Jack se sentaria no banco da frente, a mão aumentando o volume do rádio, enquanto Ben ocuparia o espaço entre o banco do carona e o do motorista, os pés no porta-copos, e as risadas escandalosas ecoando pelos meus ouvidos.

Eles se davam muito bem, os três.

Michael trocou o peso de um pé para o outro, parecendo inquieto. Imaginei que estivesse absorvendo o máximo que pudesse das fotos, reconhecendo o grau de parentesco daquelas pessoas comigo, e ele logo procurou outra coisa para descobrir.

Foi quando puxou duas cartas de dentro de outra das caixas organizadoras. Prendi o ar, tenso, porque havia me esquecido de verdade de jogar aquilo fora.

Michael virou os envelopes para ler as informações, e levantei-me no mesmo instante, devagar, caminhando até ele. Meu corpo encaixou no seu alguns segundos mais tarde, quando atravessei o quarto roçando os pés no carpete, e minhas mãos seguraram sua cintura.

Senti o exato instante em que ele tremeu.

"Bom dia" sussurrei contra sua orelha. Pus o rosto na curvatura de seu ombro, e, antes que ele me respondesse, sugeri "Antes que comecemos a jogar o detetive de todos os dias, vou sugerir um acordo."

"Estou ouvindo" ele murmurou, os olhos verdes ainda analisando a carta. Para Ben Hemmings. O endereço era da Universidade de Adelaide.

"Vou te deixar fazer uma única pergunta a respeito do que acabou de ver. E vai responder uma curiosidade minha em troca."

"Feito." Seu tom não parecia satisfeito com aquilo, mas ele não tinha escolha. Seria isso, ou nada. E Michael sabia disso tão bem quanto eu. "Eu começo, então."

"Como queira"

Seus olhos transitaram entre as fotos e a carta. E, para minha surpresa, ele ergueu uma única foto, onde Ben, Jack e minha mãe estavam abraçados no quintal. Era um domingo de churrasco, um feriado do qual eu não me lembrava o nome. Mas o diferencial dessa foto era que havia outra pessoa nela, entre meus irmãos, com um sorriso travesso no rosto adolescente e óculos de armação grossa.

"Quem é esse?"

Pisquei algumas vezes, encarando a foto. Não me recordava dela.

"É um amigo de infância de Jack, acho."

Michael finalmente me olhou. Como se para ter certeza da minha sinceridade, imaginei. Encarou-me por cima do ombro, de forma avaliadora, e depois virou-se outra vez.

"Não se lembra do nome?"

"Na verdade, não. Não era exatamente próximo deles."

Um pouco de verdade na mentira, sempre. Tornava tudo mais crível. Michael não insistiu, e me senti mais aliviado por isso. E, antes que ele mudasse de ideia, meus dedos tocaram seu ante braço, subindo até sua nuca e logo traçando o caminho até seus fios agora azuis. Agarrei um punhado de cabelo colorido, e puxei com força até deitar sua cabeça em meu ombro.

"Aliás, quem te deixou mexer nas minhas coisas?"

Um sorriso nervoso estampou seus lábios. "Curiosidade falou mais alto."

"Curiosidade matou o gato." Enfatizei o verbo, sarcástico.

"E ele comeu a sua língua" Michael murmurou, colocando a língua para fora. Rolei os olhos e, para sua surpresa, puxei seu cabelo com ainda mais força, fazendo com que ele murmurasse diversos ai seguidos, uma de suas mãos tentando parar meu movimento. Ignorei seu protesto e apenas o empurrei até que ele ficasse de joelhos, de frente para mim.

HQiller ☂ [Muke Clemmings]Where stories live. Discover now