Capítulo XVII: Espelho marinho; Sentimento confuso

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      Estava com muito frio, e molhado. Todo molhado. Abro meu olhos e me deparo dentro do mar, era escuro e sinistro. Olhava para todos os lados pois tinha a sensação de que algo me observava no escuro. Toco em meu pescoço e vejo que estava com guelras, devia estar utilizando a magica de respirar debaixo d’agua. Então não tinha muito tempo. Nadei o mais rápido que pude para cima mas não conseguia chegar na superfície ou na parte mais clara do oceano, então algo se enrosca na minha barriga. Algo gelatinoso e me puxa me virando, então me deparo com olhos negros enormes e luminosos que debaixo d’agua refletiam em um tom violenta. Era o Octopus, ele emitiu aquele som nasal e me aproximou mais de sua boca redonda.
      Tento me soltar mas não consigo, tento gritar mas quando abro a boca ela se enche de agua, então sinto que é o fim da linha, pois já conseguia ver a fileira de dentes que me aguardava para a degustação da minha carne.

     Abro os olhos num susto, estava em um lugar claro e todo molhado de suor. Tivera mais um de meus pesadelos. Apalpo onde estou e sinto lençóis finos e macios. E tento me levantar mas ao me apoiar com o braço, meu ombro lateja e gemo de dor voltando a minha posição inicial.
- Edward! Ainda bem que acordou. – olho para o lado e era a Shermicy, com um short casual jeans e uma blusa rosa. Estava limpa, seca e arrumada. Olho para mim mesmo e vejo que estou com roupas folgadas azuis. A Shermicy se aproxima depositando uma tigela quente na bancada ao lado da minha cama e me encara.
- Como esta se sentindo?
- Acho que bem, fora não poder mexer muito meu braço. – falo ainda sentindo uma pontada de dor pelo esforço feito.
- Você teve sorte. O doutor Rupert estancou ligeiramente seu ferimento, disse que não sofreu nada tão grave e não ficará com sequelas em perder o movimento do braço. Ficou ate espantado pela sua rápida recuperação. – explica Shermicy e analiso o lugar que estou. Não era meu quarto e sim um lugar onde tudo era branco e aguado.
- Onde estou? – pergunto com cara duvidosa olhando todos os detalhes do lugar.
- Está na ala hospitalar. Um dos últimos andares do navio. – explica ela.
- E por quanto tempo apaguei? Cadê Like e Kyle? Eles estão bem? E...  – Shermicy me interrompe.

- Calma Edward. Uma pergunta por vez. Primeiro: Você apagou por algumas horas, já é quase a hora do almoço. Segundo: Like e Kyle estão em seus quartos repousando e sim, estão bem, só tiveram alguns arranhões mas já se regeneraram. – explica Shermicy a cada pergunta que fiz em voz alta mas ainda faltava tantas em minha cabeça.
- E o restante do navio? O capitão será que ele vai nos jogar no mar? – pergunto ao lembrar que quase toda a tripulação nos vira em ação.
- Edward o navio sofrera graves impactos, todos os quartos estão em estilhaços por conta das janelas que foram quebradas, mas isso já esta sendo concertado. O Atlas 922 tem uma equipe de manutenção incrível. Só não pode mais sofrer danos fortes se não corre o risco de afundar, e no caso do capitão ele quer falar conosco. Mas pedi para que aguardasse você descansar e se recuperar. – ela me olha meio que preocupada. Sei que nada estar bom.
- Entendo. Mas me conta, como pôs os algodões nos ouvidos sem que eu visse? – pergunto ao me lembrar do ocorrido.
- Quando você revelou que se tratavam de sereias juntei o motivo de você e o demônio por os algodões. Então quando Like jogou no chão o pacote e saíram em disparada para ir ate o deque eu rapidamente peguei o algodão e coloquei nos meus também e fui alcançar vocês. Ia entregar a Kyle alguns mas foi um fuzuê tão grande que acabei esquecendo. – fala ela e fico feliz por ela ter pensado tudo tão detalhadamente e ligeiro.
- Fiquei com medo que tivesse sido pega pelo encanto do Tríon, e com medo de te... – vacilo um pouco, não sabia como expressar minha grande confusão de pensamentos.
- Você ficou com medo de quê Edward? – pergunta ela incentivando para que eu terminasse, mas olho para o lado encarando a tigela que fumegava.
- Com medo de... ...ficar com fome. O que tem nessa tigela que tá com cheiro tão bom? – pergunto mudando bruscamente o assunto, vejo um desapontamento no rosto de Shermicy, mas só por um momento, pois ela abre um sorriso logo após.
- É sopa de carne. Quer tomar agora? – pergunta ela e balanço a cabeça que sim. Ela me ajuda a ficar sentado na cama e me alto analisa.
- Quer algo melhor? Vê como esse quarto é incrível. – fala ela e sai saltitante ate umas grandes cortinas na parede e as puxam de uma só vez revelando algo magico. Além das cortinas era uma parede transparente, de vidro, e do outro lado se via o fundo do mar. O navio em movimento leve e tudo a se apreciar entre peixes coloridos, aguas vivas, cavalos marinhos e tudo mais.
      Uma emoção se passa em mim, por um momento a dor e os problemas foram esquecidos. Parecia que o quarto estava mergulhado no oceano. Onde mostrava que o fundo do mar tinha suas maravilhas também, e nesse devaneio não percebo que a Shermicy já tinha voltado de lá e estava do meu lado com a tigela na mão.
- Vamos comer? – pergunta ela.
- Não precisa. Eu consigo comer só. – falo e quando vou estender meu braço para pegar a sopa, o local do ferimento começa a doer e recolho o braço ligeiramente com uma cara sofredora.
- Acho que não consegue. Deixa que te ajudo. – ela se senta ao meu lado e ergue a colher para por a sopa na minha boca, vacilo protestando dizendo que não precisava. Mas não adiantou ela enfiou a colher na minha boca e a sopa morna adentrou minha garganta com um gosto maravilhoso, e então acabei me rendendo e deixando a Shermicy me dar a sopa. Ela me fez tomar toda a tigela com a maior paciência. Nunca pensara que um dia seria cuidado por alguém, logo por quem, ela, que devia ser minha inimiga. Espera, ela era minha inimiga, num era?
      Estava sentado na cama olhando o fundo do mar, uma criatura ficou na vidraça, era estranha. Parecia um tapete acinzentado. Esperei a Shermicy voltar pois tinha ido levar a tigela para a copa da área hospitalar. Já sentado na cama ponho meus pés no chão e me levanto, e vou devagar ate a vidraça para admirar de perto.
- O que esta fazendo! – levo um susto e me viro, era a Shermicy vindo brava em minha direção.
- Quero ver de perto isso aqui. – falo apontando para a visão do fundo do mar.
- Mas tem que repousar e descansar. – ela fala pegando em meu braço, mas não me puxa e sim me ajuda a ir ate a parede transparente.
- Ai me deixa. Já descansei demais. Quero andar. Olha. Como é o nome disso aqui? – falo apontando para a criatura na vidraça.
- Isso se chama arraia. – fala ela e olho outra vez a criatura que parecia um tapete ambulante.
- Parece ser dócil. – falo.
- É, mas se assusta-la ela pode mata-lo com o ferrão de sua cauda. – explica Shermicy e olho para ela.
- Como escorpiões?
- Quase lá. – diz ela sorrindo.
- Esse vidro é seguro? – pergunto tocando nele.
- Sim. Ele é blindado com pó de diamante. O diamante é a pedra mais poderosa. Ela quebra qualquer coisa e nada perfura ela tão facilmente.
- Incrível. – falo olhando bem ao fundo do mar a procura de algo mais interessante quando um enorme peixe passa vagarosamente pelo espelho, me assusto no começo mas depois sorrio pois sabia o que era.
- Olha esse conheço. É um tubarão. – falo olhando para a Shermicy que estava paralisada e posso crer que pálida também.
- É sim. Um grande tubarão. Vamos voltar. – fala ela me puxando toda tremula.
- Porque? Esta tão bom. – falo protestando enquanto ela me ajudava a voltar para a cama.
- É, mas é melhor voltarmos. Você ficou muito tempo em pé. – ela fala me sentando na cama e levantando os meus pés.
- Você tem medo de tubarões? – pergunto estranhando sua reação e lembrando como ela ficou.
- Não gosto de nada que vive na agua, inclusive polvos gigantes e sereias azuis e escamosas. – fala ela se esquivando.
- E tubarões. – persisto.
- Sim Edward e tubarões. Ok?
- O.K. não se preocupe. Nenhum tubarão vai te atacar. Esqueceu que a vidraça é blindada com pó de diamante. O produto mais vulnerável do mundo. – falo da mesma forma que ela explicou sobre o espelho.
- Estou me sentindo mais segura agora.
- Não tem com que ter medo. Eles estão do lado de fora.
- Mas você não sabe a sensação que é estar do lado de fora também. – penso por um estante e imagino que a Shermicy tenha passado por alguma situação desagradável com tubarões. Penso em perguntar mas acabo deixando pra lá e então ela boceja me chamando atenção.

- Quando foi que você dormiu? – pergunto.

- Bom, antes de ontem.

- O quê! Você não descansou essa noite! – repreendo irado.

- Não tinha como. Tinha que ficar de olho em você. – fala ela em defesa. Olho ao redor e só vejo uma solução. Me afasto um pouco na cama dando espaço e dou palmadinhas no lençol.
- Venha, deite aqui e descanse um pouco.
- Edward, melhor não. Você esta ferido e precisa de mais conforto do que eu. Ficarei bem na poltrona.
- Não, por favor, eu insisto. A cama é grande e estou bem. Por favor se deite. – olho para ela com o olhar pedindo mais que minhas palavras. Não sei qual mensagem passou para ela, mas acabou cedendo e se deitando ao meu lado. De frente para mim.
- Confortável a cama não. – falo.
- É sim. Melhor que a do quarto. – rirmos do argumento e nos olhamos por um tempo.
- Confesso que fiquei feliz por ver você acordar bem. – ela fala baixinho como que se tivesse com medo que alguém ouvisse.
- E confesso que estou feliz por você estar aqui, cuidando de mim. Obrigado. – falo com um sorriso leve no rosto que não parava de olhar para ela. Com sua expressão alegre e cansada.
- Já disse que estou acostumada, isso só aumenta minha experiência em cuidar de você. – sorrio e faço cara de zangado mas não por muito tempo. Então ficamos em silencio só nos olhando, olhos cor de âmbar tentando um encontro com o tom verde esmeralda. Era faiscante. Não sabia ao certo como reagir. Me sentia indeciso e confuso as coisas não estavam indo conforme eu imaginava no começo. Preso aos meus pensamentos, ela suspira novamente, como da outra vez fizera como se estivesse esperando algo e se mexe fazendo menção para se virar.
- Bom, boa noite Edward. – ela fala de costas para mim. E eu me viro também.
- Boa noite Shermicy. – falo olhando para os pés da cama admirando a parede transparente e o mar calmo, e pego no sono depois de ver dois cavalos marinhos nadando juntos como se dançassem uma dança romântica e amorosa.

A Fonte de Lilith - Coleção Herdeiro de Bayeux "livro 2"Where stories live. Discover now