Capítulo Dezenove

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Quando você nasce, ninguém coloca a mão no seu ombro e diz: "Parabéns, amigão! Agora que você vai encontrar um mundo perfeito te esperando! Tome esse pudim e venha se divertir!". Pelo contrário. Nasce chorando (fruto da alucinante dor que é usar os pulmões pela primeira vez), de cabeça para baixo e ainda recebe um belo tapa na bunda.

 Mesmo assim, costumamos nos iludir uma vez ou outra com o mito da vida perfeita. Mas não se preocupe, a vida sempre aparece para te esbofetear e te acordar.

Não digo que a vida é horrível, apenas longe de ser perfeita. Quanto mais cedo nos acostumarmos com isso (olha que ironia), mais felizes seremos. Engraçado, não?

 Essa é uma das lições de vida mais valiosas que temos.

Outra lição interessante é a que recebemos quando estamos ainda na barriga das nossas mães. Naquele lugar quentinho, seguro, agradável, recebendo comida direto por um tubinho...

Apenas por nove meses!

Nove meses contados! Não importa o quanto você goste desse lugar, não importa que não queira sair. Nove meses depois você será arrastado de lá de dentro! O tempo não para quando você quer e a vida não espera por você.

E adivinha? Fora da barriga nós damos de cara com um mundo cheio de coisas legais e diferentes para conhecer, percebendo enfim que estávamos perdendo tempo dentro de nossas mães.

Com isso em mente, fui para a escola no dia seguinte.  A vida não vai parar porque estou infeliz.

A escola é boa para se distrair.

Nem quando estou na super movimentada firma do meu pai, estou em um lugar tão barulhento e cheio de vida que é a escola. Amigos rindo e conversando, um professor enchendo sua cabeça com matérias durante as aulas. Por alguns minutos, realmente esqueci por completo o mundo do lado de fora dos muros. Quando a Samaris insistia em aparecer na minha cabeça, apenas focava em qualquer outra coisa e desviava o pensamento. Até que dava certo, na maioria das vezes.

Foi durante a aula de sociologia que algo realmente prendeu a minha atenção:

— Família! — disse a professora, parando de frente para a classe. — Alguém pode me dizer o que significa "família"?

Silêncio e olhares curiosos entre os alunos:

— Como assim? — pergunta uma garota gordinha sentada na primeira fileira.

— O que estou perguntando — prossegue a professora. — É o que a família significa para vocês.

Mais silêncio. Sempre que isso ocorre, a professora acaba escolhendo alguém aleatoriamente para tentar responder a pergunta escabrosa.

— Diego? — apontando para um garoto de boné virado para trás, sentado na fileira encostada com a parede.

— Bem, professora... — ele parecia confuso. — Eu acho que até sei... Mas não consigo explicar, entende?

— Claro que não consegue. Aliás, nenhum de vocês consegue explicar. — disse se dirigindo à sala. — Por isso, quero que façam um trabalho sobre a família e o que ela representa. Valendo três pontos na média.

Imediatamente se iniciou o borbulho de alunos controversos reclamando.

— Não quero ouvir reclamações! Vocês irão fazer o trabalho em dupla, de um garoto e uma garota — completou dizendo. — Como um casal.

Abre a gaveta da escrivaninha e tira de dentro uma pequena caixa azul:

— Guardei dentro desta caixa um pedaço de papel com o nome de cada aluno homem da sala. As garotas virão até aqui, uma a uma, e sortearão o nome do seu par. As garotas que sobrarem podem fazer pares entre si.

"Uma a uma", as garotas foram colocando as mãos dentro das caixinhas com um ar tenso no rosto. Em seguida liam o papel, algumas com cara de alívio, outras ainda mais assustadas e outras certamente chegaram a fazer cara de nojo. Mas nada se compara quando a caixa chegou às mãos da Jéssica, a patricinha loira que me odeia com todas as forças desde aquele infeliz episódio da festa de aniversário. Ela pegou, apreensiva, um papelzinho, o desdobrou, leu, arregalou os olhos assustada e indignada antes de exclamar em voz alta:

— ÍCARO FERNANDES???

A VIDA DESENCAIXADA DE ICK FERNANDES (história completa)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora