Andei depressa até à porta de saída e mal coloquei um pé no exterior, bati a porta com a maior força possível, quase como se ela se fosse partir. Dei um pontapé com força numa pedra que bateu num poste e fui para o meu carro. Dei um murro no volante

A minha respiração estava acelerada e eu sabia que se não parasse por uns minutos, algo de grave iria acontecer. Então deixei-me estar parado e assim que me acalmei, conduzi. Entrei com o carro pela floresta a dentro até ao local onde estava o esconderijo. Ainda não lá tinha ido desde que tivera sido destruído. Mostrava indícios de ter sido queimado.

Saí do carro e caminhei até aos escombros. Não restava nada, absolutamente nada. Estava tudo destruído, que era o que o Matt queria fazer comigo e eu com ele.

Se ao menos nada de toda aquela merda tivesse acontecido. Se o Niall nunca tivesse sido burro ao ponto de preferir uma rapariga ao invés da nossa amizade, tudo teria sido muito mais simples e talvez o Matt já nem fosse uma presença viva na terra. Talvez nós pudéssemos ter liberdade para fazermos o que nos apetecesse. Mas, há sempre um mas e ele não quis saber.

Porém... porém eu já não sabia quem estava a errar.

***

Quando entrei em casa um barulho irritante estava a ocupar o espaço. Queria tapar os ouvidos, mas ao mesmo tempo não queria parecer uma criança, então deixei-me estar, mesmo que aquilo me estivesse quase a perfurar os tímpanos.

Fui até à cozinha e vi o Niall a destruir algo com um ferro. Caminhei rapidamente até ele e mal fui capturado pelo seu olhar, ele parou.

- O que é que estás a fazer meu? – perguntei ao olhar em volta da confusão que restava na cozinha.

Ele não respondeu, preferiu continuar.

- Para. – agarrei-lhe num braço e ele parou, olhando para mim.

- Deixa-me fazer isto. Se duvidas tanto de mim, deixa-me terminar isto.

- Isto o quê? – perguntei confuso.

- O dispositivo do Matt. Demorou dois anos a ser construído, mas eu estou a destruí-lo. Isto chega para compreenderes que eu não estou nem nunca estive do lado dele? Acabou, estás a ver? – continuou com aquele barulho irritante, obrigando-me a elevar a voz.

- Para Niall. Para! – pousei as minhas coisas em cima da mesa e voltei a olhar para ele. – Tudo bem, tudo bem que eu errei. E... – fiz uma pausa prolongada. – Desculpa por isso. Mas esta situação deixa-me fora de mim. E está tudo a acontecer muito rápido. Não podes estar à espera que eu concorde com tudo o que acontece.

- Não é fácil para mim também. O Matt raptou o irmão da Ambar e eu sei lá o que ele lhe fez. Provavelmente até o matou. É o que ele quer fazer com toda a gente. – um pequeno silêncio. – Não é fácil para ninguém.

- Por isso é que... – era como se as palavras quisessem sair, mas ao mesmo tempo algo as estivesse a puxar para trás, a minha cobardia claramente. – Eu estive a pensar, e quero que me faças agora a regressão. E independentemente daquilo que eu vir, eu não quero que me apagues aquilo da memória.

Os olhos dele congelaram nos meus, como se estivesse incrédulo com a minha escolha. Bem, era motivo, mas, eu já não sabia mais o que fazer. Ou era aquilo, ou não era nada.

- Então? – perguntei impaciente.

- Tu tens a certeza? – assenti. – Então 'bora lá.

Fomos para a sala e eu sentei-me no sofá. Não estava tão agitado como da última vez, por isso as coisas pareciam que iam correr melhor.

- Concentra-te num local pacífico e descontrai. Pensa em algo que te faça esquecer de todos os problemas. Fecha os olhos e conta até dez. – foi o que eu fiz, e logo de seguida o meu eu já estava em contacto com um eu muito anterior ao atual.

- O teu irmão? – aquelas vozes vinham de um local que eu desconhecia. O meu corpo estava a entrar dentro de uma casa, deveria ser a minha.

- Não sei, mas também não quero saber. – depois um corpo saiu de um aposento. Era o Matt e aquela visão não era uma continuação do que tinha acontecido na última. Era um recuo e eu e o Matt éramos adolescentes.

Vi-me caminhar para um porta. Quando entrei sentei-me numa cama e na outra estava o Matt sentado com as pernas contra os joelhos e os braços à volta do mesmo. Eu ri-me e suspirei, pegando num telemóvel antigo.

- Estás a ver Matt? – mostei-lhe o pequeno visor. – É a Ava.

A sua mão afastou o aparelho, deixando que o mesmo fosse para longe. – Deixa-me em paz.

- Porquê? Tu não gostas dela? Então queres ver as mensagens que trocamos.

- Para! Tu és mesmo... – ele levantou-se. – A Ava era minha namorada. Foste tu que a tiraste de mim e quando ela vir o traste que és, vai desejar nunca te ter conhecido.

- Disseste bem, era.

- Porque tu a tiraste de mim, como fazes sempre. Porque tu tens ciúmes de mim. Porque tu não és filho da Annabela e nunca vais ser. Ela é minha mãe e tu não passas de um coitadinho que ela adotou e que pensa que pode ficar com tudo. Mas isso não vai acontecer, não vai, porque tu... morre seu idiota.

Os meus olhos piscaram muito rapidamente e de um segundo para o outro eu já estava a ver o Niall e não eu e o Matt no passado.

- O que é que foi isto?! – tinha a respiração descontrolada e o coração a bater muito depressa.

- Eu não sei... quer dizer, é óbvio não é? – era assim tão óbvio? É que para mim estava tudo confuso. – Mas dá-me dois dias e eu descodifico toda a informação.

- O Matt... o Matt sabe disto?

- Ele não precisa de saber. Isto está dentro dele. O que interessa é o ódio, mais nada.


Callous | h.sWhere stories live. Discover now