I

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Era chegada a data de partida do pai de Bela, Emma e Grace para mais uma viagem. Ele prometeu voltar antes de sua filha caçula ser apresentada à sociedade, o que ocorreria no final daquele verão, dali a dois meses, em um caloroso baile de debutantes. Aliás, esse baile era o assunto do momento. As jovens donzelas estavam eufóricas para conhecer os possíveis futuros maridos e não paravam de fantasiar sobre esse acontecimento não tão distante. E mesmo sob as lágrimas de Grace, pedindo para que o pai viajasse somente após o baile, o Sr. Carter precisava partir. Tinha negócios urgentes para resolver em Londres. Antes de ir embora, perguntou às filhas o que estas gostariam que ele lhe trouxesse da viagem. Ele lhes daria qualquer presente.

— Oh, papai! – gritou Grace de alegria, batendo palmas e abandonando as lágrimas – Quero um colar de pedras preciosas para usar no baile de debutantes! Eu não sairei daquele baile sem o melhor pretendente. Não quero ficar mal falada como a Bela.

Grace nunca perdia a chance de colocar o dedo na ferida para fazê-la sangrar novamente.

— Grace! – o pai a repreendeu – Cuidado com a forma como fala da sua irmã.

— Papai, não brigue comigo! Às vezes penso que não quer ver nenhuma filha casada. É por isso que não obriga Emma a noivar e não se importa com a péssima reputação da Bela. Semana passada a Charlotte me disse que ouviu o seu irmão conversando com um amigo a respeito da Bela. Ele queria saber se ela cobrava para dormir com ele.

— Grace! – o pai gritou furioso – Já chega! Eu não quero ouvir suas histórias bobas. A sua irmã não é uma concubina. Ela é uma boa filha e uma boa irmã. Merece respeito. Eu quero que todas vocês se casem algum dia, mas não vou admitir que mais uma filha caia nas lábias de um canalha como aquele que se aproveitou da inocência da Bela.

— Como se ela tivesse sido inocente! – Grace resmungou – Bela sabia muito bem o que estava fazendo e quais as consequências dos seus atos.

— Eu disse que já chega, Grace! Por que você sente tanto prazer em depreciar e culpar a sua irmã pelo que houve?

— Eu aposto que se eu me deitasse com um homem sem ser casada com ele seria gravemente punida pelo senhor. Mas quando Bela, a sua filha preferida, se deitou com o Coronel Lorde Crawford, o senhor passou a mão na cabeça dela!

— Grace, o papai disse que já chega! – gritou Emma, intrometendo-se – E ninguém nesta casa pronuncia o nome do canalha! Estou feliz por Bela não estar aqui ouvindo as suas baboseiras.

Grace respirou fundo e revirou os olhos. O Sr. Carter, apesar de constrangido pela discussão que teve com a filha, ignorou o ocorrido e perguntou à Emma o que ela queria de presente da viagem.

— Não quero nada muito chique e caro como a Grace. Traga-me algum tecido bonito para que eu costure um vestido para mim. Estarei satisfeita com isso.

— Oh, a humilde Emma! – debochou Grace – Só falta agora a Bela aparecer e dizer que quer uma flor de presente, já que na viagem passada ela pediu uma pedra.

— Obrigada pela ideia, Grace! – disse Bela, sorridente, aparecendo de repente na sala de estar – É isso que eu quero, meu pai. Mas dessa vez serei exigente. Não quero qualquer flor, quero uma rosa. Uma rosa bem vermelha.

Uma rosa bem vermelha? Você chama isso de exigência? Há rosas em qualquer jardim desse vilarejo. – a irmã gargalhou.

— Grace, nosso pai não é nosso empregado. Ele passa dias cansativos viajando em uma carruagem comprando e vendendo mercadorias para nos sustentar. Eu não vou lhe dar o trabalho de ter que ir até uma joalheria só para comprar um colar de pedras preciosas, que provavelmente ele ainda terá que escolher no mostruário e mandar encomendar. Eu ouvia o que conversavam antes de aparecer.

— Oh, a piedosa Bela! Por que você e Grace não se tornam freiras e vão morar em um convento? – Grace arqueou uma sobrancelha e depois cobriu a boca com uma mão, expressando surpresa – Ah, eu me esqueci! Bela não pode virar freira porque não é mais uma donzela. Talvez você devesse experimentar algum bordel como moradia.

— O que você disse, Grace?! Eu quero que respeite a sua irmã! – o Sr. Carter gritou e avançou furioso em direção à filha, mas Bela, Emma e a tia Eliza, que também entrara na sala há poucos segundos, o impediram de cometer algo de que pudesse se arrepender. Grace era só uma garota tola, não merecia ser agredida.

Quando os ânimos se acalmaram, o Sr. Carter partiu, mas seu coração estava em pedaços. O motivo de tamanha dor não era a viagem em si, mas como as coisas estavam perdidas desde a morte da esposa. A Sra. Carter sabia controlar a língua ferina de Grace e não desprezava Bela nem Emma. Apesar das diferenças entre as irmãs, dos temperamentos difíceis e do acontecimento passado que manchou a reputação de Bela perante a sociedade, a Sra. Carter amava as filhas genuinamente e igualmente, e conversava com as garotas na condição de mãe e mulher.

O Sr. Carter, a cada dia que passava, gostava menos de Grace e tinha pena da sua filha preferida. Quanto à Emma, seu maior medo era que ela se tornasse mal falada e ficasse para titia, já que parecia indisposta a aceitar qualquer pedido de casamento. Ele também temia que Grace,que ia ser apresentada à sociedade pela cunhada Eliza, fosse reprovada. Eliza, no passado, teve a mesma desgraça de Bela em sua vida. Foi enganada por um homem e arruinada para sempre. Sobrou a ela ser uma tia solteirona e mal vista. Como fazia falta a Sra. Carter na vida do seu viúvo e das suas filhas!

A Bela e A FeraOnde as histórias ganham vida. Descobre agora