VI

11.1K 990 256
                                    

Mais alguns dias se passaram e Bela não teve contato com a fera. Era o final da sua terceira semana no castelo. Depois de um tempo, o único ser que ali habitava com quem Bela tinha contato era o mordomo. Em uma tarde, arrumando os aposentos de Bela, e remoído pela curiosidade, o mordomo foi indiscreto e perguntou:

— O que ainda faz aqui, Srta. Bela? É uma mulher livre. Pode ir embora à hora que quiser. Deveria agradecer por esse privilégio e partir sem demoras.

— Eu vou embora logo. – Bela respondeu com a mesma entonação de voz usada pelo mordomo – Deixe-me ao menos aproveitar mais um pouco o conforto dessa alcova e a qualidade da comida.

— Se é assim que deseja, senhorita...

O mordomo deixou a frase parada no ar, encarando Bela, perplexo. Depois se retirou para outros afazeres. A verdade é que Bela tinha um plano em mente e estava reunindo coragem para realizá-lo. Precisaria mesmo de muita coragem para encarar a fera, principal alvo do seu plano.

A noite chegou, rápida e silenciosamente. Era quase madrugada quando Bela decidiu sair para sua aventura. Ela colocou o vestido mais coberto que tinha e correu em direção ao último andar do castelo. Sim! Era nesse andar que ficavam os aposentos da fera. Seria uma boa decisão? Bela achou melhor não refletir sobre esse ato.

No entanto, para a surpresa de Bela, a fera estava acompanhada por alguém, conversando aborrecido aos berros. Bela identificou a outra voz que falava pouco a princípio, era o mordomo. A jovem moça aproximou-se da porta do que achava ser a alcova da fera e ficou ouvindo a conversa, à surdina, quando percebeu que falavam dela. Não fez por mal, mas precisava saber se ainda corria perigo.

— Eu não entendo, senhor. A jovem ainda não foi embora. Acho que ela pretende ficar. – disse o mordomo.

— Pretende ficar para fazer o quê? Para me torturar? – a fera rosnou, enfurecida, e quebrou alguma coisa que parecia ser um vaso.

— Senhor, se me permite um conselho...

— Não! – e rugiu como um leão.

— Sir. Dominic, na condição de seu tutor, e não de seu prisioneiro ou mordomo, eu vou lhe dar um conselho que há muito deveria ter lhe dado!

A fera rugiu novamente e quebrou mais coisas.

— Pare de quebrar sua mobília! Desde que nasceu eu permiti que tomasse todas as decisões erradas. Permiti por obediência, lealdade e dever. Permiti para lhe agradar! Permiti pela promessa que fiz aos seus pais! O senhor nunca me ouviu, mas agora vai ouvir, nem que eu morra para ser ouvido.

— Então o que tem de tão importante para me falar que nunca tenha dito antes?

— Está tudo errado. As coisas não deveriam ser assim.

— E eu já não sei disso? Eu sou uma aberração, não um homem. Você acha mesmo que alguma mulher vai se apaixonar por mim e se casar comigo por livre e espontânea vontade? – a fera gargalhou, e a Bela, que ouvia do outro lado da porta, sentiu vontade de rir daquela gargalhada que parecia um engasgo, mas se controlou.

— Então, para alcançar tal amor, o senhor vem aprisionando jovens há anos. Qual o resultado? Nenhuma delas quis se casar, ou sequer gostaram do senhor.

— Eu já aceitei meu destino, Elliot. Não há nada nem ninguém que o possa mudar. – a fera estava triste.

— O senhor sempre quis forçar moças a acatarem as suas ordens. O amor não se toma, o amor se constrói, se conquista.

— Eu nunca precisei conquistar nenhuma mulher para ter o que eu queria, para satisfazer as minhas necessidades.

— O resultado é esta cruz que carrega. Se pensasse em agradar uma mulher...

A Bela e A FeraOnde as histórias ganham vida. Descobre agora