"Pessoa errada"

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Eu não acredito que já passaram 5 dias e não sei nada dela. Eu vou dar em maluco! Saio mais cedo todas as manhãs para ir para a frente da porta do seu prédio antes de ir para o trabalho, apanho o metro que ele devia apanhar para ir para as aulas, fico em frente à entrada do colégio todas as manhãs até ouvir a campainha, e quando saio do trabalho vou para lá de novo até que o segurança fecha a porta e apaga as luzes. Já perguntei por ela a esse segurança e a resposta é sempre a mesma: A política de privacidade do colégio não me permite revelar detalhes sobre nenhum dos nossos alunos. Oh por amor de Deus! Antes de ser aluna daquela merda de colégio ela é a minha New York girl! Eu tenho o direito de saber onde ela está.

Não durmo mais do que duas horas por noite desde que ela "desapareceu", os ataques de pânico são pegados uns nos outros, aliás eu acho que estou a viver em pânico constante. As minhas mãos pura e simplesmente não param de tremer, nem por um segundo. Hoje o meu patrão até perguntou se eu precisava de ir para casa mais cedo porque não estava com boa cara... diz que pareço doente, e que talvez devesse ir ao médico. Mas é claro que estou doente! Ela evaporou-se da minha vida de um momento para o outro! Parece que faça eu o que fizer nunca vou conseguir encontrá-la... desapareceu sem deixar rasto. 

Já me passou pela cabeça que ela pudesse mesmo estar desaparecida. Acho que estou a ficar paranóico, porque ontem passei pela esquadra da polícia para perguntar se havia alguém na lista de desaparecimentos com o nome de Diane Anderson, mas não... e ainda assim isso deixou-me um pouco mais tranquilo... quer dizer, com a merda de família que ela tem não me admirava que ele desaparecesse e ninguém desse por nada. 

E agora aqui estou eu, parado, pela primeira vez em cinco dias não estou a fazer nada. Não estou a mandar mensagens, não estou a tentar ligar, não estou a andar como um louco perdido pelas ruas, guiado pela esperança irrealista de encontrar por mero acaso, não estou à porta do seu prédio e nem em na entrada do colégio... As minhas forças esgotaram-se. E o stock de whisky do meu armário também... Tenho um maço extra, dentro da gaveta da secretária, mas não quero quebrar a promessa. Eu sei que mesmo que eu fumasse o maço inteiro agora ela não ia sequer sonhar, mas ia pesar uma tonelada na minha consciência. Nós fizemos um acordo, uma promessa mutua, e promessas mutuas são como uma corda embebida em álcool que está a ser segurada nas duas pontas e com fogo por baixo. Se alguém largar a ponta, a corda caí no fogo, incendeia-se e depois disso há duas opções possíveis, a primeira é que quem segura a outra ponta não larga, e acaba por se queimar, e a segunda é que quem segura a outra ponta larga, e a corda arde por completo, deixando apenas cinzas, e quando não passa de cinzas, o acordo morreu e eu não quero que o acordo morra, e nem quero que ela se queime. 

Ri-me sozinho, deitado de costas da minha cama, por estar com estes pensamentos filosóficos... filosofias de um inglês perturbado e podre de bêbedo com os últimos copos de whisky que existiam na sua última garrafa... e nem sequer era escocês... mas o que é que isso interessa, não o quero para saborear, só o quero para anestesiar e até que tem estado a resultar nas últimas horas. 

O perfume dela já se evaporou dos meus lençóis... infelizmente. Não vejo a hora de a ter aqui de novo... se é que a vou ter aqui de novo alguma vez... se é que vou voltar a vê-la algum dia na minha vida... Quando penso que posso nunca mais voltar a tê-la toda aquela vida com sentido que criei na minha imaginação enquanto estivemos juntos desaparece, e sinto que estou a voltar ao ciclo infindável da filosofia "Viver para não morrer"... Volto a rir-me de mim próprio porque chega a ser ridícula a forma como as minhas mãos não param de tremer. 

O escuro da minha casa engole-me. O silêncio de tudo, menos da rua, enlouquece-me. O frio apodera-se do meu corpo como se eu fosse um bloco de gelo. A consciência de estar inconsciente do que está a acontecer com ela neste momento deixa-me com os nervos, ainda mais, à flor da pele. A solidão esmaga-me por completo. Quando estou no limbo entre a consciência e o sono, o meu cérebro prega-me partidas e oiço a sua voz ao longe, mas tudo não passa do início de um sonho que me conforta por alguns momentos. 

Outro copo de amor, por favor (#wattys2016)Where stories live. Discover now