulares que dei a eles. Eu e Sara sentamos na varanda, o sol já estava caindo, mas o frio não era tão incômodo.

- E como você está? - quebrei o silêncio fúnebre. Ela ainda tinha aquele semblante triste de quando meu irmão morreu, e eu devia ter o mesmo.

- Estou levando... as crianças são um lembrete diário para eu não desistir - sua voz era monótona e sem expressão, como se estivesse lendo um folheto decorado - E você?

- Juntei dinheiro durante esse ano fora e decidi que estava na hora de voltar.

Sim, eu fugi da pergunta. Essa casa, as crianças e o sentimento que apertava meu coração estavam me levando para um lado sentimental que eu queria enterrar. Não agora. Preferia chorar sozinha, sem platéia.

- Como se precisasse de dinheiro - ela riu com um murmúrio. Eu realmente não precisava, tinha uma poupança gorda de aposentadoria militar que ganhei da morte da minha mãe e do meu pai, mas não conseguia ficar sem fazer nada, então esse dinheiro se juntava ao outro e eu vivia bem de verdade.

- Estou perguntando como você está, Ivy - ela insistiu.

- Só precisei de umas férias e tudo voltou ao normal - minha voz saiu carregada de desgosto e sarcasmo. Como ela acha que eu estou?

- Ser sarcástica sobre isso não ajuda - ela começou e eu dei uma risada nasalada.

- Falar sobre também não vai trazê-lo de volta, Sara - eu a cortei. Ela me olhou com um olhar cortante, e eu odiava me sentir pressionada.

- Você acha que é só voltar, dar presentes e as coisas vão voltar a ser como antes, Ivy? - ela disparou, seus olhos já se enchendo de lágrimas - Onde você estava quando a gente precisou? Você simplesmente fez as malas e foi embora.

- Eu não era forte nem para me manter firme, como ia consolar alguém? - cuspi. Ela não tinha o direito de me cobrar nada, eu tinha sofrido tanto quanto eles - Ele era meu irmão, caso tenha se esquecido.

- Eu não me esqueci, quem parece ter se esquecido foi você - ela desviou o olhar após isso, secando os olhos. Ela ainda era aquela mesma mulher quebrada de um ano atrás, destroçada pela morte do marido e nada ia mudar isso, quem sabe o tempo.

Eu levantei, apertando o casaco contra mim, pronta para ir. Eu não conseguiria ver essa cena de novo. Foi assim quando David morreu. Foi assim nos meses seguintes. Dor e mais dor. A porta se abriu e Lisa saiu de casa, me mostrando o celular com o aplicativo do Facebook aberto. Eu sorri como pude, pegando minha bolsa e a colocando no ombro.

- Já vai? Mas você acabou de chegar - ela lamentou e me abraçou pela cintura. Eu sorri, afagando seus cabelos.

- Recebi um telefonema - menti e Sara ficou de pé, braços cruzados, olhando para baixo e se recompondo - Meu número está no seu celular e no de Zack, vocês só precisam por um chip e podem falar comigo quando quiserem - dei um abraço e um beijo rápido em sua testa - Eu tenho que ir agora, querida. Dê um beijo no seu irmão.

Justo e SujoWhere stories live. Discover now