Capítulo 3 - Segredos

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O impacto fez nossos corpos serem arremessados pra dentro da mata. Caímos rolando durante algum tempo até finalmente parar já em terra plana e firme, por debaixo das folhas. Tentei me mexer, vivo, sentindo que até respirar doía. Mesmo com o fardamento tendo amortecido a queda, não fiquei totalmente imune de me ralar completamente entre pedras e uma generosa distância alta de onde estávamos. Rolei o corpo para o lado e percebi que Guilherme estava desacordado com um filete de sangue escorrendo de seu rosto. Nossos corpos estavam cheios de fuligem, folhas e suor.

"Carvalho?", tentei falar, um pouco confuso ainda pela queda, mexendo em seu corpo. Chacoalhei-o até que ele se mexeu, esboçando uma cara de dor terrível.

Minhas mãos estavam ensangüentadas, mas o sangue não era meu e isso me desesperou. Além disso, a chuva estava caindo cada vez mais forte e havíamos nos perdido dos outros.

"Carvalho, não se mexe, não se mexe", fui abrindo meu uniforme e tirei a camisa branca por dentro dele, dobrando-a rapidamente para enrolar o ferimento em sua perna numa tentativa de estancar o sangramento. Tirei uma adaga alocada em meu coturno pra dividir a camisa e enrolar a outra parte em seu braço, onde a outra bala pegou. Pressionei firme e chequei se ele estava acordado.

"Bá, caralho! Filho da puta, filho da puta!", Guilherme repetia sem parar sentindo seu corpo queimar. Olhei ao redor tentando buscar um abrigo pra chuva, porque seu corpo estava ficando quente.

"Vamos nos proteger ali", apontei para uma árvore maior com uma copa razoavelmente boa pra gente se escorar por um tempo, então, passei o braço ao redor de seus ombros e com a mão livre o impulsionei pelo quadril para que se levantasse. Ajudei-o a deitar debaixo da árvore tentando amontoar o máximo de folhas possível em busca de algum conforto em momento tão complicado. Guilherme gemia constantemente de dor entre caras e bocas que me fizeram entrar em desespero. "Vai dar tudo certo, ok? Força, Soldado", cuspi um pouco da água excessiva, limpando o rosto úmido na manga do uniforme camuflado. Por fim, tentei acionar o pelotão pelo rádio, levantando a bússola pra tentar nos localizar. Conforme foi escurecendo e pude ver as primeiras constelações, tive uma melhor coordenada para guiá-los até nós.

Cansado, sentei-me ao lado de Guilherme, apreensivo, sem saber exatamente o que fazer, como consolá-lo naquele momento de dor, ou agradecê-lo – só pra variar – por ter me salvado de novo.

"Eles tão vindo, vai dar tudo certo... Você só precisa segurar firme", passei o braço por seus ombros novamente e senti seu corpo ficando gelado. Guilherme estava pálido e meio mole, e aquilo não era bom sinal. "Guilherme? Você tá me ouvindo, cara?", dei uma espiada na chuva que não cessava, ele deveria estar com frio, e ainda não havia nem sinal do pelotão.

Então, me deitei junto a ele em um ato de desespero, como fazemos pra nos proteger do frio no treinamento militar, e o abracei firme contra meu corpo. Meu coração batia forte contra meu peito enquanto me senti estranho em senti-lo, tão forte, austero, por baixo do meu toque firme. Nossos corpos tremiam com o frio excessivo e a exposição, além do terrorismo psicológico e emocional que vínhamos vivenciando nesses últimos quase seis meses.

Sentindo seu cheiro – que era muito bom, por sinal – e sua musculatura firme, tentei mantê-lo aquecido e acordado até a chegada do socorro, repetindo constantemente em seu ouvido: "Vai ficar tudo bem".

Era madrugada quando senti as lanternas se aproximando cautelosamente. Afastei-me de imediato do soldado e fiz sinal para os demais, que numa atuação impecável me ajudaram a carregá-lo até o veículo.

O retorno para a base foi silencioso; todos pareciam tão desolados quanto eu. Guilherme e eu fomos deslocados a ala médica do acampamento. Ele foi direto pra emergência; eu fui atendido através de exames clínicos e físicos normais. Por sorte estava tudo bem comigo, não havia passado de algumas escoriações.

Por Trás da Farda (Romance Gay)Where stories live. Discover now