Capítulo 16

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  Tenho que dizer que Will e eu ficamos amigos durante a semana seguinte, à custa do cartãode crédito do papai. Pedimos livros primeiro, porque eu era um estudante sério agora. Livros detexto, mas romances também, e versões em Braille para Will. Era muito legal vê-lo ler com asmãos. Compramos móveis e um rádio por satélite para o quarto de Will. Ele tentou dizer quenão deveríamos gastar tanto, mas não discutiu com muita insistência. 

Contei tudo a Will sobre Kendra e a maldição. 

– Ridículo – disse ele. – Não existem bruxas. Deve ser uma doença. 

– Isso é porque você não pode me ver, se você pudesse acreditaria em bruxas, Disse a ele oquanto precisava encontrar um amor verdadeiro para romper a maldição. Mesmo que aindadissesse que não, eu acho que finalmente eu começou a acreditar. 

– Escolhi um livro que você vai gostar – Will sinalizou para a mesa. Peguei o livro, OCorcunda de Notre– Dame. 

– Você está maluco? Isso tem, o que? Quinhentas páginas. 

Will se encolheu de ombros.

– Eu dei uma olhada. Tem muita ação. Se você não for suficientemente inteligente para lê-lo,então vamos procurar outra coisa. 

Mas eu o li. As horas e os dias passavam e eu lia. Eu gostava de ler nos quartos do quintoandar. Tinha um sofá antigo que empurrei até a janela. Ficava sentado durante horas, algumasvezes lendo, outras observando as pessoas a caminho da estação de metrô ou fazendo compras, aspessoas da minha idade indo a escola ou gazeando. Eu sentia como se conhecesse todos. 

Mas também lia sobre o Quasimodo, o corcunda, que vivia na catedral de Notre– Dame. Éclaro, eu sabia por que Will tinha sugerido o livro, porque Quasimodo era como eu, encarceradolonge de todos. E no meu quarto do quinto andar, olhando por cima da cidade, eu me sentiacomo ele. Quasimodo observava os parisianos e uma bela garota cigana, Esmeralda, que dançavaembaixo, longe dele. Eu observava o Brooklyn. 

– Esse autor, Victor Hugo, deve ter sido um cara divertido – disse a Will em uma de nossasaulas. – Eu acho que eu gostaria de ir com ele a uma festa. Eu estava sendo sarcástico. O livro eraabsolutamente deprimente, como se o autor odiasse as pessoas. 

– Ele era subversivo – disse Will. 

– Por que? Porque fez que a cura fosse ruim, e que o feio fosse o bom? – Isso é parte daquestão. Olha, você está pronto suficientemente para ler este livro tão longo. 

– Não é um livro difícil – eu sabia o que Will estava tentando fazer – me animar a ler algomais difícil ainda. Mesmo assim, eu sorri para mim mesmo. Nunca tinha me consideradointeligente. Alguns dos meus professores diziam que eu era, mas que não tinha boas qualificaçõesporque não me – esforçava– muito, uma dessas coisas que dizem os professores e que criamproblemas com seus pais. Mas talvez fosse verdade. Me perguntei se talvez ser feio me fizessemais inteligente. Will dizia que quando as pessoas são cegas, os outros sentidos – como a audiçãoe o paladar – ficam mais fortes para compensar. Será possível que eu seja mais inteligente paracompensar a minha monstruosidade? 

Normalmente, eu lia pelas manhãs e conversávamos pela tarde. Will me chamava por voltadas onze. 

Um sábado, ele não me chamou. Eu não me deu conta no princípio porque estava lendo umaparte importante do livro, onde Quasimodo resgata Esmeralda da execução, depois a leva acatedral gritando – Santuário! Santuário! – Mas mesmo Quasimodo resgatando Esmeralda, elanem sequer pôde olhá-lo. Ele era muito feio. 

Falando em depressão! Ouvi o relógio marcando doze. Decidi descer.

– Levanta, Will! Esse é o momento de adquirir sabedoria! 

A feraحيث تعيش القصص. اكتشف الآن