"Aquilo que nunca fui..."

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"Que resposta é que precisavas? Eu já não estou a perceber nada..." E a verdade é que não estava mesmo. 

"Tu ainda consideras tomar estas merdas. Mesmo à minha frente, tu consideras essa hipótese. Mesmo depois de duas semanas sem eles continuas com vontade. Se eu não me tivesse apercebido do que tu andavas a fazer a ti própria, não sei onde é que isso ia parar..." Virou-me as costas e foi mandar pela sanita os últimos dois que tinha guardado. 

Não consigo evitar sentir este peso absurdo na consciência por ter considerado ainda tomar um. Ele tem razão... eu estava disposta a tomá-lo mesmo à sua frente, com ele a ver. Eu estava disposta a quebrar o nosso acordo mesmo debaixo do seu nariz. Ele voltou. 

"Desculpa... é só que... é mais forte do que eu." Mesmo contra a minha vontade deixei escapar uma, e apenas uma lágrima. 

"Não precisas de chorar, New York girl... Eu sei que é mais forte que tu." Abraçou-me, e isso fez-me sentir melhor quase de imediato. "Eu sei que a culpa não é tua, e que não eras tu a falar ponderaste tomar um. Está tudo bem agora. Eu prometo que daqui a uns tempo nem te vais lembrar da existência daquilo, está bem? Vai ser como se nunca tivesse acontecido. Eu prometo." A sua voz sussurrada no meu ouvido deixa-me mais calma do que qualquer comprimido que eu possa tomar na vida. "Queres dormir?" 

"Não..." 

"Tens fome?" 

"Não." 

"Frio?" 

"Não." 

"Estás cansada?" 

"Mais ou menos." 

"Nervosa?" 

"Não." Chega a comover-me a forma como se preocupa comigo. Nunca, na minha vida inteira, ninguém se tinha preocupado comigo assim.

"Então se calhar o melhor é descansares enquanto eu vou tentar não explodir a cozinha a fazer o almoço." Soltei uma risada, que ele me roubou propositadamente. 

"Queres que eu o faça?"

"Não, eu faço. Desde que gostes de omelete." Riu-se. 

"Gosto." 

"Então dorme... logo à tarde vai ser complicado, vais preencher papelada atrás de papelada por causa da transferência de escola." 

"Sobre isso..." Levantei-me da cama e apanhei as minhas calças que estavam espalhadas no chão. Tirei do bolso das mesmas os papéis que encontrei em cima da mesa. "O meu pai foi-nos bastante útil..." Sorri, entregando-lhe os papéis.

"Isto é o quê?" Franziu a testa. 

"Lê." 

"Di... isto é...?" Não concluiu a pergunta, ficou à espera que eu confirmasse os seus pensamentos.

"A autorização de transferência para entregar na escola, sem precisar de mais nada do meu antigo colégio." 

"Miúda... tu és alguma coisa de outro mundo. Como é que conseguiste isto?" 

"Estavam em cima da mesa da sala, simplesmente." Encolhi os ombros. 

"Então, vá! Vamos! Do que é que estás à espera? Veste-te! Vamos já à escola e deixamos tudo resolvido!" O seu entusiasmo é contagiante. Vesti-me tão rápido quanto possível, saímos de casa, ele pegou-me na mão e foi-me levando, por aqui e por ali, sem eu saber muito bem por onde. "No meu bairro também há uma escola... mas não te quero lá. Por isso vou mostrar-te uma que fica numa das saídas do metro por onde eu passo para ir para o trabalho, o bairro é melhor... e escola tem melhor aspeto. Também dá para ir a pé se for preciso, não é muito longe." Andámos durante cerca de 30 minutos até chegarmos em frente ao edifício que será a minha nova escola. "Queres que eu entre contigo ou vais sozinha?" 

Outro copo de amor, por favor (#wattys2016)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora