14-Mente consumida

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Simplesmente não conseguia parar de pensar nos pesadelos que tive recentemente, eles me tomavam a mente e me confundiam, me faziam sentir acuada e perseguida, e eu estava, estava sendo perseguida por mim mesma, por algo dentro de mim que que não compreendia e tinha medo de compreender, eram tantas sensações se misturando e uma angustia horrível dentro de mim que me travava a garganta e desritmava meu coração, eu pensei em outras coisas, tentei mudar o curso dos meus pensamentos, mas eles estavam naquele objetivo, nada me destravava. Eu não conseguia dormir e na verdade tinha medo de fechar os olhos, medo do que minha mente projetaria, mas por fim acabei ardendo, outro sonho terrível, mas dessa vez eu estava mais presa à cena, mais uma vez lá estava uma versão bem mais jovem de mim correndo de um homem, um homem sem rosto e amedrontador talvez por esta mesma razão, por não possuir uma identidade. O homem sem rosto me alcançou e o lindo dia de sol se tornou em trevas, ele me arrastava com a mão em minha boca para que eu não pudesse gritar, eu me debatia tentando me libertar, mas não conseguia, aquele homem me jogou no chão e então eu escutei a frase que fez meu coração tremer: " Não fale nada, se não vai magoar a mamãe". Eu acordei, acordei suando e chorando desesperadamente, lá estava eu naquela sala sozinha, e quando percebi isso desabei, um flashback pairou sobre a minha mente, eu sabia quem era o homem é o que ele queria, estava claro e as lembranças me aterrorizaram naquele momento, foi tanto tempo sem pensar nisso, tanto esforço que parecia que tudo o que aconteceu correspondia a uma vida paralela , como se a pessoa que passou por aquilo tudo não fosse eu, e por muito tempo eu tratei dessa forma, mas agora estava tudo diante de mim, inquestionavelmente na minha frente, e eu não podia sacudir a cabeça pra esses pensamentos sumirem porque eram uma verdade e não sumiriam, na cessasse estiveram lá o tempo todo porém oprimidos por alguém que queria fugir de si mesma e de seus próprios problemas, alguém que temia lutar contra si mesma. Eu entrei em um grande impasse, uma luta, a minha fragilidade contra minha vontade de seguir em frente, meu humanismo contra minha força, o que eu deveria fazer ? Qual caminho escolher? Estava tudo muito turvo entre minhas lágrimas que pareciam uma chuva, ou algo mais como uma grande tempestade depois de dias de sol. Tudo até agora foi uma mentira que eu mesma criei e arquitetei para me sentir maior do que todas as coisas que eu tinha passado até ali, o que sou é apenas a má formação de um humanismo ridículo cheio de piedade própria e enganação . É isso que fiz em toda minha vida, criei uma cúpula de mentiras e enganação eu só me prejudicava e que eu tentava me fazer acreditar de que aquilo estava sendo autista de minha parte, que eu estava sendo alguém melhor, mas tudo o que eu conseguia ser é cúmplice de tudo o que já me fez mal, eu sou a cúmplice porque eu nunca fiz nada para mudar a situação em que me encontrava.
O que deveria fazer ? Cada escolha seria sem volta, eu tinha que definir o que eu queria, o que eu queria ser naquele momento e com o que eu iria romper em minha vida, mas de qualquer forma minha vida não seria mais um lindo raio de sol. Ou será que eu poderia construir uma cúpula ainda maior e mais forte à minha volta é transformar essa minha doença de síndrome de "salvadora" se agravar tanto que eu consiga fingir que nada aconteceu é que sou maior que meu passado e que tudo seria uma vida paralela à minha que eu jamais passei e nem precisarei acessar essa gaveta cheia da minha podridão e vergonha dentro, ela seria esquecida, mesmo que fosse mais que uma gaveta, mesmo que fosse um grande armário repleto de imundície, eu não precisaria acessa-lo nunca mais se eu não quisesse, era uma questão de controle próprio, e eu sempre fui boa nisso, muito bem disciplinada na arte do silêncio, talvez não fosse tão difícil voltar para minha vida, simplesmente voltar ao que eu era sem precisar me lembrar e recordar de nada disso, quem sabe dê certo. Aquele fio de esperança surgiu e me fez ter vontade de me agarrar o mais forte possível a ele, tão forte que nada pudesse nos separar, eu não tinha que ser um monstro, não tinha que me tornar algo que não me orgulho, não, u não tinha que fazer isso, é uma questão de escolha e nenhuma seria fácil.
Agora eu tinha três opções a minha frente e mesmo tentando enxerga-las com clareza era muito difícil com os sons dos fantasmas na minha mente ficando cada vez mais alto e mais alto me fazendo chegar ao ponto de chorar histericamente e balançar minha cabeça com vigor, puxando meus cabelos com os dedos. Estava me enlouquecendo, todas aquelas vozes, diferentes opções dentro de mim, como se fossem várias personalidades reunidas e discutindo a plenos pulmões o que estaria por vir e quem teria razão.
A meu Deus quantos gritos "calem a boca" eu gritava dento da minha mente "chega!" Eu não estava mais aguentando tantas coisas em minha mente rodando, de um lado tudo poderia ser o que era antes, uma vida normal e tranquila, de outro um grito que dizia "realidade " nada mais seria o mesmo, como poderia ser? Tudo mudaria dentro de mim porque já estava mudando, porque já está mudado, porque eu vi e ouvi de mais, porque eu participei do que eu não imaginava, porque era de mais para qualquer um, mas nada me impedia de sair por aquela porta e fazer tratamento terapêutico para superar e adquirir uma nova versão de mim e me manter no que eu acreditava ser quem eu sou. Devo admitir que isso soava mais real mesmo, soava mais verdadeiro, no fundo eu sabia que seria assim, que tudo aquilo que passei foi demais para mim, ou para qualquer um, mas mesmo assim não era a voz que batia p martelo, uma voz obscura também gritava dentro de mim, um grito que eu temia e considerava quase demoníaco, mas ao mesmo tempo tão coerente que não poderia ser simplesmente ignorado. Ele me dizia que em todo este tempo fui fraca e mentirosa comigo mesmo, que não ser honesta comigo mesma foi meu maior erro e que nada seria igual, porque eu não esqueceria essas marcas, porque só eu senti dor, apenas eu , apenas eu sofri, e fiz um favor ao monstro que me trouxe a dor quando fingi que nada tinha acontecido, e que eu estava prestes a refazer meu erro, era uma oportunidade única de me redimir comigo mesma, de me olhar com felicidade e não mais com nojo, de recuperar as coisas boas que quase não existiam dentro de mim com relação á minha pessoa. Aquela voz dizia que talvez eu saísse por aquela porta e fingisse mais uma vez que estava tudo bem, mas aquilo que eu vivi sempre voltaria para me assombrar, porque nunca foi encerrado e porque os lembretes sempre estariam lá, porque a impunidade que eu mesma permiti ainda estaria lá e que tudo o que que passei foi minha culpa, e eu só me libertaria por mim mesma, nada nem ninguém poderia me ajudar, apenas eu, e francamente, fui fraca por tanto tempo, e ainda estava sendo, que eu não sabia nem mesmo como me libertar ao certo, por mais que a voz que ecoava dentro de mim soubesse bem o que fazer, e como se libertar e cortar as cordas que eu mesma coloquei em mim, só eu poderia me salvar, só eu poderia me libertar.

Eu me sentei no chão e fiquei encarando o piso enquanto olhava para as três janelas, as três saídas na minha frente , eu as encarava e tentava enxergar através delas, o que viria depois de cada escolha, o que viria após cada passo dado e se a teoria daria certo na prática. Eram muitas dúvidas rondando minha mente e me deixando maluca, eu passava meus dedos por entre a raiz de meu cabelo tentando entender e encaixar as peças de meu futuro em cada hipótese, e o que me impressionava mais era minha hipocrisia, esta hipocrisia com a qual tinha vivido até agora, falar sempre para suas amigas serem fortes e não terem medo e enfrentarem os problemas quando eu mesma não fazia isso e fugia constantemente dos meus medos e problemas maiores agindo como se nada estivesse acontecendo para manter uma vida que eu enxerga e considerava "normal", assim eu poderia me convencer de que apesar dos altos e baixos eu era feliz, e não eu não era feliz, eu apenas varria a bagunça para baixo do tapete o tempo todo, e talvez esse fosse o momento de fazer uma grande limpeza geral, uma boa higiene  para não deixar vestígios de toda a podridão que eu sempre insisti em esconder, aquele poderia ser o momento de ser alguém mais forte e mais dona de mim, mais poderosa e mais corajosa e então eu seria aquilo que eu sempre motivei minhas amigas a serem, mulheres fortes e donas de sua própria vida. Era a decisão que parecia mais inteligente naquele momento, ser alguém acima do esperado, me superar propriamente dizendo, talvez Ryan tivesse razão, talvez eu tivesse em mim defeitos que precisassem ser corrigidos imediatamente, antes que eu me perdesse totalmente neles, não posse permitir que algo me torne menor ou mais fraca, não posso permitir que lembranças me aprisionem, que sejam uma arma contra mim, algo que possa ser usado contra mim, não eu era mais que isso, eu tinha mais que isso.

Em contra ponto eu imaginava onde estaria a Lizi depois de tudo, onde estaria a pessoa que eu acreditava que de alguma forma estava no caminho certo? onde eu estaria depois de tudo isso? Eu não seria mais a Lizi, seria alguém diferente, isso me mudaria, mas será que isso era algo ruim? Talvez deixar de ser a Lizi não fosse tão ruim quanto parece, talvez fosse simplesmente uma evolução necessária, algo que me impulsionaria. Quem disse que seria algo ruim? porque eu ainda tentava me convencer disso? Talvez fosse meu lado moralista que ainda queria ser alimentado pormenor ilusões de um mundo melhor construído pelas mãos da omissão, porque foi isso é nada mau que eu passei em toda minha vida, uma sequência de omissões continuas. Agora eu queria mais de mim mesma e para minha vida, mais do que apenas ter que estar a todo tempo compreendendo os outros e sofrendo as consequências de ser muito sensível, está sensibilidade era o que definitivamente estava me matando e me conduzindo a ser o que eu não queria mais. Era isso, eu não queria mais ser aquela pessoa, não, simplesmente não dava mais para continuar me olhando no espelho e vendo uma fraca, uma caída, uma desesperada que não tem opinião, que não tem punho para fazer os sacrifícios necessários para se erguer e vencer, a vida é feita de sacrifícios e temos que estar prontos para abraçá-los e fazê-los . Eu devia fazer uma escolha, abraçá-la e me manter firme nela até o fim, chega de ser a Lizi fraca de sempre.

A mulher perfeita Where stories live. Discover now