69| Regresso

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C A P Í T U L O 69

R E G R E S S O

O terminal de autocarros estava cheio de pessoas. Olhei para o relógio no meu pulso. Pouco passava das quatro da tarde, e nas próximas três horas eu e a Ava teríamos de apanhar um autocarro e fugir daquela cidade, ou então eu seria apanhado e preso. Uma vez que já havia provas a meu respeito, já não restava muito mais tempo para que me pusessem na cadeia por ser cúmplice de tráfico de droga e pessoas. E se me prendessem a mim, teriam também de prender o Matt. Porém eu ainda tinha de o destruir primeiro.

Caminhamos para a fila. A Ava estava ao meu lado de cabeça baixa e mãos nos bolsos. Eu sabia que ela estava zangada comigo e triste com a morte do pai. E destruída com tudo o que estava a acontecer. Ela culpava-me por tudo o que estava a acontecer. Mas honestamente eu já nem queria saber mais disso. Eu e a Ava éramos duas pessoas que apenas se cruzaram para viver o pior que a vida tinha reservado para nós. O pior de tudo é que foi em conjunto.

A fila avançou. Pouco de mim restava para conseguir fazer algo. Era apenas a minha mente a atuar. Depois daquilo eu não sabia o que ia acontecer. Em meia dúzia de meses aconteceram mais coisas do que em toda a minha vida. Eu não conseguia raciocinar em condições e só me conseguia alimentar do ódio existente em mim. Se não fosse a Ava metade daquilo não tinha acontecido. Porque por ser igual a mim, ainda que diferente, eu tínha-me deixado levar. Eu não pertencia a ninguém, talvez nem a mim mesmo.

O problema das pessoas é dar demasiado valor às outras pessoas e criar expectativas muito altas relativamente às mesmas. Eu tinha criado expectativas muito altas relativamente ao Niall e ele apunhalou-me pelas costas, ainda que se tenha redimido. A Ava fez o mesmo comigo e eu fiz com ela aquilo que outrora me tinham oferecido. Isso só comprovava a minha sede de vingança.

– São dois bilhetes para Nova York na próxima hora.

Nova York poderia não ser uma escolha muito inteligente. Para além de ser um local óbvio, eram lá que estavam todos aqueles que trabalhavam para e com o Matt. Ser lá encontrado quer por ele, quer pela polícia poderia ser fácil. Mas eu já não estava mais a pensar. Eu só tinha de fugir aos poucos para que não me apanhassem.

– A próxima hora é amanhã às 7 da manhã. – o homem informou.

Esperar quase meio dia para poder sair daquela cidade poderia ser fatal. Se a polícia tivera arrombado a minha casa e feito uma busca, então quereriam apanhar-me com todas as certezas. Tudo por aquilo que o Carl escreveu naquela carta, algo que me comprometeu a todos os níveis. E apesar de toda a minha curiosidade naquele momento, mais tarde, tudo o que vim a descobrir não foi de todo a coisa mais agradável. Mais valia nunca ter descoberto. Mais valia ter ficado enterrado como tivera estado até àquele dia. Mas segundo o Carl, eu tinha de saber. Tinha de saber porque aquilo fazia parte de mim, mas eu não queria que fizesse. Nem ali, nem noutra vida que estava prestes a acolher-me.

Cerrei os punhos em frustração. O que faríamos nós durante todo aquele tempo? Estávamos envolvidos no perigo, e não havia um único local onde nos pudéssemos refugiar para estarmos no mínimo protegidos. A questão era, protegidos de quem? Da polícia ou do Matt?

Paguei os bilhetes e depois de sairmos da fila olhei em volta. As probabilidades do Matt nos estar a rondar eram muito altas. Se das outras vezes ele tinha aparecido sem que eu desse fé, naquele momento ele poderia estar a preparar algo.

Depois de não ter detetado qualquer aproximação do inimigo, caminhei para junto das cadeiras. Porém a Ava não estava junto de mim, o que me fez entrar em pânico. Olhei em toda a volta e quando a encontrei caminhar para um lado oposto, corri até ela, segurando no seu pulso. Logo ela se virou para trás, encarando-me com os seus olhos azuis, aqueles que tantas vezes gritaram comigo, mas que por vezes me faziam esquecer do que estava ao meu redor.

Callous | h.sOnde as histórias ganham vida. Descobre agora