Capítulo XXXI - Parte II

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Está mais escuro agora. Meu palpite é de que seja noite novamente. Quase não consigo ver minhas próprias mãos na frente do meu rosto, e muito menos Benjamin a alguns metros de mim. E isso me deixa inquieta.

O som dos meus passos no ambiente, para lá e para cá, repetidas vezes, é abafado pelo de milhares de pequenas e pesadas gotas que se chocam contra o telhado, do lado de fora. Está chovendo. E o ping, ping, ping constante em algum lugar dentro do cômodo, acumulando a água em poças, só comprova isso.

Por outro lado, também está abafado, o que só piora com a umidade crescente. Posso sentir o suor escorrendo por minha testa, costas e pescoço, fazendo com que a mordida comece a arder, espalhando um latejar constante e incômodo por ela.

Prendo meus cabelos no alto da cabeça em um coque, buscando algum alívio, mas amaldiçoando os movimentos que se repercutem direto na ferida. Eu rezo para todos os deuses que conheço para que o efeito do acônito passe o mais rápido possível. Não tenho chance nenhuma de nos tirar daqui, se for humana.

Repentinamente, a porta de ferro é arrastada do lugar, iluminando o ambiente com a luz do anterior, que foi rodeado por velas, e uma mulher, alta e com uma metade do cabelo raspado em um lado e com a outra presa em um coque elaborado por grampos, entra, arrastando um banquinho consigo e o colocando encostado em uma das paredes.

Ela se ajoelha diante dele e retira de dentro do bolso de trás da calça jeans, uma vela e um isqueiro, acendendo-a em seguida, pingando algumas gotas de cera derretida no banco e pregando a vela sobre ele.

Quando o pequeno feixe de luz se acende dentro do ambiente, eu consigo uma visão melhor dela; usa roupas escuras e encharcadas de água, coturnos e sei que esconde algo por de baixo da jaqueta, no cós da calça, mas não é uma arma. Pelo menos não me parece uma.

Ela se levanta, dá uma boa olhada em Benjamin, que parece ter caído no sono, com o pescoço pendendo para frente, e depois se vira para mim. Não se aproxima como fez com Ben, e vejo que aperta e solta as mãos na lateral do corpo, como se estivesse nervosa. Sua expressão não deixa transparecer nada, mas seus olhos... Parecem com receio de algo.

Ela não diz nada, e tão logo chegou, se esconde por trás da porta de ferro novamente, arrastando-a para seu lugar de origem, deixando com que somente a pequena chama que acendeu no ambiente nos ilumine. Bom, é melhor do que a escuridão total. Logo em seguida ouço o burburinho de conversas do lado de fora, mas nada que um ouvido humano possa distinguir.

─ Benjamin!

O chamo, mas ele não responde. Apenas solta um burburinho baixo e incompreensível, que poderia passar despercebido.

A pequena chama ilumina seu peito sombriamente, e não consigo demorar meus olhos muito tempo em suas feridas. Prendo o ar nos pulmões, com medo de que ele se esvaia de mim, enquanto um frio repentino percorre toda a minha espinha. Não sei quanto tempo um lobo leva para curar feridas desse tipo, mas desejo mais do que tudo, que logo. Ele não parece estar melhorando, e tenho medo do que possa acontecer se não fizer algo depressa.

Meus olhos se desviam para seus pulsos, atados com o arame, e a pele em torno enegrecida com as veias dos braços ficando arroxeadas, parecendo tecerem finas teias de aranha. É então que o pensamento me vem à cabeça: e se o arame for de prata? Faria sentido o tecido estar tão escuro e lesionado.

Mas se realmente for prata, não vai levar muito tempo para que caia na corrente sanguínea e nade até o coração. Eu me lembro do que ouve com Thomas quando Anna o encontrou na floresta. Não posso deixar isso acontecer com Benjamin.

─ Benjamin, acorde! - Falo mais forte dessa vez.

Ele murmura novamente, mais alto e a contra gosto, se remexendo. Geme enquanto retorna o pescoço a posição normal e faz uma careta quando o alonga. Em seguida, infla o peito de ar umas duas ou três vezes, expirando devagar e finalmente abre os olhos, relutante, focando-os em mim.

Entre Lobos & Flores - Livro 1Opowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz