dois

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 Antes de entrar no prédio, Namjoon olhou o céu uma última vez. Estava bem escuro, variando entre tons de púrpura e preto. O céu limpo trazia muitas estrelas, mesmo que ofuscadas pelas luzes da cidade. Seu bairro ficava muito longe da Praia de Mangsang, e o garoto não servia nem para ter uma simples bicicleta. Bufou alguma coisa enquanto batia as solas no chão, querendo tirar a areia, e procurando a chave da pequena casa. Assim que abriu a porta sentiu um incômodo no nariz, pelo cheiro de madeira molhada e purificador de ar barato. Retirou os sapatos, para não sujar o carpete que ele mesmo limpava e colocou seu casaco de lado, no sofá de couro escuro.

 - Sana?

 Chamou pela prima, indo na direção da cozinha. A garota de corpo pequeno e delicado estava debruçada sobre a mesa, olhando fixamente para o celular. Fez um sinal com a mão livre, chamando Namjoon para sentar-se também. Ele reparou no cabelo frizzado e acabou rindo de canto. Não importava quantos anos passasem, Minatozaki Sana continuaria com o mesmo jeito inocente e bobo da adolescência.

 - Joon, comprei lanche para nós. - ela começou a falar assim que largou o aparelho de lado. Naquele momento, o garoto já estava na metade do hambúrguer. - Como estava demorando, comi sozinha, desculpa. Você não avisou que hora chegaria...

 Ele não tinha hora exata para voltar. Lembrava-se do momento que avisou à prima, ela pedira para não se preocupar, enquanto se arrumava para sair. Sempre tão avoada. Devia estar pensando no encontro. Fazia alguns dia que ela se gabava de um encontro com um homem maravilhoso que conhecera pelo Instagram. Coincidentemente, Namjoon sabia quem era o homem, mas não disse nada à prima.

 - Está meio viajado. - ela resmungou, segurando o rosto nas mãos de um jeitinho engraçado. - Onde esteve?

 - Na praia. Encontrei um amigo. Assistiu o pôr-do-sol? Foi lindo hoje.

 - Ficou na praia das 16 horas até agora? Que suspeito.

 - Para a sua informação, estava apenas passeando. Andei grande parte da orla. Do centro até o norte. Acho que vou começar a ir mais vezes. É gostoso para ficar sozinho, olhar o céu, pensar...

 Sana conhecia o primo, e todo aquele papo naturalista era muito a cara dele. Namjoon tinha mania de escrever poemas, colecionava folhas... ele escondia este lado, atrás da máscara de um bom e velho nerd, amante de heróis e jogador de basquetebol. Ela conhecia sua infância difícil, e mesmo que tenham se afastado, a garota tinha certeza que algumas coisas ainda doíam nele.

 Não demorou para o homem largar o lanche.

 - E aí? Como foi aquele tal encontro?

 - Oh... - Sana tento esconder o rosto corado com as mangas do moletom. Ela achava engraçado como o primo perguntava de sua vida sem nenhuma timidez. Mas ela gostava. - Jungkook é uma graça. Quero dizer... ele não é como meus antigos namorados quando uso a palavra "graça". Ele é sim um pouco tímido e de poucas palavras, mas tem um jeito forte, um olhar firme... aah, estou ficando nervosa...

 Jeon Jungkook é um imprestável.

 Namjoon não diria isso à prima. Não daquela forma. Ele respeitaria os sentimentos da garota. Mesmo que sem fundamentos.

 - Não precisa me dar detalhes, Sana, apenas quero saber se ele te tratou bem. Você sabe, eu posso espancá-lo se quiser.

 - Namjoon você é o melhor primo do mundo. Mas não acho que será necessário, ele é um cavalheiro. E, sem querer te rebaixar, mas Jungkook é bem musculoso, não sei se você teria chance...

 - Ei!

-*-


 Carne seca.

 Namjoon via-se como um homem preso na adolescência. Não apenas ele, mas qualquer um que entrasse em seu quarto cheio de pôsteres, pelúcias, roupas e lixo. Lixo resumia-se aos pacotes vazios da marca favorita de tiras de carne seca de Kim. Era um vício que ele não conseguia largar. Desde àquela maldita viagem à Tailândia com o colégio, em que um colega oferecera seu lanche.

 Não era muito saboroso. Não para o seu paladar sensível, mas aquele gosto defumado e salgado era até relaxante. Ainda mais seguindo todo o ritual que envolvia abrir aquele pacote plástico.

  Após fechar a porta atrás de si, trocou sua roupa para uma mais confortável e quente, abandonando o primeiro conjunto em qualquer canto do quarto. Ligou o aquecedor, o computador, e se jogou na cama, logo cobrindo o rosto com um dos travesseiros.

 - Por que eu me destruo tanto? - perguntou a si mesmo, com a voz abafada.

 E antes que chorasse, abriu a gaveta do criado-mudo, tirando um pacote de carne seca de uma boa marca japonesa, que Sana sabia que ele amava.

 Entre um pedaço e outro, sua memória se revirava, trazendo à tona aqueles cabelos cor-de-rosa e o cheiro de mar. Park Jimin. O garoto tinha um olhar tão perdido, mas um sorriso gentil. Com aquela meia hora de contato, Namjoon sabia ser capaz de descrever cada detalhe da aparência única e liberta do garoto. Ainda que parecesse assustado, aflito, angustiado.

 Ele tinha uma vaga ideia do porquê.

 Largou a carne seca de lado e foi para a cadeira do computador, para novamente virar a noite trabalhando. Era uma rotina cansativa, mas o mantia financeiramente. Acordava cedo, arrumava a casa, lia as notícias, caminhava até o parque, almoçava, ia ao treino de basquete, e trabalhava até as três da manhã. Agora, passeio na praia estaria incluso nas tarefas diárias. Nada muito difícil, porém o problema na coluna de Namjoon o obrigava a fazer pausas e sua cabeça estava sempre latejando. Não é normal para alguém de sua idade, mas saúde era uma de suas últimas prioridades.

 Antes de conseguir checar os emails, precisou tomar seu remédio para dores. E mesmo com a cabeça doendo do jeito que estava, colocou os headphones para ouvir no último volume sua melhor playlist hip-hop.

 - O que me falta é amor próprio, certo? - resmungou, logo pegando de volta o pacote.

 Ao mesmo tempo que se considerava um homem sem sorte, Namjoon sabia que suas desgraças foram assinadas por si próprio. Ele podia estar em Seoul, com um garoto adorável e sonhador e um emprego melhor remunerado. Ou então em Busan, junto à mãe, ajudando na loja de artesanato que ela abrira assim que se mudou. Mas não. Estava em Donghae. Na costa oposta à capital. Em uma casa mofada na parte mais vazia da cidade, sem bar ou venda por perto. Digitalizava documentos e organizava o banco de dados virtual de uma pequena distribuidora de cosméticos, que vendia apenas para as cidades vizinhas. E ainda cuidava da prima.

 Sempre teve oportunidades de mudar sua vida, mas insistia naquele maldito lugar. Mas ele sabia o motivo. Ele sabia o que o prendia em Donghae. E mesmo que fosse difícil, ele aguentaria até o final.

 Não conseguindo se concentrar em nada na tela do computador, Kim deitou-se sobre o teclado, com a cabeça pulsando pelo som alto e preocupações desnecessárias. Sentindo um estranho cheiro de maresia, mesmo a quilômetros da costa, dormiu com a visão de um pequeno garoto caminhando lentamente na areia. Ao som de Wiz Khalifa.

-*-*-

eu amo o namjoon aaaaaaaa
ele tem uma história bastante enrolada na fic, então fiquem de olho nele rs

obrigada pelo apoio de vocês em sweet tears ♡

'Sweet Tears' também é publicado na plataforma Social Spirit, em minha conta @/nykluving . Link: https://www.spiritfanfiction.com/historia/sweet-tears--jimon-10351439

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